GQ (Portugal)

BROCKHAMPT­ON

A BOY BAND SINGULAR QUE NASCEU NA INTERNET

- Por Ana Saldanha Fotografia de Tiago Filipe

Os miúdos que se juntaram para fazer música agora são magnatas online e caminham para o quarto álbum depois de um contrato milionário. Na sua passagem por Portugal, tivemos tempo para uma entrevista flash.

Éa boy band que se separa de tudo o que achamos que sabemos sobre boy bands. Conheceram-se em 2012, num fórum online para fãs de Kanye West (KanyeToThe.com) quando o atual líder da alcateia, Kevin Abstract, recorreu ao site para procurar bandmates, pessoas que se quisessem juntar a ele para fazer música. Nasceu o grupo AliveSince­Forever, com os fundadores Ameer Vann e Merlyn Wood a juntarem-se a Abstract.

Em 2014, uma redefiniçã­o faz nascer os Brockhampt­on, que se batizam com o nome da rua em Corpus Christi, Texas, onde vivia Kevin e onde passa a viver o coletivo de rap a que se juntam Matt Champion, Russell “Joba” Boring, Dom McLennon, Romil Hemnani, Ciaran McDonald (Bearface), os beatmakers Jabari Manhwa e Kiko Merley, Henock Sileshi na direção criativa, o fotógrafo Ashlan Grey, Robert Ontenient como webmaster e Jon Nunes como manager.

Ao todo, entre cantores, rappers, produtores, agentes, designers e managers, e ao contrário do que acontece com outras bandas em que só dá a cara quem sobe ao palco, o coletivo tem 13 membros, com idades entre os 22 e os 26 anos. Seriam 14, mas a banda sofreu uma baixa em maio de 2018

quando Ameer Vann foi acusado de comportame­ntos abusivos por fãs e ex-namoradas. Na altura, os casos de abuso sexual eram tema central nos média e, com a banda a ter acabado de assinar um contrato de 15 milhões de dólares com a editora RCA Records, o grupo tomou a decisão de afastar um dos membros fundadores.

Mas, para explicar este fenómeno, não precisamos de recuar muito. A banda lança o seu primeiro trabalho (o EP All-American Trash) em 2016, mas é no ano 2017 que se fixa no mapa: em junho sai o primeiro trabalho coeso e “a sério”, o Saturation I. O que a indústria não sabia é que o coletivo de hip-hop experiment­al se preparava para lançar mais dois volumes no mesmo ano (Saturation II, em agosto, e Saturation III, em dezembro). Um total de quase 50 músicas num só ano, um plano premeditad­o que pretendia saturar o mercado com a sonoridade brockampta­riana para que fosse impossível passarem despercebi­dos. E resultou.

Pelo meio, foram construind­o uma grande base de seguidores online e uma das razões é o facto de abordarem temas fraturante­s como sexualidad­e – Abstract é negro e abertament­e gay, falando da sua sexualidad­e em várias músicas, quando o hip-hop ainda é um meio marcado pelo sexismo e pela homofobia –, discrimina­ção, violência sexual, religião e política. Não demorou muito até que os espetáculo­s esgotados fossem transforma­ndo em mediática a banda que, na génese, era apenas de culto, muito porque começaram a fazer música para se sentirem representa­dos.

Em setembro de 2018, o aguardado Iridescenc­e (o lançamento foi adiado duas vezes, consequênc­ia da saída de Ameer) mostra que a trilogia Saturation foi o lançamento do que veio para ficar. O estilo foi reformulad­o e arriscaram mais, o que acabou por não lhes dar a resposta de que estavam à espera. Ainda assim, o primeiro álbum distribuíd­o pela Question Everything, um braço da RCA Records, chegou ao primeiro lugar do top Billboard 200.

Avançando para julho, os fãs já estavam à espera de novidades. A consistênc­ia habituou-os a ter, pelo menos, um álbum por ano

e foi no Instagram que anunciaram o próximo lançamento do coletivo. Num vídeo de poucos segundos em que se vê Matt Champion sentado no avião que tem sido adereço de palco nos últimos concertos, a câmara aproxima-se dando destaque ao boné. Lê-se a palavra GINGER. Estava anunciado o quinto álbum de Brockhampt­on.

Atrás da cortina

Em janeiro deste ano a banda publicou datas para uma tour mundial que passaria por Portugal. Tínhamos data marcada para 6 de julho na Ericeira, no palco principal do Sumol Summer Fest. Ainda que se tenha estranhado o local escolhido para a estreia (as apostas andavam pelo Super Bock Super Rock, NOS Primavera Sound e NOS Alive), a surpresa de ver a banda por cá ofuscou os pormenores da localizaçã­o.

No dia do concerto troquei emails com Jon Nunes, manager e membro do rap collective, que me informava de que todos tinham concordado em agendar uma entrevista, que ia acontecer mesmo antes do concerto e cuja logística não estava definida. Durante o dia, através das redes sociais dos membros, fui sabendo que os rapazes estavam a desfrutar de Lisboa, do passeio à gastronomi­a, e, pelo recinto do festival, era claro que muita gente estava ali para os ver.

Encontrei-me com Jon à porta do recinto já depois da hora combinada. Ossos do ofício e imprevisto­s típicos de festival atrasaram a entrevista e foi-me dito que teria cerca de 15 minutos, porque o concerto não se podia atrasar. Segui-o até ao backstage – uma sala com camarins improvisad­os com cortinados, cada um destinado a um dos nomes do cartaz. Quando a cortina foi aberta e os rapazes começaram a sair (10 dos 13), eu ia jurar que todo o momento de apresentaç­ão individual e aperto de mão me consumiu metade dos tais 15 minutos que tinha, mas não tive tempo para me importar com isso. Pareciam calmos, animados e, sem dúvida, mais habituados à situação do que eu.

Sentaram-se em sofás, cadeiras e no chão, numa meia-lua improvisad­a, eu sentei-me no chão e antes de disparar a primeira pergunta demorei alguns segundos para associar aquelas caras aos nomes e às vozes que me tinham levado um álbum e meio a distinguir. Não me orgulho da primeira questão ter sido o mais clichê possível: “Gostaram de Lisboa?” À minha direita, Joba, de Estrella na mão, elogia a cerveja, diz que adoraram a cidade e confidenci­a que gravaram um videoclipe durante a tarde na capital, Merlyn interrompe para elogiar o marisco.

Sobre Ginger, Kevin e Romil contavam, aquando da nossa conversa, que estava 90% acabado. O álbum saiu a 23 de agosto e pretende ser um álbum positivo, com boas energias. Perguntei se deveríamos esperar por um Saturation IV, mas, entre risos, Kevin explicou que era difícil repetir a fórmula e que o facto de serem muitos contribui para a imprevisib­ilidade do resultado final porque cada um “faz a sua cena” e não definem os temas que cada um vai abordar antes de chegarem ao estúdio.

Falámos da primeira digressão mundial e das principais diferenças entre o público americano e o europeu – a resposta foi consensual: apontaram a energia como fator diferencia­dor. E isto foi antes do concerto que mereceu elogios e agradecime­ntos de praticamen­te todos os membros da banda nas redes sociais e que arrancou um “o melhor concerto da tour até agora”, no Instagram de Kevin. “Até agora” o título ainda não foi revogado.

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Sumol Summer Fest, este ano, que marcou a estreia da banda em Portugal. Ainda que se apresentem
com 13 membros, apenas seis preenchem o palco nos espetáculo­s.
As fotografia­s desta página foram captadas durante o concerto no Sumol Summer Fest, este ano, que marcou a estreia da banda em Portugal. Ainda que se apresentem com 13 membros, apenas seis preenchem o palco nos espetáculo­s.
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