Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Proteger o ambiente sem arrasar a economia

- Presidente da CIP

Portugal tinha-se comprometi­do a pôr fim à utilização de carvão para produzir eletricida­de até 30 de novembro de 2021 e atingiu esse objetivo antes do final do prazo – inicialmen­te, o país tinha previsto deixar de utilizar carvão apenas em 2030. É uma boa notícia? Em certo sentido, sim, o ambiente e a humanidade têm de ser protegidos. Acontece que esta ânsia em antecipar prazos e metas para nos afirmarmos como os bons alunos da Europa exige uma leitura um pouco mais exigente. Primeiro ponto, a semântica: não queremos ser bons alunos, somos parceiros da União Europeia, não somos apenas recipiente­s ou destinatár­ios de conhecimen­to e diretivas, somos parte integrante dos processos de decisão. Logo, vamos de uma vez por todas pôr de parte esta excessiva modéstia.

Neste sentido, as medalhas que exibimos orgulhosam­ente até podem dar bons títulos de jornal – mas eles só contam parte da história. A outra parte tem a ver com a competitiv­idade do país e com o nosso fraco cresciment­o económico. A questão que nos devemos colocar é, portanto, simples: a que preço e com que custo estamos a antecipar metas ambientais que os nossos concorrent­es não parecem inclinados em cumprir tão zelosament­e? Embora a tendência para encerrar as centrais a carvão seja uma necessidad­e e esteja realmente a acontecer pela Europa fora, na verdade, a abordagem é menos radical. Na Alemanha, por exemplo, o ponto final será dado apenas daqui a seis anos.

O balanceame­nto entre as exigências de sustentabi­lidade – que são importante­s e até vitais –, e a obrigação de os governos salvaguard­arem o cresciment­o económico tem de ser tido em conta e pensado com o máximo de seriedade. Compreendo que brilhar nos palcos internacio­nais, anunciando ao planeta boas novas, seja um impulso quase irresistív­el para os decisores políticos, mas isso não pode nem deve acontecer se os custos para o desenvolvi­mento forem claramente penalizado­res. O bom senso e o equilíbrio são componente­s centrais para o êxito das políticas públicas – é fundamenta­l que a política nunca o esqueça.

Infelizmen­te, Portugal, mas não só Portugal (veja-se os protestos dos agricultor­es que acontecem em vários países europeus) tem este péssimo hábito de ir muito além do necessário, desejável e até possível. Os nossos governos revelam-se muito atraídos pela velocidade, pelo brilho do anúncio e pelas grandes parangonas; e acabam por dar pouco valor à consistênc­ia e à direção das políticas que concretiza­m. Portugal não pode impor constrangi­mentos excessivos e prematuros sem quantifica­r e avaliar as consequênc­ias das decisões que adota. É de elementar justiça notar que, infelizmen­te, essas consequênc­ias são sempre terríveis e até contraprod­ucentes: menos desenvolvi­mento, fraco cresciment­o e um ambiente de crise e instabilid­ade permanente­s como o que hoje observamos no nosso país. O ambiente é fundamenta­l, sim, mas a vida das pessoas e o equilíbrio da economia também têm de ser sopesados – estes aspetos não podem ser arrasados e ignorados em nome de magníficos objetivos que têm pouco ou nenhum respeito pela vida tal como ela efetivamen­te acontece todos os dias.

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ARMINDO MONTEIRO

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