Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
A inovação ao serviço das pessoas
Em 2021, quando decidi ser candidato à presidência da Câmara Municipal de Lisboa, escolhi a inovação como uma prioridade, conjuntamente com a área social e a cultura. Numa lista de 12 principais medidas a implementar, estava a audácia de criar uma fábrica de unicórnios em Lisboa, que permitisse criar mais e melhores oportunidades de emprego e de crescimento económico.
O famoso professor de Harvard Theodore Levitt colocou o conceito de inovação no patamar da ação. Ao contrário da criatividade – que consiste em pensar em ideias novas – a inovação foca-se em fazer algo que não é apenas novo, como é também útil. Por outras palavras, a inovação não é algo abstrato e distante, mas antes algo que as pessoas podem ver, sentir e usar. Algo que pode transformar as suas vidas para melhor.
A cidade enquanto espaço de proximidade por excelência é a plataforma certa para explorar a inovação como ferramenta para promover uma vida melhor para os seus cidadãos. Em Lisboa, a concretização da fábrica de unicórnios – apesar dos riscos políticos que acarretou – rapidamente revelou esse potencial transformador. Em apenas dois anos, o projeto criou uma nova dinâmica na economia da cidade e do país (1), tornando-se num caso de estudo em todo o mundo. O sucesso assenta essencialmente em cinco benefícios tangíveis que trouxe para a cidade.
1. Devolver a esperança aos jovens.
Quando recentemente se tornou público que 30% dos jovens abandonam o país, surpreendeu-me que a inovação não tivesse saltado para o topo das prioridades na agenda política.
Sem inovação não há futuro para os nossos jovens. Em Lisboa, a aposta que a fábrica de unicórnios fez para atrair grandes empresas resultou no maior investimento estrangeiro desde que há registo (2). Em dois anos, 60 novos centros tecnológicos instalaram-se na cidade, anunciando a criação de 10 mil postos de trabalho. São 10 mil empregos altamente qualificados e com salários acima da média, que dão aos jovens a oportunidade que procuram.
2. Dar uma nova vida aos bairros da cidade
A inovação não é algo abstrato escondido em grandes edifícios de escritórios modernos. É algo que se sente e que se vê na rua, por vezes até nos bairros mais tradicionais da cidade. Esse impacto “urbanístico” é hoje evidente na antiga Manutenção Militar do Beato, que me recordo encontrar semiabandonada na minha primeira visita enquanto presidente da Câmara. Apesar das promessas políticas dos executivos anteriores – nunca cumpridas – decidi que ali seria o local certo para instalar a nova Unicorn Factory de Lisboa.
Hoje, o Beato acolhe os espaços de trabalho mais atrativos da cidade, onde trabalham mais de 1000 pessoas entre grandes empresas, centros de investigação e pequenas startups.
É também o caso de Alvalade, onde antigos armazéns em ruínas acolhem agora startups na área da Web 3, ou ainda das Avenidas Novas, onde uma antiga gare da Carris é hoje o centro de inovação do Instituto Superior Técnico com um hub tecnológico para a área da saúde, desporto e bem-estar. Ali ao lado, na Avenida da República, nasceu também o Gaming Hub, onde uma centena de jovens trabalha todos os dias para desenhar o futuro daquela indústria.
A inovação está a transformar a mancha visual da cidade, valorizando o património que há muito havia sido esquecido e dando uma nova vida aos bairros mais tradicionais.
3. Resolver os problemas sociais
Em 2024, por cada euro investido pela CML em inovação, investimos 160 euros em habitação e 120 euros em medidas sociais para cuidar das pessoas. Tal só é possível porque a inovação cria a riqueza necessária para que o Município possa focar-se na sua verdadeira missão. A inovação não é um fim, mas antes um meio para construir um Estado Social Local.
Além da capacidade de gerar receitas para a cidade, os nossos “inovadores” podem também ser mobilizados para ajudar a encontrar novas soluções para problemas antigos. São pessoas com uma enorme vontade de contribuir e que dedicam os seus dias a resolver problemas complexos, usando ou construindo ferramentas novas, sem receio de errar.
O futuro de Lisboa passa por colocar esse potencial ao serviço da cidade, convidando empresas e empreendedores a usar a sua criatividade para solucionar os maiores desafios da cidade, da habitação à saúde, da educação aos sem-abrigo.
4. Acolher a diversidade
A inovação não é o fruto de uma iniciativa individual: é o resultado de uma interação. É no cruzamento entre diferentes pessoas, culturas e disciplinas que nascem as melhores soluções.
Uma das missões que atribuímos à fábrica de unicórnios foi a de promover essa abertura ao exterior, convidando empresas de todo o mundo e os seus colaboradores a mudarem-se para Lisboa. Hoje, 60% das nossas startups são estrangeiras, por vezes de lugares tão distantes como o Canadá ou Singapura.
Só a inovação tem a capacidade de criar uma dinâmica multicultural e cosmopolita positiva para a cidade, onde quem chega tem um contributo a dar. Essa diversidade – condição imperativa da inovação – traz uma riqueza inestimável para qualquer capital europeia que se queira aberta e tolerante.
5. Transformar mentalidades
Quando escolhi o nome “Unicorn Factory” fi-lo para colocar a audácia da cidade num patamar onde poucos acreditavam que podíamos chegar.
Uma das 60 empresas que apostaram na criação de um centro de inovação em Lisboa – a Critical Techworks, que está a recrutar 600 jovens engenheiros – consiste numa parceria inédita com a BMW. Na inauguração do novo espaço, o responsável da empresa alemã viajou de Munique para estar presente e disse algo que me marcou profundamente: “Hoje, um automóvel BMW não funciona sem tecnologia portuguesa”. Há 10 anos teria sido impossível.
Lisboa é uma cidade carregada de história e de alma. Iluminada por uma luz que ninguém consegue definir, mas reconhecida como única e mágica. Para além de tudo isto, que faz parte do ADN da cidade, continuo a acreditar que Lisboa pode ainda ser muito mais do que imaginamos. E, nesse caminho de futuro, é a nossa capacidade de inovar e de fazer diferente que nos vai manter na linha da frente. De estar entre os melhores. De não ter medo de lutar por isso e de assumir que o objetivo é claro.
É isso que estamos a fazer todos os dias. E com resultados: em novembro 2023, a Comissão Europeia distinguiu Lisboa como a cidade mais inovadora da Europa, onde a inovação melhor cumpriu a sua função, servir as pessoas.