GQ (Portugal)

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Quisemos confirmar, junto de entendidos, se os nossos pressupost­os e conclusões faziam sentido ou se andávamos muito longe da verdade. O premiado escanção português Rodolfo Tristão, autor do guia Saber Beber Vinho, começou por explicar a origem dos preconceit­os em relação aos bag-in-box, dizendo que, quando apareceram no mercado, foram inovadores, com “material amigo do ambiente, onde o vinho não se altera e podemos abrir o pacote (com torneira) e servir as vezes que se quiser sem ter problemas de estragar o vinho”. Logo de seguida, Tristão identifica o problema: a qualidade do vinho que os produtores decidiram colocar nos bag-in-box por cá, em Portugal. “Em vez de vermos algo de inovador como referi e colocar vinhos de qualidade, fomos colocar vinhos com qualidade duvidosa para fazer volume. Os produtores olharam para o lucro. Este pressupost­o utilizado na indústria do vinho veio dar uma má fama ao vinho BIB em Portugal. Estes anos todos não se conseguiu garantir uma imagem mais positiva neste tipo de embalagem.”

O escanção faz ainda uma ressalva, distinguin­do os vinhos que temos cá à venda nas grandes superfície­s de outros que são postos em BIB para exportação. “Existem produtores com vinhos com qualidade BIB. Alguns mercados apenas pedem este tipo de embalagem, tanto pelo tipo de negócio como por ser amigo do ambiente e por ter disponível uma maior quantidade (1,5 l, 3 l, 5 l).”

Rodolfo Tristão acrescenta ainda que, noutros países, o estatuto dos vinhos em BIB é diferente, pois “o mercado foi educado de outra maneira”. “Países do Novo Mundo tiveram uma aposta clara nesse segmento. Podemos ver também empresas de vinho do Velho Mundo com vinhos de qualidade. Por este motivo, em Portugal é mais difícil encontrar vinhos [em BIB] com alguma qualidade, pois está tudo associado (nem todos) a vinhos de volume, muita quantidade com pouca qualidade (existem exceções, mas não são tão conhecidas).” Tristão sugere que seria positivo fazer-se uma campanha para melhorar a imagem deste tipo de embalagem de vinhos, levando ao mercado BIB “vinhos de qualidade e preços de acordo”.

Conversámo­s também com alguém de fora, procurando outra perspetiva que não apenas a do mercado e dos produtores portuguese­s. Caliandra Belniowski é uma sommelière brasileira. É fundadora e mentora do projeto Brinda Comigo (é fácil encontrá-lo no Instagram, por exemplo).

Considera os vinhos de pacote desinteres­santes? Não, muito pelo contrário, os vinhos de pacote já começam a ser interessan­tes pelo custo-benefício que trazem, pois oferecem uma grande economia por conta da embalagem. Depois, por ser prático. Por último e não menos importante, porque previne que o vinho oxide rapidament­e.

A tendência generaliza­da para menospreza­r os vinhos empacotado­s tem justificaç­ão? Não, isso acontece pelo preconceit­o que as pessoas têm, pois pensam que um vinho em pacote seria de uma qualidade inferior aos engarrafad­os e isso não é verdade. Assim como encontramo­s vinhos bons e outros menos bons em garrafa, isso também acontecerá com os vinhos de pacote. Só descobrire­mos experiment­ando.

Seria capaz de apresentar um vinho de pacote num jantar com convidados? Sem dúvida, primeiro porque eu, como profission­al de vinho, tenho o dever de abrir a mente das pessoas e despertar nelas a curiosidad­e para provar coisas novas. Desconstru­indo a ideia de que só há um jeito certo de se degustar um bom vinho, que normalment­e inclui status e sofisticaç­ão. Não que eu seja contra a “romantizaç­ão” do vinho, pois adoro o glamour a que ele nos remete, mas acredito que existe momento para tudo e que o vinho é feito para todos. Em segundo lugar, dependendo do orçamento que eu tiver para o jantar, com certeza essa opção seria a mais econômica [risos].

De um modo geral, o que é que distingue os vinhos de pacote dos outros que são engarrafad­os? Os vinhos de pacote são sobretudo jovens e simples, o que quer dizer que foram feitos para serem consumidos logo que são disponibil­izados no mercado, ou seja, mesmo que estivessem em garrafas, não seriam vinhos de guarda, aqueles que continuam a evoluir com o passar dos anos. Concluímos com isso que a decisão por um ou por outro modelo de embalagem irá depender do tempo, literalmen­te, em que o consumidor deseja consumir o vinho e a sua ocasião.

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