Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Sem casa, as pessoas continuam a ir para a rua
Não admira que nas ruas tenha havido manifestações a exigir que o tema da habitação seja central nesta campanha eleitoral para as legislativas. São cada vez mais as pessoas que olham para as placas a anunciar a venda ou arrendamento de casa e que sentem um nó no estômago por verem as suas hipóteses hipotecadas, com os preços a subir e os seus rendimentos a valerem cada vez menos. É simplesmente uma constatação, se quisermos ser pragmáticos. Se no mínimo sentirmos alguma empatia, é uma dor de alma assistir a esta angústia.
Mais de metade (51,2%) dos cidadãos na Área Metropolitana de Lisboa (AML) – e 55% a nível nacional – não compram nem arrendam casa porque os preços estão demasiado altos para as suas possibilidades. Estes são os que não podem comprar. Porque mesmo os que podem, a maioria opta pelos preços mais baixos e por uma casa mais pequena: em média, gastam quase 190 mil euros a nível nacional e 216 mil na AML; se for casa arrendada, a média nacional está nos 589 euros e em 666 euros na AML, segundo o Estudo da habitação em Portugal: o que mudou nos últimos anos, da Century 21. A verdade é que num grande centro urbano, como Lisboa, já não se encontram valores destes, nem mesmo num T0.
Só entre julho e setembro do ano passado, o rendimento real per capita das famílias portuguesas caiu 0,28% – ligeiramente acima dos 0,2% da média da OCDE –, comparando com o trimestre anterior. Nos últimos dois anos, a subida da inflação retirou poder de compra aos portugueses e a inevitável consequência da subida dos juros para níveis históricos, dos 0% aos 4,5% num ápice, pôs em causa o equilíbrio financeiro das famílias portuguesas que recorreram ao crédito bancário para a compra de casa, ou que pensam fazê-lo. Certo que todos já estão a pensar no alívio, mas atenção que nada será como dantes. As taxas de juro vão descer, mas não devem ir abaixo dos
2%, este será “o valor neutral”, alerta o governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, numa entrevista que pode ler nesta edição.
Vejo grandes apostas a fazer. A primeira, na melhoria de uma rede de transportes, para que a periferia dos centros urbanos (onde o preço do metro quadrado é mais baixo) seja uma alternativa real, com real aumento da qualidade de vida. E a consequência inevitável seria a criação de novos negócios nessas regiões, ou seja, mais desenvolvimento económico, mais emprego e mais serviços para fixar estas pessoas – é inevitável que se aposte numa boa rede de apoio às famílias, com creches, jardins de infância, escolas públicas de qualidade e mais e melhor apoio à terceira idade. A segunda aposta seria a promoção da construção e requalificação de habitação, quer pela desburocratização dos processos de licenciamento, quer por incentivos fiscais que revertam de forma proporcional para o bolso dos cidadãos, ou seja, com a contrapartida da descida dos preços das casas quer na aquisição, quer no arrendamento. E com isto forçar a que a avaliação bancária da habitação, ao redor destas, desça também.
Nesta matéria, como noutras, vemos os partidos a distanciarem-se do pacote Mais Habitação. Este é o momento de repensar as políticas da habitação, até por parte de Pedro Nuno Santos, que ao serviço do governo PS nunca conseguiu cumprir com a urgência da resolução deste problema que obriga as pessoas a ir para a rua.