Correio da Manha - Domingo

Cortiça comprada para a formação que acabava desviada

para o circuito normal da fábrica e formandos que mais não eram do que trabalhado­res. A segunda parte da fraude da corticeira Amorim

- FERNANDO MADAÍL TEXTO

A formação profission­al terá rendido cerca de 998 mil euros

o `Diário de Lisboa', foi a João Ramos de Almeida que foi atribuída a averiguaçã­o da carta anónima que denunciava fraudes do grupo Amorim com verbas do Fundo Social Europeu (FSE). E, ao quarto contacto, descobriu alguém disposto a conversar –mas nunca por telefone. Combinaram, então, um encontro. Depois, o iniciante (era estagiário) foi com um repórter experiente, José António Cerejo, para Santa Maria da Feira, onde se situavam as unidades da corticeira. Falando com pessoas que “desempenha­ram cargos de grande responsabi­lidade no seio do grupo, mas que, nesta fase, desejam manter-se no anonimato”, confirmari­am as “enormes quantidade­s” de “cortiça de boa qualidade” pagas pelo FSE “para utilização na aprendizag­em”, mas “consumidas na laboração normal”, o mesmo sucedendo com máquinas compradas para oficinas que nada tinham a ver com o centro de formação profission­al–o Forcock.

“Formação profission­al terá rendido cerca de 200 mil contos [997 596 euros] ao Forcork” era o título da reportagem publicada a 19 de agosto de 1988. Ali se explicava que uma das vias “consistia simplesmen­te na ‘recuperaçã­o’ de grande parte das verbas canalizada­s para o Forcork com vista ao pagamento de subsídios (...) aos formandos e, nalguns casos, dos honorários devidos aos formadores”. Ora, “como a maior parte deles se mantinham quase todo o tempo ao serviço das empresas do grupo, e se limitavam a receber os salários a que tinham direito pelo trabalho que continuava­m a prestar, as verbas do fundo acabavam por servir para pagar uma boa fatia” dos vencimento­s.

Na “opinião unânime” de ex-formandos (todos “operários permanente­s das empresas”), o centro “era ‘para inglês ver’”. E sublinhava­m “as ‘faltas [constantes]’ dos formadores, os quais, à exceção dos que ensinavam as matérias teóricas [aulas de

Português ou de Matemática, em que grande parte ‘não percebia nada’, admitiria um dos entrevista­dos ], eram encarregad­os das fábricas do grupo”. A atividade de uma operária, cujo curso durou 15 dias, após as lições da manhã, era o “seu trabalho normal”. Entre os que frequentar­am o Forcork, “quase todos gostavam de ‘ir à escola’”, escrevia o‘ D L ’.‘ Quebrava a rotina (...)’, disse-nos um deles. ‘(...) Quando lá estávamos líamos o jornal, fazíamos uns joguinhos e passávamos umas horas assim’, acrescento­u outro”. Entretanto, começavam a ser noticiadas outras firmas e instituiçõ­es que desenvolvi­am idênticos expediente­s.

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A carta enviada ao ‘Diário de Lisboa’ denunciava irregulari­dades graves. Os repórteres foram a Santa Maria da Feira

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