Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Empresa de crédito à habitação apela a que gestoras de condomínios se possam financiar
UCI Portugal vê oportunidades nas obras de conservação de prédios, mas a lei terá de mudar. CEO diz que a procura de crédito caiu com a subida dos juros e que há mais de dez anos que aposta em taxas fixas e mistas.
Para a UCI Portugal, as empresas de gestão de condomínios são um segmento apetecível do mercado de crédito, porque a necessidade de obras existe e as empresas gestoras admitem que recorreriam a financiamento se o pudessem fazer. Um estudo realizado pela multinacional especializada em crédito à habitação junto de 200 empresas revelou que 98% consideram que são necessários trabalhos de conservação nos condomínios que gerem, mas que as obras não avançam por falta de recursos financeiros dos condóminos. O mesmo inquérito mostrou que 75% das empresas gestoras concordam que a alteração da legislação para que se possam financiar diretamente contribuiria para que os trabalhos se realizassem.
“Estamos a apostar numa discussão generalizada sobre esta temática, por forma a que as entidades competentes entendam efetivamente as dificuldades inerentes ao facto de não existir no ordenamento jurídico português um regime legal específico que proporcione aos condomínios, que não têm personalidade jurídica, a possibilidade de se financiarem”, diz ao Dinheiro Vivo Greg Delloye, CEO da UCI Portugal.
“No contexto atual, um eventual financiamento aos condomínios implicaria, tendo em conta a onerosidade de uma decisão destas, uma deliberação unânime em Assembleia de Condóminos. Sendo extremamente complexo de se atingir este desígnio, certamente que nunca seria em número suficiente para ter um impacto real no perfil do parque habitacional português”, acrescenta o gestor.
A empresa diz que o Programa de Apoio a Condomínios Residenciais lançado no ano passado e financiado pelo Fundo Ambiental, “é um passo no sentido certo”. No entanto, defende que “é necessário fazer mais, isto porque neste momento os apoios estão focados nas frações e não se está a dar o devido ênfase aos edifícios residenciais como um todo. O que é par
ticularmente preocupante quando percebemos que cerca de metade da população portuguesa, segundo dados da APEGAC [Associação Portuguesa de Empresas de Gestão e Administração de Condomínios],
habita em condomínios”.
Greg Delloye avança mais um argumento para que as empresas administradoras de condomínios tenham acesso ao crédito: “Sendo a melhoria da eficiência energética dos imóveis um dos objetivos a que Portugal está comprometido via acordos internacionais, só podemos constatar que a necessidade existe, a vontade de financiar também, estando apenas em falta as condições necessárias para que tal possa suceder.”
Concorrentes da banca tradicional
Resultante de uma joint venture entre o BNP Paribas e o banco Santander, a UCI opera em Portugal desde 1999 e procura diferenciar-se no mercado através de soluções dirigidas a segmentos específicos. “O nosso principal desafio é continuar a crescer num mercado dominado pela banca tradicional. De qualquer forma, o nosso foco materializa-se na especialização e dinamização de soluções inovadoras, tais como o crédito habitação
para não residentes, construção de casa própria e habitação green”, explica Greg Delloye.
Tal como os grandes bancos em Portugal, a UCI também enfrentou uma menor procura por crédito no ano passado na sequência da subida das taxas de juro. “O ano de 2022 foi bom, representando um aumento de 9% no valor de crédito concedido face a 2021. Mas no último quadrimestre, as subidas das taxas de juro começaram a fazer-se sentir na procura. Em 2023, o cenário foi mais complexo. A redução do volume financiado acompanhou a redução do mercado”.
No entanto, sublinha o responsável, a empresa estava preparada para este cenário de taxas de juro elevadas. “A UCI começou a apostar nas taxas mistas e fixas há mais de dez anos e, neste momento, os empréstimos com taxa variável são minoritários no nosso balanço”, aponta, o que também terá protegido a empresa do incumprimento. “Graças a uma política de risco cautelosa, que avalia de forma exigente o perfil dos clientes, e a nossa aposta nas taxas mistas e fixas, como já referimos, não registámos nenhum aumento do crédito malparado em 2023”, garante. Admite todavia que “logicamente, tivemos de ajudar alguns clientes cuja situação financeira se viu fragilizada pelo brusco aumento das taxas de juro e fizemo-lo de forma cuidadosa e personalizada, tentando procurar a solução que mais se adaptava a cada situação”.
Questionado sobre se a subida das taxas de juro já terá atingido o pico, o gestor diz que “a atuação dos bancos centrais para que a inflação regressasse a níveis sustentáveis parece ter surtido efeito e, aos poucos, poderemos assistir a um certo regresso à normalidade”. Além disso, sublinha que “a Euribor registou a sua primeira descida em novembro e perspetiva-se que poderá chegar aos 3% antes do verão”. No entanto, a incerteza é grande: “As experiências recentes obrigam-nos a olhar para o futuro com cautela, porque aprendemos que podem surgir acontecimentos disruptivos que impactem as economias de forma negativa”.
A UCI admite que a descida das taxas de juro poderá trazer algum dinamismo ao mercado do crédito à habitação em 2024. “É totalmente diferente equacionarmos a compra de um imóvel num contexto de subida de juros em que não temos a perceção do ponto de inflexão, do que num cenário de descida de taxas.” Contudo, há outros fatores a considerar neste mercado, avisa o gestor: “O impacto do preço dos imóveis será também um dos fatores a ter em consideração, uma vez que não estão ao alcance de muitas famílias”.
O mercado dos não residentes é um dos segmentos-alvo da UCI Portugal e, por isso, “não menos importante” para a empresa é “o papel decisivo que os estrangeiros tiveram na dinâmica do mercado nacional nestes últimos anos”. Em vésperas de eleições legislativas em Portugal, Greg Delloye diz que estão “na expectativa da contribuição do próximo governo para garantir a atratividade de Portugal numa ótica de investimento externo”.
“Graças a uma política de risco cautelosa, e a nossa aposta nas taxas mistas e fixas, não registámos nenhum aumento do crédito malparado em 2023.”