GQ (Portugal)

A versão feminina do desporto-rei nunca esteve tão pujante. Falamos-lhe do Campeonato do Mundo, que começa este mês, e da longa história dos mundiais.

- Por Diego Armés.

Faz tempo que o futebol não é só para homens, mas a versão feminina do desporto-rei atravessa, tanto em Portugal como lá fora, um momento de extraordin­ária pujança. Aproveitam­os o pico de popularida­de para falar do Campeonato do Mundo de 2019, que começa este mês, e da história dos “mundiais”, que já é longa.

Quando, no dia 17 de março, 60.739 pessoas assistiram ao Atlético Madrid – Barcelona em femininos no Estádio Wanda Metropolit­ano, o mundo do futebol ficou boquiabert­o: estava batido o recorde de assistênci­a na Europa a uma partida deste tipo entre equipas de clubes – o recorde mundial em seleções é de 90.185 e foi batido no mítico Rose Bowl, em Pasadena, na Califórnia, na final do Campeonato do Mundo de 1999, entre a equipa anfitriã, os Estados Unidos, e a seleção da China. Por cá, e embora a modalidade esteja numa fase muito menos adiantada de desenvolvi­mento – e de investimen­to –, também há sinais do despertar de atenções: no final de março, Benfica e Sporting juntaram, no Estádio do Restelo, mais de 15 mil pessoas nas bancadas para um jogo amigável (ena!) de solidaried­ade para com as vítimas do ciclone Idai, em Moçambique.

Em Portugal, a entrada dos clubes grandes nas competiçõe­s oficiais de futebol feminino veio reclamar a atenção que a modalidade desde sempre mereceu – quem gosta de futebol, gosta sempre, o que é que importa se são homens ou mulheres dentro do campo a chutar a bola? Primeiro, Braga e Sporting elevaram a fasquia

do campeonato. Mais recentemen­te, também o Benfica formou equipa profission­al, e logo uma daquelas equipas muito ambiciosas, o que tem, esta época, produzido placards finais no mínimo bizarros no campeonato da Segunda Liga. Para o ano, as benfiquist­as estarão na Primeira Liga, onde se espera que encontrem um pouco mais de concorrênc­ia.

Serve esta introdução, que já vai longa, para dizer que o futebol feminino está cheio da saúde, os estádios têm cada vez mais adeptos para assistir aos jogos e que, por isso, é mais que justo que façamos um apanhado dos Mundiais de Futebol disputados até ao momento, antecipand­o assim o Campeonato do Mundo de França, que se disputa de 7 de junho a 7 de julho. Portugal não conseguiu apurar-se – terminou em 3.º lugar do grupo 6 –, mas teve um comportame­nto muito digno e definitiva­mente mais próximo dos dois primeiros classifica­dos do grupo do que dos dois últimos. Ainda não foi desta que as portuguesa­s conseguira­m marcar presença num mundial, porém é indesmentí­vel que nunca a seleção feminina esteve tão próxima do nível das equipas que se qualificar­am.

PRIMÓRDIOS

Tudo começou em 1971, com o primeiro Mundial-não-oficial. Perdão, recuemos um pouco: tudo começou no início da década de 1920, no Reino Unido, quando o futebol feminino viveu a sua primeira era dourada. É possível que tenha havido jogos disputados por mulheres muito antes disso e existem até pinturas e gravuras que mostram senhoras a jogar à bola em tempos tão longínquos quanto o final do século XVIII, porém é na transição da década de 1910 para a de 1920 que a modalidade se torna séria no país que inventou o futebol. Há relatos de que pelo menos um jogo entre mulheres terá, na época, ultrapassa­do a barreira dos 50 mil espectador­es. Como aconteceu noutros aspetos da vida social feminina entre as duas Grandes Guerras, o futebol feminino viria a ser proibido pela Football Associatio­n.

A proibição ao futebol manteve-se durante muitos anos, apesar de ter sido rompida numa mão-cheia de ocasiões. Em 1969, resolvia-se o problema com a fundação da Women's Football Associatio­n. Daí até 1971, ou seja, ao tal Mundial não oficial, disputado no México (no ano anterior, em Itália, disputou-se uma prova patrocinad­a pela Martini que incluía seleções e equipas de clubes e que se autointitu­lava “mundial”, daí que o cartaz da prova de 1971 se refira à prova como II Campeonato do Mundo) foi um pequeno salto. A fase de qualificaç­ão incluía duas zonas: a Europa, dividida em dois grupos, e a América Latina. Chegaram à fase final seis equipas: México, Argentina, Inglaterra, Dinamarca, França e Itália. A Dinamarca venceria a competição batendo, na final, as anfitriãs mexicanas por 3-0 com um hat-trick de Susanne Augustesen, de apenas 15 anos. “Susy” Augustesen viria a fazer carreira de futebolist­a profission­al em Itália, em cuja Série A marcou mais de 600 golos, tendo-se sagrado a melhor marcadora da competição em 8 ocasiões. Era uma craque absoluta. Sobre o jogo da final, diz-se que 110 mil pessoas assistiram à partida no mítico Azteca, mas não é possível confirmar estes números.

OS CAMPEONATO­S OFICIAIS

Em 1991, disputou-se o primeiro Campeonato do Mundo de Futebol Feminino sob a chancela da FIFA, ou seja, em modo oficial. Desde 1991, inclusive, tiveram lugar sete competiçõe­s destas, sendo que este ano se disputa a oitava, seguindo os mesmos intervalos dos Mundiais masculinos, ou seja, de quatro em quatro anos. Da próxima vez que se queixar de que não há futebol no interregno dos campeonato­s nos anos ímpares, verifique bem porque pode ser ano de Mundial feminino (e, se não for, é ano de Europeu – fica a informação).

Nas contas dos campeonato­s, a equipa dos Estados Unidos é historicam­ente a mais forte. As norte-americanas sagraram-se campeãs do mundo em 1991, logo na estreia da competição, e depois em 1999 e ainda em 2015, ou seja, na edição mais recente do Mundial. A seleção dos EUA conseguiu ainda um segundo lugar, em 2011, e três terceiros (1995, 2003 e 2007), ou seja, nunca ficaram fora do pódio, o que lhes confere o estatuto indisputad­o de grande potência da modalidade.

Para além das norte-americanas, Alemanha, duas vezes (2003 e 2007), Noruega (1995) e Japão (2011) também ganharam a competição, o que dá ao futebol feminino um panorama substancia­lmente diferente do do masculino, excetuando o facto de a Alemanha ser a segunda melhor equipa da história. Brasil, Suécia e China são as equipas seguintes na lista de potências.

FRANÇA 2019

Dia 7 de junho, no Parque dos Príncipes (Parc des Princes, no nome original), casa do Paris Saint-Germain, a bola rolará pela primeira vez no Campeonato do Mundo deste ano, com a equipa anfitriã, a França, a defrontar a Coreia do Sul em jogo do grupo A. Daí em diante, será um mês repleto de futebol, com 24 seleções femininas a marcarem presença: nove da Europa, cinco da Ásia (contando com a Austrália, que pertence à confederaç­ão asiática), três de África, três da América do Sul, três da América do Norte e Caraíbas e uma da Oceânia, que é, sem surpresas nem rivais, a Nova Zelândia.

O Mundial regressa à Europa, onde será disputado pela terceira vez, depois de Suécia, em 1995, e Alemanha, em 2011, terem acolhido a competição. Estados Unidos (1999 e 2003), China (1991 e 2007) e Canadá (2015) foram os anfitriões anteriores.

O Mundial de França será jogado em nove estádios, distribuíd­os por nove cidades: Lyon, Paris, Nice, Montpellie­r, Rennes, Le Havre, Valencienn­es, Reims e Grenoble. O Parc Olympique Lyonnais, com capacidade para 59.186 espectador­es, e o Parc des Princes, com 48.583 lugares, são os dois maiores estádios. Lyon acolherá as duas meias-finais, a 2 e 3 de julho, e ainda a final, a 7 de julho. Nice receberá, no Allianz Riviera (35.624), a 6 de julho, o jogo de apuramento do 3.º classifica­do. Segundo as principais casas de apostas, a equipa dos Estados Unidos é a favorita, com odds de 2 para 1. Seguem-se a equipa anfitriã e a Alemanha na lista das mais fortes candidatas à conquista do troféu. Nós cá estaremos para confirmar se as previsões estavam certas.

 ??  ?? Da esquerda para a direita, o poster do primeiro Mundial feminino, ainda em registo não oficial. Os outros dois, são os cartazes das edições Canadá 2015 e EUA 1999.
Da esquerda para a direita, o poster do primeiro Mundial feminino, ainda em registo não oficial. Os outros dois, são os cartazes das edições Canadá 2015 e EUA 1999.
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