A HISTÓRIA DO MANEIRAS COMEÇA AGORA
A criatividade e o arrojo do chef Ljubomir Stanisic estenderam-se a um novo espaço no Bairro Alto. Quem conhece o bistrot, na Trindade, poderá não estranhar as ementas, mas ficará surpreendido com algumas novidades e, decerto, impressionado com a versão restaurante de “Ljubo”.
Ésó quando paramos para pensar no que significa “pasta de cabeça de vaca” que nos apercebemos do que estivemos a comer. No momento, quando tudo está a acontecer, Ljubomir Stanisic acrescenta beleza e sabor aos pratos com as suas inigualáveis narrativas. “Este prato era a única coisa boa que o meu pai fazia lá em casa”, conta à mesa grande, em torno da qual todos nos sentamos, sem rodeios e, parece, também sem rancores, apesar do que fica subentendido da explicação. “Prefiro recordá-lo pelo que ele fazia bem”, conclui. E é assim que, só quando chegamos a casa e paramos para pensar, a ideia nos bate na cabeça: pasta de cabeça de vaca?! Caramba.
UMA SALA PARA TODOS
Tal como a pasta de cabeça de vaca já citada – que leva ainda tutano, entre outros ingredientes –, o que se encontra neste 100 Maneiras tem a sua história, como a chegada do fogão à cozinha, um fogão desenhado pelo próprio Ljubomir e que não cabia no portão daquilo que fora, em tempos idos, a Adega do Teixeira (a operação para enfiar o fogão de uma tonelada na cozinha incluiu o recurso a uma grua e a destruição de paredes construídas nas obras de remodelação do espaço, por exemplo). Numa casa com história, feita por pessoas com histórias, não é de admirar que exista uma longa mesa que podemos descrever como “comunitária”, tendo o termo “comunitário” aplicado a este tipo de estabelecimentos de ser sempre entendido como algo restrito à partida. Trata-se de uma mesa onde cabem 10, talvez 12 pessoas, talvez mais se os comensais aceitarem que há sempre lugar para mais um – mas pessoas que não têm necessariamente de se conhecer todas umas às outras: a ideia é mesmo essa, pôr as pessoas a partilhar a mesa e as histórias umas com as outras. Naturalmente, quem preferir o recato pode optar pelas mesas pequenas, onde a privacidade é garantida. Neste espaço cabem todos.
UM MENU DA EUROPA
Para afinar o conceito do restaurante. Ljubomir Stanisic fez pesquisa por vários destinos – muito Norte e muito Sul, muito Báltico e muito Mediterrâneo, Helsínquia meets Barcelona que meets Copenhaga que meets Madrid que meets Estocolmo. Porém, a história deste menu, que é único e que tem preço único, começa em Sarajevo, na Bósnia-Herzegovina, cidade natal de Ljubo, a terra onde cresceu, onde experimentou os primeiros sabores e onde escreveu as primeiras linhas da sua história – uma história que inclui também sabores dos mais amargos, mas que o chef não esconde e tenta reaproveitar de modo positivo. Por exemplo, a História – é assim que se chama o menu –, começa com um enfático “Bem-vindos à Bósnia”, que mais não é que os aperitivos, pão-rosa e broa de milho e depois elementos que, provavelmente, não sabemos ao certo o que são e não temos bem a certeza de querermos saber (ajvar, kajmak, stelja), porque são deliciosos e mais vale preservá-los assim, sem detalhes potencialmente dissuasores. Mais adiante, encontramos o Charuto de Sarajevo (espuma de batata, pão de chá fumado e “tabaco” duvan cvarci) e uma série de sabores de indisfarçável inspiração balcânica – as beterrabas, os rábanos, o pão somun – misturados com outros sabores e ingredientes que diríamos pan-europeus.
A carta de vinhos é de qualidade impressionante, mas convém que se saiba ao que se vai. Para tal, o 100 Maneiras disponibiliza dois tipos de harmonizações, a 100 Risco e a Com Risco. A primeira, mais económica (num sentido generoso de “económico”) inclui sete vinhos. A segunda, mais arrojada, chega à prova dos 10. No fundo, tudo depende da história que se quiser contar da experiência no 100 Maneiras.