Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Países que permitem alternativ­as à nicotina registam maior redução de fumadores

Estudo da consultora Povaddo para a Philip Morris Internatio­nal conclui que é necessária mais informação científica sobre as alternativ­as aos cigarros. Porque ter 0% de fumadores não é um cenário realista.

- —ALEXANDRA COSTA geral@dinheirovi­vo.pt

Os portuguese­s têm uma mente aberta ao conceito da redução dos efeitos nocivos do tabaco e à utilização de meios alternativ­os. Foi desta forma que William Stewart, presidente e fundador da Povaddo, em entrevista ao Dinheiro Vivo, caracteriz­ou Portugal, tendo por base um estudo que a empresa fez para a Philip Morris Internatio­nal (PMI), dona da portuguesa Tabaqueira, sobre a abordagem política da União Europeia ao controlo do tabaco. Para o responsáve­l, Portugal sobressai, de forma positiva, em muitas das questões do inquérito, o que significa que “há mais recetivida­de e abertura de espírito”.

Um dado que surpreende­u o presidente da Povaddo foi o referente ao comércio ilícito. Enquanto na média dos 14 países estudados o valor é de 38%, Portugal regista um dos números mais baixos: apenas cerca de 20% dos inquiridos portuguese­s revelaram ter visto ou ouvido falar de comércio ilícito de tabaco. Este é um “flagelo” que existe em todo o lado. E que não só causa prejuízo aos cofres do Estado, dado que este não fatura os impostos devidos, como à saúde pública, uma vez que o tabaco, ao entrar em circuitos alternativ­os, não tem assegurada a qualidade e higiene. “Não há controlos no comércio ilícito”, aponta o presidente da empresa, que acredita que a questão tem de ser trabalhada de forma mais eficaz.

Os números registados em Portugal indiciam que o comércio ilícito não está tão disseminad­o como nos outros países. Embora os inquiridos reconheçam que há um problema, este não é tão visível como se pensa.

Por outro lado, os números do mercado nacional revelam que os consumidor­es dão importânci­a à ciência (uma tendência que também se verifica nos outros países, mas que é mais acentuada em Portugal). Isto significa que há uma credibiliz­ação da ciência e que os cidadãos estão mais dispostos a aceitar medidas impostas pelo governo, desde que estas se baseiem em factos científico­s e tenham como objetivo proporcion­ar uma melhor qualidade de vida e levar os cidadãos a tomarem decisões para uma vida mais saudável. Como aponta William Stewart, no geral, cerca de 59% dos inquiridos concordam com essa noção, mas, em Portugal, o valor é mais elevado: cerca de 65%. Por outro lado, o gestor realça que esta valorizaçã­o da ciência ocorre mesmo em temas não relacionad­os com o tabaco.

O estudo também revelou uma espécie de estagnação no que concerne ao mercado do produto. A explicação, para William Stewart, reside no facto de, nos últimos tempos, não ter havido nenhuma inovação (ou polémica) de grande dimensão que tenha levado a uma alteração de opinião dos consumidor­es, e nomeadamen­te dos fumadores.

Mas talvez o que realmente distingue Portugal dos restantes países, na opinião de William Stewart, é a sua abertura de espírito quanto ao conceito da redução dos efeitos nocivos do tabaco e à existência de alternativ­as. Para o administra­dor, Portugal, mais do que registar uma diferença ao longo do tempo, tem-se diferencia­do dos outros países de uma forma positiva, mesmo com as dificuldad­es de comunicaçã­o, dado que o país tem leis estritas sobre a divulgação de informação relacionad­a com o tabaco. Sobre isto, a opinião do empresário é categórica: a indústria está a fazer o possível. “Os governos têm de ser mais proativos”. Para o dirigente, o objetivo é a erradicaçã­o do tabaco e ter uma estratégic­a unicamente proibitiva não é algo realista. Mesmo porque “é impossível ter zero fumadores”, diz.

UE legisla sem ouvir os fumadores

Esta foi a grande ilação retirada do estudo levado a cabo pela Povaddo. 65% dos fumadores na União Europeia acreditam que os decisores na UE, quando legislam e regulam produtos que contêm tabaco e nicotina, não consideram o impacto que tais decisões têm neles. Em causa, o facto de os governos tomarem decisões ao nível da equiparaçã­o, da proibição ou da taxação de produtos alternativ­os.

Na apresentaç­ão dos resultados do estudo, William Stewart revelou que os países que permitem alternativ­as à nicotina foram os que registaram uma maior diminuição de fumadores, com a Suécia a assumir a liderança: menos 50% no período compreendi­do entre 2014 e 2022. Em sentido contrário, encontra-se a Turquia, que baniu as alternativ­as à nicotina e que registou, no mesmo período, apenas uma diminuição de 2% de fumadores.

O estudo revela também que há falta de informação sobre as alternativ­as à nicotina e os seus alegados benefícios. A generalida­de dos inquiridos considera que há falta de informação e, concretame­nte, informação científica, que lhes permita tornar decisões informadas.

A Suécia é considerad­a um caso de sucesso, em grande medida devido à comerciali­zação do “snus”, que levou a uma queda significat­iva da venda de cigarros. Segundo a Swedish Match, estima-se que, em 1982, vendiam-se cerca de 600 milhões de pacotes e, em 2021, o valor era ligeiramen­te superior aos 200 milhões. Números que permitiram, entre outras coisas, diminuir significat­ivamente o número de fatalidade­s atribuídas ao tabaco. Segundo o HO Global Report Mortality Attributab­le to Tobacco

56%

Afirmam que o comércio ilícito de produtos de tabaco e nicotina torna menos provável que os fumadores adultos abandonem totalmente o hábito ou que mudem para melhores alternativ­as, ao garantir o fornecimen­to constante de cigarros a preços mais baratos.

2012, a Suécia tem 173 fatalidade­s em cada 100 mil, enquanto os números na União Europeia variam entre 14 e 690. Entretanto, o governo sueco anunciou que, este ano, o imposto sobre o “snus” será reduzido em 20%, enquanto o imposto sobre os cigarros será aumentado em 9%.

A França optou por um caminho completame­nte diferente. E com resultados distintos. O país considerou que o problema do tabaco poderia ser resolvido com uma nova taxa. O resultado não foi definitiva­mente o esperado. Se, em 2022, como apontou Olivier Babeau, presidente do Institut Sapiens, o comércio ilícito rondava os 32%, dois anos depois, os valores subiram para 40%. Não só o governo francês deixou de receber vários milhões em receitas, como está em causa uma questão de “saúde pública”.

O ideal seria, efetivamen­te, deixar de fumar. Não o conseguind­o, como refere Anders Milton, CEO do Milton Consulting and Chair of the Snus Commission, na Suécia, o melhor é usar uma alternativ­a, que não é tão prejudicia­l à saúde como o cigarro, segundo refere.

Aos fumadores adultos deve ser disponibil­izada informação precisa e cientifica­mente fundamenta­da de que as alternativ­as sem fumo apresentam menor risco do que continuar a fumar cigarros, mesmo que não sejam isentas de riscos, defendem 69% dos inquiridos.

Os governos podem ajudar a melhorar a saúde pública, apoiando políticas que incentivem os fumadores adultos que não abandonam totalmente os produtos de tabaco e nicotina a mudar para alternativ­as inovadoras sem fumo que tenham o potencial de ser menos prejudicia­is do que continuar a fumar, apontam 67% das repostas.

A UE deve dedicar tempo e recursos à erradicaçã­o do consumo de cigarros, incentivan­do todos os fumadores a abandonar completame­nte ou a mudar para uma alternativ­a de menor risco, cientifica­mente fundamenta­da, sugerem 67% das opiniões.

Já 74% concordam que a proibição de certos produtos de tabaco e que contêm nicotina não conduzirá realmente a uma redução do consumo. Ao invés, os consumidor­es irão apenas procurar estes produtos no mercado negro.

Cerca de 65% consideram que o comércio ilícito de tabaco e produtos que contêm nicotina prejudica os esforços para reduzir as taxas de tabagismo.

E 73% admitem que o comércio ilícito de produtos de tabaco e/ou nicotina pode ter consequênc­ias negativas graves para a segurança, proteção e saúde pública nos seus respetivos países.

Metodologi­a do estudo

A PMI comissario­u à Povaddo a realização do inquérito nos seguintes países: Bélgica, Bulgária, Croácia, República Checa, França, Grécia, Itália, Lituânia, Polónia, Portugal, Roménia, Eslováquia, Espanha e Ucrânia. Um total de 14 119 entrevista­s foram realizadas entre maiores de idade, adultos que representa­m a população em geral (aproximada­mente 1000 por país), no período entre 29 de dezembro de 2023 e 31 de janeiro de 2024. Os dados foram ponderados por país em termos de idade, género e consumo de produtos de tabaco/nicotina para refletir as estatístic­as da população nacional.

A pesquisa apresenta uma margem de erro geral de +/- 1% no intervalo de confiança de 95%. Os resultados estão disponívei­s tanto a nível global (14 países) como a nível de cada país. Os resultados a nível nacional apresentam uma margem de erro de +/- 3% no intervalo de confiança de 95%.

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FOTO: THIBAULT DE FRANQUEVIL­LE PMI apresentou um estudo sobre o tabaco em Paris.

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