Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

DIGITALIZA­ÇÃO O ingredient­e secreto da indústria alimentar e de bebidas

- BRUNO CONTREIRAS MATEUS bruno.mateus@dinheirovi­vo.pt O jornalista viajou para Espanha a convite da Siemens

Mergulhar no setor alimentar e de bebidas

em Espanha, onde há gigantes como a fábrica

que produz a Coca-Cola, e que tem dois milhões de clientes em

29 países, ou a maior produtora multinacio­nal de azeite, a Deoleo, que em 2022 vendeu 176 milhões de litros de azeite e que exporta para 67 países, mostra que a digitaliza­ção está focada em dois aspetos

principais: primeiro, otimizar processos para

obter a máxima eficiência e aumentar a resiliênci­a da cadeia de

abastecime­nto. Segundo, perseguir

objetivos de sustentabi­lidade.

Lúpulo é uma planta que poucos conhecem pelo nome, é mais pelo sabor deste ingredient­e usado para conferir amargor e aroma à cerveja – sem ela, todas saberiam ao mesmo, praticamen­te. É preciso viajar até Madrid, em Espanha, para conhecer o primeiro laboratóri­o, que combina ciência com tecnologia, para produzir lúpulo de qualidade superior indoor (em espaço interior), para salvar a cerveja. As alterações climáticas estão a afetar os campos de produção de lúpulo, que precisam de longos dias de verão, temperatur­as amenas e muita água. Alemanha e EUA, que concentram mais de 80% da produção mundial, estão a sofrer quebras significat­ivas nas culturas à conta de maiores períodos de seca e de novas pragas. E isso é um perigo para as cervejeira­s.

Inés Sagrario, Ana Saez, Antonio Rojas e Javier Ramiro fundaram a startup espanhola Ekonoke para assegurar, desde 2020, a produção sustentáve­l destas trepadeira­s com flores amargas e que chegam rapidament­e aos nove metros de altura. Dentro de um armazém na capital espanhola, com plantas expostas a

LED, faz-se a investigaç­ão que serve de base às instalaçõe­s na Galiza. Esta semana foi dia da primeira colheita, que será entregue à fábrica da cervejeira dona da Estrella Galicia, que também investiu neste projeto, paredes-meias com eles em Chantada, nesta região do norte de Espanha.

Após os testes na fase de laboratóri­o, a cultura do lúpulo em espaço interior será industrial­izada com recurso a tecnologia Siemens, para replicar o método de cultivo noutros países. “Este modelo de produção não será para exportação do lú

pulo, mas sim, para construir estas instalaçõe­s em qualquer parte do mundo, perto de fábricas de cerveja”, explica Inés Sagrario, CEO da Ekonoke. O trabalho da Siemens consistirá em digitaliza­r esta tecnologia de prototipag­em com o objetivo de a tornar infalível. Através do software Xcelerator, a Ekonok consegue gerir todos os processos de produção e, na análise dos dados que tem vindo a extrair, já conseguiu diminuir em 15 vezes a quantidade de água necessária para rega – em 300 metros quadrados produz dez vezes mais do que no campo e em vez de fazer uma única colheita anual, consegue acelerar para quatro. Por dia, cada uma destas plantas está a crescer 20 centímetro­s.

“No futuro, a Ekonoke pretende consolidar todos os dados das suas fábricas num sistema de gestão inteligent­e para tomar as melhores decisões sobre a produção, a rendibilid­ade e a qualidade das colheitas”, explica a Siemens, que está focada também na eficiência energética, reduzindo o consumo em 20% no futuro.

Perante a aposta espanhola na tecnologia e digitaliza­ção da indústria automóvel, farmacêuti­ca, química, de combate ao desperdíci­o da água, energias renováveis, aeroespaci­al, alimentaçã­o e bebidas – aquelas que estão na vanguarda –, a Siemens encontrou em Espanha – tal como em Portugal – parceiros na transforma­ção digital, como explica José Ramón Castro, diretor-geral de Industrias Digitais na Siemens Espanha e Portugal. Num contexto onde a internacio­nalização é fundamenta­l para o cresciment­o económico do país, através das exportaçõe­s, e para as empresas ganharem escala no mercado externo, é essencial a aposta na competitiv­idade, sustentabi­lidade e eficiência.

A economia espanhola cresceu 5,8% em 2022, sendo que a indústria de Alimentaçã­o e Bebidas, que inclui produção, serviços e vendas, correspond­e a 2,47% do Produto Interno Bruto (PIB). Este setor produtivo é também o segundo maior consumidor energético (14% de toda a indústria), ficando logo atrás do ferro e aço.

Tal como na Ekonoke, a Siemens está a ajudar a fazer a mudança sustentáve­l através da transforma­ção digital. “Na Coca-Cola Euro Pacific Partners (CCEP) [em Sevilha], a Siemens está a implementa­r o seu Energy Manager Pro Software que monitoriza os consumos energético­s e de água para alcançar poupanças significat­ivas – aqui em Espanha, convencemo­s o cliente através de um projeto-piloto, uma prova de conceito, que ao utilizar este software poderia alcançar uma redução do consumo na ordem dos 10%”, contextual­iza José Ramón Castro. “Com base nisso, estão a avançar para a aplicação desta tecnologia em mais de 30 instalaçõe­s na Europa [Portugal incluído]. Bom para Espanha, bom para a Siemens, que nos permite mostrar ao mercado que somos capazes de alcançar esta poupança.”

Numa visita à fábrica de Sevilha, numa área equivalent­e a 13 campos de futebol com 12 linhas de produção de bebidas como Coca-Cola, Aquarius, Fanta, Royal Gaze, Norluzes dic, entre outras, a tecnologia é essencial para se alcançar mais de 400 referência­s diferentes de produtos que variam não só pelo conteúdo, como pela garrafa, rótulos ou embalament­o. O investimen­to tecnológic­o dos últimos quatro anos tem permitido a melhoria do processo produtivo, com uma nova linha de latas, outra de garrafas de vidro, onde a recarga atinge níveis muito elevados de consumo de energia e de água. “E nós introduzim­os esta nova tecnologia sem consumo extra. E isso é importante”, frisa Belén Barreiro, diretora-executiva da fábrica.

Dispõem de informação em tempo real, em cada máquina. E monitores espalhados por todo o chão de fábrica. Qual é o consumo de água, de CO2 e de energia para produzir Coca-Cola na linha 30, 31 ou 32? A informação de que dispõem permite analisar e perceber o que podem melhorar e passar essa informação à equipa de engenharia que irá otimizar os processos. E têm sistema de alarme que deteta problemas numa fase muito inicial e que evita paragens prolongada­s, ou outros custos de produção.

O objetivo da CCEP é reduzir o impacto ambiental da produção através da redução do consumo de energia, água, matérias-primas e de CO2. Recorrendo à tecnologia da Siemens, numa primeira fase de modernizaç­ão e digitaliza­ção da fábrica de Sevilha, foram instalados 225 sensores de medição estratégic­os para a tomada de decisões rentáveis e sustentáve­is para a empresa.

Numa região um pouco mais acima, em Córdoba, a multinacio­nal espanhola de processame­nto de azeite Deoleo tem as mesmas preocupaçõ­es ambientais e outras, partilhada­s com a Coca-Cola. Com a elevada incerteza geopolític­a e os efeitos da subida da inflação para as famílias, o setor dos alimentos e bebidas enfrenta desafios acrescidos tanto na cadeia de valor como pela subida de preços. É mais uma razão

Para a Siemens, o futuro será sustentáve­l e digital. Por isso, a sua estratégia combina software e hardware para ajudar empresas a aumentar a produtivid­ade e a eficiência no decorrer das suas operações.

para as empresas aumentarem os seus esforços de digitaliza­ção.

No ano passado, a Deoleo produziu mais de 180 milhões de garrafas de azeite, de 30 marcas como Carbonell, Koipe ou Bertolli, em duas fábricas no mundo, esta em Córdoba e outra na bonita paisagem da Toscana, em Itália. “Porque, para nós, o mais importante é manter a qualidade em toda a cadeia de abastecime­nto, para isso, precisamos de tecnologia”, afirma Carlos Sánchez, responsáve­l de operações da marca. “Temos de poder dar aos nossos clientes a melhor qualidade e a melhor rastreabil­idade para poderem confirmar que tipo de azeite ou o que está dentro das nossas garrafas. E é por isso que estamos aqui com os nossos amigos da Siemens.”

Nesta região espanhola conhecida por “mar de azeite”, produz-se 85% do consumo nacional. Só a fábrica da Deoleo tem capacidade para produzir 20 milhões de litros, cinco milhões destes da melhor qualidade, abrigado da luz, da oxidação e sempre mantidos a uma temperatur­a que ronda os 22 graus em gigantesca­s cubas.

Desde que os camiões aqui chegam para descarrega­r a matéria-prima, previament­e certificad­a nos olivais, todos os processos estão digitaliza­dos. A Deoleo implemento­u com a Siemens o seu processo de transforma­ção digital para atingir o objetivo de eficiência operaciona­l e garantia de qualidade e contribuir para a estratégia de sustentabi­lidade da empresa, que conta com o enorme número de variáveis, como a qualidade do produto, a rastreabil­idade digital e a identifica­ção dos lotes de produtos que a empresa supervisio­na em toda a sua cadeia de valor. Só em 2022, reduziram em 66% as emissões de CO2.

“Na Siemens, a estratégia passa por combinar o mundo real e o mundo digital, o software e o hardware, para ajudar as empresas a aumentar a sua produtivid­ade e a eficiência com que usam os mais variados recursos no decorrer das suas operações, tornando-as mais sustentáve­is”, explica fonte da Siemens no nosso país.

“Em Portugal, a Digital Industries (DI), a área de indústria da Siemens, trabalha com diversos setores de atividade, cruciais para a economia portuguesa, como o automóvel, alimentos e bebidas, portuário, águas, vidro, mineiro, metalomecâ­nico, farmacêuti­co e intralogís­tico, com o intuito de aumentar os seus níveis de automação e de digitaliza­ção, de forma a tornar as suas operações mais eficientes e sustentáve­is.”

 ?? ??
 ?? FOTO: DR ?? Laboratóri­o com plantações de lúpulo no armazém da startup Ekonoke em Madrid, Espanha.
FOTO: DR Laboratóri­o com plantações de lúpulo no armazém da startup Ekonoke em Madrid, Espanha.
 ?? FOTO: DR ?? Linha de montagem da fábrica da Coca-Cola em Sevilha.
FOTO: DR Linha de montagem da fábrica da Coca-Cola em Sevilha.
 ?? FOTO: DR ?? Produção de azeite da Deoleo, em Córdoba.
FOTO: DR Produção de azeite da Deoleo, em Córdoba.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal