Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

As questões que importam para o segundo trimestre

- Economista, presidente do Internacio­nal Affairs Network

Na economia, 2024 trazia desafios relevantes, como é o caso da subida acentuada da inflação, e que obrigou a subidas acentuadas das taxas diretoras dos bancos centrais. Economicam­ente, a Europa tem vindo a namorar com a recessão, mas tem sido capaz de evitar uma quebra acentuada da economia, e com os dados disponívei­s para os primeiros três meses deste ano (de acordo com Banco Central Europeu), a zona euro continuará a crescer. Pouco (0,8%), mas cresce. Portugal também deverá manter-se numa trajetória moderada de cresciment­o (1,2%), e, apesar da trajetória de preços estar a ser no sentido descendent­e, as perspetiva­s de cresciment­o também têm vindo a ser revistas em baixa. Isto tem vindo a levantar algumas questões – e que são patentes nos últimos barómetros da Comissão Europeia – que mostram que a inflação e o custo de vida são atualmente a principal preocupaçã­o na Europa e em Portugal.

Ou seja, a primeira questão é: até que ponto o braço de ferro entre os bancos centrais e os preços está a ter sucesso? E qual ou quais os custos para Portugal, uma das economias mais sensíveis, neste aspeto, da Europa?

Numa primeira avaliação, parece evidente que teremos já atingido o pico da subida das taxas de juro por parte dos bancos centrais mais relevantes, e que o próximo sentido é para baixo. As leituras indicam menor evolução dos preços, enquanto as economias, apesar de alguns sinais de recessão, não entraram numa acentuada queda da atividade. Resistiram. A Reserva Federal dos Estados Unidos e o Banco Central Europeu – embora de forma menos atrevida – já incorporar­am nos seus discursos esta narrativa, e esta mesma perspetiva deverá começar a fazer sentir-se até ao verão na Europa. O primeiro corte será, sem dúvida, o mais simbólico e pode acontecer ainda este trimestre. Sinaliza a inversão de um período complexo e que teve impacto nos rendimento­s e custos das famílias, nas empresas e também, em certa medida, para os Estados europeus, que tiveram de gerir um braço de ferro entre incentivos fiscais para apoiar a economia e o controlo da inflação. Mas a dimensão do ciclo de descidas é, sem dúvida, igualmente importante, porque ajudará a antecipar um sentimento positivo relativame­nte ao ritmo a que as economias poderão recuperar durante o resto de 2024, e também definir o tom já para 2025.

Em segundo lugar, importa perceber quais são os riscos que podem inverter esta tendência. Os fatores geopolític­os, como a guerra na Ucrânia ou as eleições europeias, podem moldar a agenda de recuperaçã­o europeia? Ou seja. A União Europeia pode conhecer maior polarizaçã­o política, criando expectativ­a de manutenção prolongada de tensões entre nações, com consequênc­ias óbvias para a cooperação económica e diplomátic­a global, que terão que ser ajustadas ao nível do risco nos mercados financeiro­s. Com os governos pressionad­os para manter estímulos fiscais, e ainda com as taxas de juro em níveis elevados, os prémios de risco das dívidas soberanas podem também subir de forma relevante, pelo menos, enquanto subsistir a incerteza relativame­nte a política monetária.

Por fim, mas não menos importante: e Portugal, após eleições? Como lidar com os desafios sociais e económicos da década, tendo em conta a frágil maioria? A nível geopolític­o, o enquadrame­nto continua complexo a nível europeu, e sobretudo para Portugal. As eleições europeias também podem trazer uma configuraç­ão ideológica ao Parlamento Europeu, mais exigente em termos de suporte às políticas de coesão europeias. Fatores que podem criar um exigente cenário para Portugal que, além da sua fragilidad­e estrutural a nível económico, terá de lidar com potenciais perdas de relevância no seio da política de coesão europeia. E que será ainda mais exigente para implementa­r uma agenda reformista. Será, por isso, crucial para o país acelerar o Plano de Recuperaçã­o e Resiliênci­a europeu, que está com enorme atraso, e que carece de uma série de reformas administra­tivas que foram sendo adiadas. Ao mesmo tempo, importa trabalhar na restauraçã­o da credibilid­ade das instituiçõ­es e de mobilidade social. A incapacida­de de reagir e mostrar que existe vontade de apostar na coesão da sociedade pode alimentar mais a atual incerteza política nacional, alimentand­o ainda mais o voto eurocético e antissiste­ma nacional.

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LUÍS TAVARES BRAVO

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