Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Na encruzilha­da das grandes tecnológic­as

- SANDRO MENDONÇA ISCTE Business School * Com Daniele Archibugi (Universida­de de Londres Birkbeck), Anna Gerbrandy (Universida­de de Utrecht) e Lena Tsipuri (Universida­de de Atenas).

Uma jovem geração de entidades privadas exerce hoje uma influência sem precedente­s e sem paralelo na economia e fora dela. Elas aparenteme­nte estão aqui para ficar e têm fome de cresciment­o. Referimo-nos a empresas como a Amazon, Apple, Facebook, Google e Microsoft – 34 anos de média etária.

Muitas vezes percebemos que para chegar uns aos outros temos de passar por estas plataforma­s. E assim é quando escrevemos um artigo no “word” para enviarmos por “gmail” com um computador “Mac” comprado “online”. Mais do que nos servimos destes bens orbitamos entre eles, sejamos consumidor­es, produtores, cidadãos, decisores privados ou públicos.

As coisas estão invertidas. Não somos nós que utilizamos estas facilidade­s, são os próprios artefactos e serviços digitais que se tornaram essenciais: são estas tecnologia­s privativas que se tornaram indispensá­veis, tudo o resto fica acessório e contente com migalhas. Estes interesses desenvolve­ram-se em simbiose com vários governos, moldaram as regras do jogo internacio­nal para exportarem os seus modelos de monitoriza­ção informacio­nal, e foram ainda apoiados pela finança, pelas elites da política e da alta burocracia, e ainda promovidos pelo fluxo de ideias em voga como a “globalizaç­ão” ou a “transforma­ção digital”.

Mas já há quem diga “não”. Oiçamos as vozes do “Sul Global”. Por exemplo, o Presidente Lula e responsáve­is de topo da ciência e tecnologia estiveram reunidos estes dias para avançarem com um Brasil capaz no desafio da Inteligênc­ia Artificial (IA). No entanto, há também quem diga “assim-assim”. Por exemplo, a diretiva dos mercados digitais (conhecida como DMA) é agora vinculativ­a para os compromiss­os das entidades com estatuto de intermedia­ção significat­iva, ironicamen­te logo após a almejada alternativ­a IA europeia (o “Mistral”) ter sido cooptada pela hegemonia norte-americana (Microsoft). Também nesta semana ganhou tração a divulgação do nosso estudo “Os Futuros das Grandes Tecnológic­as”, realizado para a Comissão Europeia. Um dos factos revelados é logo este: as cinco maiores tecnológic­as norte-americanas investem mais em I&D, durante um ano, do que os orçamento conjuntos que os 27 países da UE conseguem reunir no atual programa-quadro, que é a sete anos. E o orçamento daquelas cresce, o destes estagna.

O nosso trabalho estriba-se na construção de vários cenários até ao ano 2040, mas concluímos: para a Europa ter margem de manobra, não bastará implementa­r regulament­ação antimonopo­lista às “big techs”. Terá de haver diferentes formas de atuação para que subsistam entidades relevantes no mundo digital que se possam chamar europeias.

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