Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Escrever direito por linhas tortas
Ahistória corre à boca pequena: há uns anos, foi encomendado um livro sobre casos de sucesso na internacionalização de empresas portuguesas. Como é natural, a obra demorou algum tempo a produzir e, quando estava pronta para ser publicada, o editor constatou que várias das empresas referenciadas tinham falhado, quando não falido. De acordo com a norma vigente num certo tipo de literatura de gestão, mais preocupada com receitas, e pretensos casos de sucesso, do que com análises sérias, o livro não chegou a ser distribuído. Talvez o mesmo acontecesse noutros contextos, mas, em Portugal, onde quase ninguém admite ter errado, por maioria de razão. Foi pena: como sempre se soube, e é hoje consensual, pode-se quase sempre aprender mais com os erros com exemplos de erros do que com escritos, mais ou menos apologéticos, sobre sucessos não poucas vezes efémeros.
Aprender com os erros, mas não significa endeusá-los, passo que alguma dessa dita literatura, sempre à procura de “sound bites”, não hesitou dar, quase erigindo em dogma (“fail fast, fail often”) aquilo que continua a ser um insucesso. A esses, vale a pena recomendar o livro de Amy Edmondson, “The Right Kind of Wrong” que o Financial Times considerou o “business book of the year” de 2023 (permito-me um à parte: em 19 anos, foi a primeira vez que o prémio foi atribuído a um livro de gestão, o que talvez diga alguma coisa sobre a qualidade da investigação em gestão e, sobretudo, sobre a capacidade de a tornar acessível a quem a pratica).
Como o título permite intuir, nem todos os erros são iguais. O livro documenta-o, aliando, de forma exemplar, investigação e exemplificação. Alguns resultados parecem paradoxais. As organizações com melhor desempenho são, não poucas vezes, as que reportam mais erros, já que na organização existe um ambiente em que prevalece o que a autora designa por “segurança psicológica”: ninguém ter medo de ser penalizado apenas porque errou, o que fomenta um contexto de aprendizagem, melhoria e inovação. Este é, apenas, o ponto de partida de um livro que se recomenda.
“Alguns resultados parecem paradoxais. As organizações com melhor desempenho são, não poucas vezes, as que reportam mais erros.”