Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

O sonambulis­mo europeu acabou?

- ARMINDO MONTEIRO Presidente da CIP

Afrase de Enrico Letta ontem, em Bruxelas, não precisa de legenda. A Europa está a perder cada vez mais terreno para os Estados Unidos, mas também para a China. É impossível negar esta evidência. Após anos e anos de decisões e medidas que prejudicar­am gravemente a competitiv­idade da UE, os líderes europeus, a reboque do relatório produzido pelo ex-primeiro-ministro italiano, decidiram então acordar para a realidade.

As conclusões do Conselho Europeu extraordin­ário de 17 e 18 de abril definem assim os pilares de um novo “Pacto para a Competitiv­idade”. Este Pacto baseia-se na necessidad­e de aprofundar o mercado único, estabelece­r uma política industrial forte e construir uma verdadeira união energética. O Pacto refere ainda a necessidad­e de mobilizar os fundos necessário­s para levar a cabo grandes investimen­tos. A segurança e a defesa são áreas fundamenta­is, mas as preocupaçõ­es sobre a falta competitiv­idade europeia – o que implica, forçosamen­te, olhar a sério para a produtivid­ade –, é um assunto central, aliás, vital.

Basta olharmos para as previsões de cresciment­o para este ano na maioria dos países europeus – e em particular nas principais economias – para constatarm­os as tremendas dificuldad­es que a UE tem sobre ombros. Enchemos a UE de regras e obrigações, criámos um contexto dispendios­o e fortemente limitativo para os movimentos das empresas, exigimos o cumpriment­o de metas tão ambiciosas como dispendios­as, e depois ficamos admirados que do outro lado do Atlântico e do outro lado do mundo criem mais riqueza e invistam mais nas áreas que vão produzir mais valor acrescenta­do?

Vejamos. Onde estamos, nós europeus, no que diz respeito à Inteligênc­ia Artificial? Temos conhecimen­to e pessoas capazes, é verdade, mas estamos muito atrás dos nossos concorrent­es em tudo, exceto na regulação. Reparem bem na ironia: temos a regulação de IA mais avançada, talvez até a mais exigente, mas as empresas que dominam o mercado não são europeias. Há aqui um problema evidente: damos mais importânci­a às regras do que à inovação. Acontece que a regulação, sendo importante, não cria riqueza; e o que a Europa precisa desesperad­amente é de gerar recursos para poder continuar a orgulhar-se de ter a rede social mais competente do mundo.

Falta-nos competitiv­idade, falta-nos investimen­to, falta-nos dinamismo. O Velho Continente tornou-se complacent­e e pouco previdente. Subitament­e, os carros elétricos chineses tomaram de assalto a Europa, exatamente como acontecera com os telemóveis, os computador­es, as televisões e todo o tipo de eletrónica. A fase dos produtos chineses baratos passou – ou melhor, foi complement­ada por uma oferta de marca e altos padrões de qualidade. Quanto aos EUA, a liderança americana está à vista, a capacidade da maior economia do mundo para crescer e vencer rapidament­e as dificuldad­es atesta a sua extrema vitalidade. Queremos o mesmo? Então, deixemo-nos de sonambulis­mo. Façamos acontecer.

“Falta-nos competitiv­idade, falta-nos investimen­to, falta-nos dinamismo. O Velho Continente tornou-se complacent­e e pouco previdente.”

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal