AFINAL COME-SE BEM NO RATO
O crítico Francisco Seixas da Costa visitou – e aprovou – o restaurante S, da chef Ilda Vinagre, em Lisboa.
LISBOA Numa zona da cidade que «não costuma ser notável pela sua restauração», Francisco Seixas da Costa descobriu uma casa onde ser moderno não obriga a abdicar da autenticidade. No novo restaurante S, da chef Ilda Vinagre, encontrou todos os condimentos para uma «refeição simpática».
Nem tudo o que tem surgido pelo país, como resposta à atual pressão turística, em matéria de restaurantes configura ganhos reais de qualidade. Muita da oferta restaurativa que por aí anda, numa espécie de receita cosmopolita, apresenta-se com pratos que apenas buscam ter um grau alargado de aceitabilidade, para tocar públicos de variadas origens e culturas. Porém, ao fazê-lo, isso traduz-se, frequentemente, em propostas em que a busca da originalidade roça o mero pretensiosismo. Isso é patente, aliás, no vocabulário rebuscado na descrição de alguns pratos e, não raramente, no modo como o «chefe» se quer fazer projetar na linguagem de quem atende as mesas.
No ambiente muito competitivo de hoje, é importante saudar os projetos que sabem combinar bem modernidade com autenticidade. Restaurantes que sabem trabalhar produtos e pratos do receituário português tradicional, dando-lhes tratamento imaginativo, sem enveredarem por uma esforçada revolução de sabores. Se isso é combinado com boa apresentação dos pratos, serviço atento e ambiente de sala agradável, ficam criadas as condições para uma refeição simpática.
Historicamente, a zona do Largo do Rato, em Lisboa, não costuma ser notável pela sua restauração. Hoje, salvo o clássico Casa da Comida, nas Amoreiras vizinhas, as propostas não são em geral deslumbrantes. Foi, por isso, com alguma curiosidade que fiz uma visita ao restaurante S, recomendado por um amigo atento. O restaurante ocupa um espaço maior do que o seu exterior deixa supor. Tem um ambiente informal, com imagem alegre, ajudada por peças de arte decorativa de origem
alentejana. O pessoal – só mulheres, no dia em que por lá passei! – mostrou uma rara simpatia e atenção, sabendo dar uma explicação cuidada do menu.
A responsável pelo S, Ilda Vinagre, tem tradição familiar ligada a uma bela experiência da restauração portuguesa: é irmã da saudosa Júlia Vinagre, que tanto se ilustrou no Bolota, em Terrugem (Elvas), com muito interessantes incursões posteriores em Castelo de Vide e em Lisboa. Ilda Vinagre esteve, ela própria, no magnífico Bela Sintra, de São Paulo – um dos melhores restaurantes portugueses do Brasil.
Para o S, Ilda Vinagre traz-nos um menu muito curioso. Nas entradas, destacaria a salada de bacalhau fumado e as empadinhas de perdiz. Depois, um «submenu» com três especialidades de bacalhau: o «nunca chega», o bacalhau da Ilda e o bacalhau à S. Nos peixes, a lista (cuidada na sua apresentação) tinha vários pratos de camarão (à Bela Sintra com arroz de amêndoa, ao champanhe e provençal com arroz de alho), atum braseado e polvo à lagareiro, além do peixe do dia. Nas carnes, a lista era substancial: arroz de pato à brasileira, a tarte de aves,
charlotte de aves com ervilhas salteadas e coisas mais comuns, sempre de excelente qualidade: posta, escalopes e bife à portuguesa. A lista de vinhos necessitava, à época da visita, de ser mais variada. Este é um restaurante que promete, desde que se mantenha com a qualidade que demonstrou.