GQ (Portugal)

FUSÃO NUCLEAR: A ENERGIA DAS ESTRELAS QUE VAI SALVAR O MUNDO

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É uma piada antiga e constante na comunidade científica, pelo menos desde a década de

50: estamos sempre a 30 anos de alcançar a fusão nuclear como fonte de energia. A realidade é que nunca estivemos tão perto de conseguir o que é considerad­o como Santo Graal da energia: uma fonte limpa e perpétua. A fusão nuclear é um processo distinto da fissão nuclear usada nos reatores das centrais nucleares. Na fissão, a energia é gerada a partir da divisão dos átomos, enquanto na fusão a energia resulta da união de dois átomos para formar um superior, um processo que liberta uma enorme quantidade de energia. E, ao contrário da fissão, é uma forma de energia limpa: não liberta dióxido de carbono nem gera lixo tóxico, já que o resultado da reação é o hélio, um elemento que não é radioativo. É, na realidade, a energia das estrelas, como o Sol. A cada segundo, há um número imenso de átomos de hidrogénio que colidem uns com os outros a temperatur­as e a pressão extremas no interior da nossa estrela, quebrando as suas ligações químicas e fazendo com que se fundam, formando um elemento mais pesado, o hélio.

Desde os anos 50 que os investigad­ores tentam replicar o processo na Terra para obter o que chamam “sun in a box”. Para isso, é necessário aquecer o hidrogénio a mais de

100 milhões de graus Celsius até que se forme uma nuvem de plasma e, a parte mais difícil, que é controlar o plasma e guardá-lo dentro de um espaço, através de um campo magnético, até que aconteça a fusão dos átomos e a consequent­e libertação de energia.

Conseguir que isto aconteça de forma estável e de forma controlada é o objetivo que tem escapado aos cientistas. Mas as últimas tentativas mostram que, afinal, o sonho é bem capaz de estar mais perto, graças aos avanços em áreas como os supercompu­tadores e a modelação de sistemas complexos. No ano passado, um reator chinês conseguiu aquecer plasma a 100 milhões de graus Celsius e, melhor ainda, conseguiu manter a temperatur­a durante quase 10 segundos. Dois anos antes, também na China, os cientistas conseguira­m manter estável a fusão do núcleo durante

102 segundos, um recorde até à data, a uma temperatur­a de 50 milhões de graus Celsius.

Mas a grande esperança reside no Iter, um projeto de 20 mil milhões de euros que reúne União Europeia, Estados Unidos, Rússia, China, Japão, Coreia do Sul, Índia e Suíça e que está a ser construído na Provença, em França. O objetivo é que o reator esteja construído e a trabalhar em 2025, produzindo o primeiro plasma no mesmo ano. Já não é uma questão de “se acontecer”, mas sim de “quando”. Contudo, até que exista uma central nuclear de fusão em pleno funcioname­nto podem ainda faltar algumas décadas. Talvez os tais 30 anos.

 ??  ?? Vista aérea da central nuclear Dresden, no Ilinois, Estados Unidos da América. A Dresden foi a primeira central nuclear norte-americana com financiame­nto privado e opera desde a década de 70. Nos EUA, apesar do intenso debate em torno do tema, a energia nuclear é defendida por pessoas de vários quadrantes académicos e políticos e continua a ter um peso substancia­l sobre o total da eletricida­de produzida por hora em todo o país.
Vista aérea da central nuclear Dresden, no Ilinois, Estados Unidos da América. A Dresden foi a primeira central nuclear norte-americana com financiame­nto privado e opera desde a década de 70. Nos EUA, apesar do intenso debate em torno do tema, a energia nuclear é defendida por pessoas de vários quadrantes académicos e políticos e continua a ter um peso substancia­l sobre o total da eletricida­de produzida por hora em todo o país.

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