A PRAÇA PÚBLICA
César julga-se filósofo e apregoa-se como
especialista dos tempos modernos. Adepto ferrenho das redes sociais, repica as tiradas desbocadas de muitos compatriotas, como ele agarrados aos ecrãs do ipad e do telemóvel. Já tentou escrever umas dissertações sobre Justiça e Política mas o seu sonho é tornar-se comentador televisivo. Acompanha todos os grandes processos judiciais e, por muito que desconfie de juízes e procuradores, há muito que usa a expressão favorita de certos políticos - “deixemajus
tiçafuncionar!” Pior é quando a Justiça emperra e não funciona.
César é um tipo obviamente paradoxal. Tanto critica os jornalistas e a Comunicação Social pela violação do segredo de justiça como bebe e divulga a frivolidade e/ou a perversidade das notícias falsificadas (vulgo fake news). Confunde, como tantos outros, o Segredo DE Justiça com o secretismo DA Justiça. Na praça pública das redes sociais, repete sempre à exaustão outra bengala de muitos comentadores encartados: “Ninguém deve ser julgado na praça pública!” César nunca se deu ao trabalho de vasculhar as origens da Praça Pública, a Ágora da Grécia antiga, cujas funções democráticas e importância social se vieram a perder ao longo do tempo. Era na Praça Pública que os cidadãos gregos com direitos podiam discutir e decidir sobre assuntos ligados às Leis, à Cultura, às Obras Públicas e à... Justiça. A Praça Pública era um local fundamental para a Democracia e para as Liberdades, tal como os gregos as entendiam. E era na Praça Pública que, tantas vezes, se divulgavam segredos públicos e privados e se pedia Justiça. Com o passar dos séculos, o segredo de Justiça afirmou-se no Direito, muito antes de se consagrar o direito à Informação no quadro da Liberdade de Imprensa. Hoje, há um óbvio problema de relacionamento entre o segredo de Justiça e o direito à Informação. Em prejuízo da Democracia, o Jornalismo e o Sistema Judicial andam quase sempre de candeias às avessas, sobretudo pelo dever deontológico de sigilo profissional dos jornalistas. É importante e ético que o interesse público se aproxime do interesse DO público. Tal como o princípio socrático do “só sei que nada sei” deve servir para que a Justiça e os jornalistas queiram saber sempre mais. César, sem pinga de ironia, repetiu esta semana os estribilhos do costume, a começar pelo “sóseiquenadasei” . Suspeitam os amigos que se estava a referir a uns quantos milhões de euros sem certidão de nascimento e a José Sócrates, o homem e a sua circunstância.
Jornalismo e Sistema Judicial andam de candeias às avessas