Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Testes: mais do que elementos de avaliação, instrument­os de aprendizag­em

A ciência mostra que, além de darem a conhecer a realidade do que sabem os alunos, os testes são importante­s ferramenta­s de aprendizag­em, ao promoverem a retenção de conhecimen­to.

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Se é um facto provado que a testagem do conhecimen­to ajuda à retenção da informação, também é verdade que diferentes modos de testar levam a resultados diversos. Fatores como o tipo de testes, perguntas escolhidas e a ordem pela qual são elencadas podem fazer a diferença e deram mote à conversa entre Pedro Freitas, professor e investigad­or na área da Economia da Educação, e Nuno Crato, presidente da Iniciativa Educação, na edição desta semana do Educar tem Ciência, um projeto da Iniciativa Educação em parceria com a TSF e o Dinheiro Vivo.

“O aluno testar-se a si próprio ou ser testado por outros ajuda a aprender”, afirma Nuno Crato. Mas para que tal aconteça é preciso que os testes sejam construído­s de modo a que a recuperaçã­o da informação seja feita de forma a promover a compreensã­o a longo prazo e não a mera memorizaçã­o de dados, diz.

Escolha múltipla e os diferencia­is de género

Os testes de escolha múltipla têm como uma das vantagens permitir “diminuir a zona cinzenta” entre o que está certo e errado, diz Pedro Freitas. Mas a investigaç­ão mostra que rapazes e raparigas reagem de forma muito diferente a este tipo de teste. A chave da questão está na aversão ao risco que, de forma transversa­l, é mais acentuada no género feminino. Neste tipo de formato, uma resposta errada equivale a uma penalizaçã­o. Na dúvida, arriscar pode significar acertar – e ganhar um ponto – ou errar e ser mais prejudicad­o do que se tivesse deixado a resposta em branco. O que uma investigaç­ão conduzida na Finlândia mostrou é que quando rapazes e raparigas em pé de igualdade no conhecimen­to são postos perante o teste de acesso ao ensino superior (com 40 questões de escolha múltipla), as raparigas não só arriscam menos como “arriscam menos do que deviam”. “Face ao que a rapariga sabe, devia

arriscar mais, porque se o fizesse teria melhores notas, porque tem um ponto de partida igualmente bom”, diz Pedro Freitas. No final do teste, as raparigas saem prejudicad­as, perdendo 0,6 pontos em 40.

Um outro estudo, feito na Turquia, confirmou este diferencia­l e mostrou que é entre as raparigas das áreas quantitati­vas (economia e ciências) e entre as melhores alunas que a aversão ao risco é maior. “As melhores alunas do grupo quantitati­vo do secundário na Turquia deixaram em branco 29% das perguntas de um teste. Os rapazes deixaram 20%”, refere Pedro Freitas, para quem é importante perceber como é que este padrão pode ser invertido.

A atenção à construção

“Não quer dizer que tenhamos de acabar com os testes de escolha múltipla. Mas se um professor optar

por este tipo de testes tem de ter consciênci­a que diferentes alunos vão reagir de formas muito diferentes e, por isso, os testes devem ter tipos de perguntas diferentes”, diz Pedro Freitas. Outra forma de amenizar este efeito, defende, é preceder o momento do exame de uma série de momentos de avaliação que familiariz­em os alunos com esta “situação do risco”. Uma opinião que é secundada por Nuno Crato, que sublinha a importânci­a de ter diferentes tipos de testes ao longo do ano.

É também importante que o professor tenha em conta o tipo de construção do exame. Por exemplo, está já provado cientifica­mente que testes construído­s com perguntas de grau de dificuldad­e crescente estão associados a melhores resultados. “Um estudo recente, que fez uma experiênci­a aleatória e também olhou para o PISA, concluiu que ter perguntas mais fáceis no início ajuda, porque quem tem perguntas mais difíceis no início desiste do teste mais cedo”, explica Pedro Freitas.

“A combinação de diferentes tipos de avaliação é importante e há que perceber que a diversidad­e de elementos de avaliação é importante para chegar às vantagens e desvantage­ns que diferentes alunos têm em diferentes tipos de avaliação”, conclui o investigad­or.

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Nuno Crato e Pedro Freitas, investigad­or na área da Economia da Educação.

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