GQ (Portugal)

MARÍA JOSÉ PICÓ ROBLES

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Idade: 57 anos

Local de residência: Elche Situação: Procura a irmã gémea, nascida no dia

28 de março de 1962 na Residencia 20 de Noviembre, em Alicante Durante décadas María José Picó Robles considerou-se uma mulher de sorte. Estava viva e a sua irmã gémea, que só vivera três dias em 1962, fora enterrada numa vala comum

em Alicante. “Agora acho que tenho sorte, porque tive a oportunida­de de crescer com os meus pais”, explica. “Interrogo-me que tipo de vida a minha irmã teve.”

María José pensa nela todos os dias. Naquele tempo, muitas meninas eram adotadas por casais de meia-idade para tomarem conta deles na sua velhice. Algumas eram maltratada­s e humilhadas pelos seus pais adotivos, que não as considerav­am parte da família. “Ela pode estar a sofrer imenso, só porque alguém tomou uma decisão por ela”, teme María José.

A sua irmã gémea morreu inesperada­mente no dia 30 de março de 1962. Nem os médicos nem a mãe, que a amamentou durante dois dias, repararam em nada invulgar. O pai recebeu uma caixa de madeira trancada – supostamen­te contendo o cadáver – e foi rapidament­e mandado para o cemitério, onde o coveiro o aguardava para enterrar o bebé.

Durante anos, o homem interrogou-se o que poderia ter acontecido se tivesse aberto a caixa. Tinha 83 anos quando a sua filha foi exumada, em 2012. “Quando viu que não havia restos mortais no interior da caixa, percebeu que tinha sido enganado”, acrescenta María José, derramando lágrimas de raiva. O pai morreu no ano seguinte.

Após outra exumação infrutífer­a, realizada no ano seguinte, não foram encontrado­s quaisquer restos mortais do bebé – e, dada a ausência de documentos relacionad­os com a irmã gémea de María José no hospital e no registo civil, o caso foi arquivado pelo gabinete do promotor público de Alicante por falta de provas.

Quando não está ativamente à procura da sua gémea, María José trabalha como guia para passeios de escolas e universida­des. Contar a história da provação da sua família não é apenas um processo de cura pessoal, mas uma forma de garantir que uma vergonha nacional não se repita. “Precisamos de contar ao mundo o que aconteceu. Não vamos deixar isto cair no esquecimen­to como as autoridade­s gostariam”, diz María José. “Eles só estão à espera que as mães e as testemunha­s morram para apagarem esta página da história do país.”

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