Correio da Manha - Domingo

JÁ SE ESPEROU TEMPO DEMAIS

Há 10 anos, o ‘Correio da Manhã’ reuniu mais de 50 mil assinatura­s numa petição para criminaliz­ar o enriquecim­ento ilícito. Nada mudou entretanto, mas esta semana foi o próprio Marcelo Rebelo de Sousa a dizer que já se esperou tempo demais

- Por Fernanda Cachão

A petição promovida pelo ‘Correio da Manhã’ em 2011 ultrapasso­u, em menos de três meses, as 30 mil assinatura­s - cinco anos depois do então deputado socialista João Cravinho ter visto o seu ‘pacote anticorrup­ção’ ser travado pelo primeiro-ministro José Sócrates. O mesmo Sócrates que haveria de ser detido em 2014 à chegada ao aeroporto de Lisboa, vindo de Paris, por ser suspeito no âmbito de uma investigaç­ão por fraude fiscal, branqueame­nto de capitais e corrupção – que passou, agora, pelo crivo do juiz Ivo Rosa. “O Sócrates e o Alberto Martins mandaram pura e simplesmen­te chumbar”, conta Cravinho, 15 anos depois, à jornalista Marta Martins Silva, que tenta perceber o que teria sido diferente nos principais processos por corrupção se houvesse em Portugal o crime que Marcelo julga “ter-se esperado tempo demais para punir”.

Aversão final daquele que ficou conhecido como o` pacote Cravinho '– um conjunto de medida san ti corrupção que o deputado como mesmo nome apresentou no parlamento–já tinha deixado cair a proposta de criminaliz­ação do enriquecim­ento ilícito dos detentores de cargos públicos. Estávamos em 2007, José Sócrates era primeiro-ministro e João Cravinho já tinha percebido, ainda em 2006, que o governante se transforma­va num animal feroz sempre que se fazia menção ao tema do enriquecim­ento ilícito. Isso mesmo ficou à vista de todos num debate no parlamento em que se discutia a possibilid­ade de criminaliz­ar os detentores de altos cargos públicos ou políticos quando fosse demonstrad­o que tinham fortuna manifestam­ente incompatív­el com os rendimento­s declarados, proposta de Cravinho. Nesse dia, perante a pergunta de Luís Marques Mendes , à época presidente do PSD: “Porque é que o Governo e o PS hesitam tanto no combate à corrupção?”, José Sócrates pôs logo as garras de fora: “A isto chama-se baixeza. Isto não tem outro nome, sr. deputado, senão baixeza! É que para combater a corrupção não é preciso fazer asneira! E seria um erro, a propósito do combate à corrupção, pôr em causa valores sólidos do Estado de direito, como, por exemplo, o ónus da prova. Não é aceitável, numa sociedade moderna, que invertamos o ónus da prova no caso do enriquecim­ento ilícito”, disse perante todos. “Sócrates não tinha o menor interesse político no sentido de construir um sistema de combate à corrupção eficaz e opôs-se a qualquer tentativa séria nesse sentido. E combateu isso o mais ferozmente que pôde, através da direção do grupo parlamenta­r do partido socialista. Tanto que, na versão final que eu apresentei no parlamento com três camaradas, não constava isto porque tínhamos chegado a uma suposição, a uma expectativ­a de que se isso [o crime do enriquecim­ento ilícito] não constasse daquele pacote explicitam­ente, por um lado o pacote se

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