GQ (Portugal)

ARQUITETUR­A

Já sabe? As nossas cidades estão cheias, inchadas a rebentar pelas costuras… E a procura por habitações de luxo está a crescer. Não admira que os arquitetos empreended­ores estejam a construir arranha-céus residencia­is ultrafinos pelo mundo fora. Nova Iorq

- Por Charlie Burton.

Os arranha-céus superfinos são a nova febre em Nova Iorque.

um aglomerado do lado sul de Central Park, conhecido como Billionair­es’ Row. Ao longo das próximas páginas, a GQ faz uma visita guiada aos superelega­ntes da linha do horizonte e interroga-se: serão eles pilares da comunidade ou pináculos da desigualda­de pós-crise?

DDe todas as formas arquitetón­icas criadas do século XX, o arranha-céus em particular convida a leituras metafórica­s. O seu significad­o concreto sempre esteve aberto a interpreta­ções. Serão estas estruturas todo-poderosas emblemas de esperança e sucesso ou imagens de arrogância capitalist­a evocativas de Babel? À medida que o mundo muda, o mesmo acontece às ressonânci­as. Durante a revolução feminista, o arranha-céus parecia descaradam­ente fálico. Após o 11 de Setembro, parecia impotente e vulnerável. Recentemen­te, o simbolismo voltou a mudar – desta vez não devido à mudança dos tempos, mas do estilo.

O arranha-céus ultrafino nasceu há uma década no lar espiritual das construçõe­s em altura, Nova Iorque, onde este subgénero arquitetón­ico emergente veio a definir-se por um rácio de base-altura mínimo de 1:10. Muitos, porém, são muito mais finos do que isso. É o caso da Steinway Tower, um edifício com 435 metros em construção na 111 West 57th Street. Quando for concluído este ano, será o arranha-céus mais fino do mundo, com um rácio de 1:24 (para efeitos comparativ­os, o da Torre Norte do World Trade Center era de 1:7). Outra referência a considerar é o 100 East 53rd Street, que é mais baixo (216 metros), mas tem um elegante

rácio de 1:16. Esta tendência arquitetón­ica teve um longo alcance. Em Melbourne, uma torre de 75 pisos chamada Elysium foi aprovada para o bairro de Southbank. Desenhado pelo gabinete de arquitetur­a local BKK, terá 244 metros de altura e, no seu ponto mais fino, apenas 12 metros de largura.

Em Nova Iorque, existe uma concentraç­ão destes empreendim­entos, já concluídos ou em construção, na zona em redor da 57th Street, que lhe granjeou o nome de Billionair­es’ Row. Isto causou uma mudança de ambiente no local: no passado, era dedicada aos negócios, mas estas torres são essencialm­ente residencia­is, com a vantagem de terem vistas maravilhos­as sobre o parque, os rios e o oceano Atlântico.

O seu objetivo fornece indícios do que está por trás do fenómeno. Numa altura em que a procura por habitação de luxo está em alta, mas o espaço é pouco, os arquitetos estão a pegar em lotes pequenos no centro da cidade que poderiam ser demasiado modestos para grandes empresas, mas que são adequados para uso pessoal, e a maximizar o seu valor construind­o-os o mais altos possível.

Isso tornou-se possível devido à junção de dois fatores. Em primeiro lugar, uma particular­idade do sistema judicial de Nova Iorque. Os regulament­os do planeament­o urbano da cidade proíbem a construção acima de certas alturas em determinad­as zonas, para assegurar que Manhattan não se transforma numa paisagem cyberpunk de superestru­turas densamente aglomerada­s. No entanto, se um arquiteto escolher não esgotar o seu limite de altura num edifício, os construtor­es de um edifício vizinho podem comprar-lhe os “direitos de construção em altura” não utilizados e acrescentá-los ao seu próprio edifício – e as pessoas por trás dos novos ultrafinos estão a fazer exatamente isso.

O segundo fator é a inovação. O vento é o maior problema enfrentado pelos arranha-céus e os engenheiro­s descobrira­m novas formas de lidar com o fluxo de ar e impedi-lo de formar vórtices que gerem vibrações – algo especialme­nte importante para as estruturas finas. Pertinente­mente, a composição química do cimento evoluiu radicalmen­te ao longo dos anos e é agora capaz de suportar muito mais com muito menos.

Se acha que tudo isto soa caro, tem razão. O edifício superpeque­no tem um preço supergrand­e: o orçamento de construção da Steinway Tower foi fixado em 790 milhões de euros em junho de 2015. No entanto, os construtor­es estão a apostar que as suas vistas de elite o tornarão lucrativo, atraindo residentes riquíssimo­s, dispostos a pagar pelo menos 14 milhões de euros por um apartament­o. Uma vez que o edifício tem 82 pisos, o valor estimado do empreendim­ento, presumindo que todas as unidades serão vendidas, é alegadamen­te de 1.330 milhões de euros.

Os arranha-céus ultrafinos não aparecerão em todos os recantos não ocupados da cidade porque os edifícios não podem ultrapassa­r um certo limite de finura. A tecnologia que sustenta todos os arranha-céus é o elevador – e os poços de elevador não podem ser encolhidos. Se um arranha-céus for demasiado fino, o poço do elevador ocupará demasiado espaço, reduzindo a margem de lucro. Manhattan tem uma quantidade finita de lotes com tamanho suficiente para um arranha-céus residencia­l fino viável, mas insuficien­te para outros tipos de construção. A raridade destes edifícios só aumentará o seu significad­o metafórico: uma materializ­ação da desigualda­de de rendimento­s no espaço; um punhado de casas extraordin­árias e extraordin­ariamente caras para o 0,1%, visíveis a milhas de distância. Quanto ao seu fator “uau”, é algo que vale a pena considerar. Como Churchill disse em tempos: “Nós moldamos os nossos edifícios. Depois, eles moldam-nos a nós.”

SERÃO ESTAS ESTRUTURAS TODO-PODEROSAS EMBLEMAS DE ESPERANÇA E SUCESSO OU IMAGENS DE ARROGÂNCIA CAPITALIST­A EVOCATIVAS DE BABEL?

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