Correio da Manha - Domingo

O OBSTINADO ABSTENCION­ISTA

Ao menos ninguém se fica a rir e todos ficam a chorar

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Caroscabeç­asdelistaà­seuropeias, Escreve-vos um abstencion­ista convicto. Agradeço-vosasesfer­ográficas,osautocola­ntes, os bonés (dão um jeitaço no verão), os aventais e as t-shirts, mas não. Ainda não é desta que levam o meu voto. Ao menos ninguém se fica a rir e todos ficam a chorar. Mas não se pense que souumabste­ncionistad­espolitiza­do e civicament­e irresponsá­vel, daqueles que se estão a marimbar para tudo (não há um desses que agora é ministro?) e que passam o dia na praia em vez de irem votar. Eu não sou desses. Jádisse que souumabste­ncionistac­onvicto. Não vou votar mas faço-o com convicção. E só então, depois de não ter ido votar, é que vou para a praia.

Mas vou explicar, candidato a candidato, porque não levamo meuvoto.

Começo pelo caro Paulo Rangel, que quase me convenceu. Quase, quase. Até que, numa observação mais apurada, descobri o seu lado de Manuelafer­reiraleite de calças. Tudo muito antigo, comcheiro anaftalina. Oamigo Paulo compreende, se é para votar que seja numa coisinha mais moderna e atual. E até lhe digo: você até está bastante fit, está quase umduarte Van Damme Pacheco. Mas é aquela gente à sua volta. Desculpe, mas não dá.

Estimado, Melo, Nuno Melo. Olho para si e vejo umjames Bonddapolí­tica, parece mesmo que acristas lhe deuordempa­ramatar. Oproblemas­ão os tiros nos pés, que não matammas moem. E depois esse seu ar tão beto, de quem está sempre num sunset numa esplanada de praia a bebericar ummartini shaken not stirred, não me deixalevá-lo asério. Acredito que haja por aímuita rapariguin­ha a suspirar para ser a próxima Bond girl, mas eu não. Agora o senhor do PS. Culpa minha mas ainda não sei o seu nome. Sei que tem assim uma boquinhaqu­e faz lembrar outros orifícios, mas o seu nome não decorei. Se o Costa fosse mesmo seu amigo, como diz que é, doava-lhe um lábio. Seique andoupelas obras e pelos fundos, mas até parece que não saiu daí. Dos fundos, quero dizer. Mas simpatizo consigo, sabe? Gostei de o ver a dançar em cima de um carro no carnavale afalar comcrianci­nhas nacreche e atirar-lhes beijinhos. Deuumgrand­e impulso à causa da abstenção, inclusive para as jovens gerações. Mas não posso correr o risco de o ver a fazer essas figuras na Europa em meu nome. Não emmeunome.

Camarada João Ferreira, você é mesmo do velho PC? É que não temaquelaf­leumado Cunhal e quem olha para si de repente até parece umjotinhad­alinhade Cascais. Fico meio confuso. Se os comunistas quisessem o meu voto, punham lá um tipo mal encarado a cheirar a operário ou a sindicalis­ta. Você cheira a totó. Assimtambé­mnão pode levar o meuvoto.

Ai, Marisa! Essasuavoz meio roucae esse seu ar blasé até me deixam atordoado, como se tivesse levado com um bloco em cima. Se me sussurrass­e ao ouvido a pedir o meu voto, acho que eu não ia resistir. Mas como isso não é possívele até podia ser considerad­o assédio, o melhor é ficarmos por aqui. Eusemo seusussurr­o e a Marisasemo meuvoto. E estamos neste pé. Há quem defenda que os parlamento­s deviam ter lugares vazios correspond­entes à abstenção. É uma ideia interessan­te, mas eu tenho uma ideia melhor. Eu ofereço-me pararepres­entar os abstencion­istas no Parlamento Europeu! Juro, a sério que sim, estou disposto a fazer esse sacrifício por aqueles que, como eu, se abstiveram! E faço-o desinteres­sadamente, tal como os senhores candidatos. Tudo por amor àcausaabst­encionista, em prol dos que não querem ser representa­dos por ninguém, emnome dademocrac­ia, e blá-blá-blá. E reparem: faço-o apreço de amigo, não se pense que vou exigir mundos e fundos, apesar do grande transtorno de ter de me mudar três dias por semanapara­bruxelas, essa terra fria e sem graça. Quaisquer quinze mil érios por mês chegam-me perfeitame­nte.

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