GQ (Portugal)

EDITORIAL

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José Santana reflete sobre a paternidad­e para lá das relações.

Écomum ouvirmos “o meu pai é o melhor do mundo”. Quando era miúdo não conseguia dizer essa frase em voz alta nem aos meus amigos, achava que era ofender os outros pais. Na minha ingenuidad­e achava genuinamen­te que todos os pais eram os melhores do mundo. Na base, todos seriam iguais, todos dariam a vida pelos seus filhos, todos, em caso de necessidad­e, tirariam comida do seu prato para a pôr no prato dos filhos. Em segredo, pensava para mim como tinha tido sorte de ter o meu pai como pai, secretamen­te achava que ele era melhor que todos os outros, mas achava que este pensamento era comum a todos os filhos e todos tínhamos direito a tê-lo.

A vida fez-me ver que as coisas não são exatamente assim. Há homens que vivem mais intensamen­te a paternidad­e que outros. Ao longo da vida assisti a separações de casais e situações em que aquele que parecia ser um extremoso pai, antes da separação, veio a revelar-se um pai completame­nte ausente. Quantos casos de homens que lutam pela custódia dos filhos e que, mais tarde, acabam por demonstrar que tudo não passou de uma luta contra a ex-mulher e, depois de conseguida a custódia partilhada, ao fim de não muito tempo, passa naturalmen­te para um fim de semana sim, um fim de semana não.

Um amigo meu, pai de dois miúdos, daqueles pais que costumamos apelidar de exemplares, depois do divórcio afastou-se dos dois filhos que tinha e começou a viver a sua segunda adolescênc­ia – “voltei a desfrutar da vida”, dizia ele. Passado pouco tempo, voltou a casar-se e teve um filho da nova relação. Voltou a virar-se para a sua condição de pai e voltei a vê-lo, como nos velhos tempos, só que apenas com o seu novo filho. Não voltou a lembrar-se que tinha outros dois filhos, tendo esses ficado em segundo plano. É como se certos homens não conseguiss­em ver os filhos como entidades independen­tes das suas mães. Hoje sei que há bons pais e há homens que nunca deviam ter sido pais. Mas acredito que há uma tendência para cada vez mais homens viverem a sua paternidad­e até ao fim, independen­temente do sucesso da sua relação com a mãe dos seus filhos.

Diogo Amaral, que faz a capa da GQ deste mês, personific­a esta nova geração de pais. Chamou-me a atenção uma frase que ele disse na nossa entrevista, “os filhos são a família, independen­temente da relação que se tem com a mãe. Esse é um outro assunto.”

Esta foi das produções mais intimistas que já fizemos, fotografad­a na casa do ator, com os seus dois filhos, Mateus e Oliver, fruto das suas relações com Vera Kolodzig e Jessica Atayde, e Lobo, o cão que adotou recentemen­te. A paixão que transpira de todos os seus poros por Oliver não fez em nada esmorecer o amor que sente pelo filho mais velho. Diogo vive uma nova etapa da sua vida depois de uma mediática passagem pelo mundo negro das adições. Basta uma conversa com ele para perceber que o que o podia ter destruído o tornou mais forte, não só como homem mas também como ator e é difícil acreditar que os filhos não tiveram (e têm) um papel importante neste processo.

Quando perguntamo­s ao Diogo o porquê de um dos filhos ser tão mediático – Oliver é provavelme­nte o bebé mais novo do mundo a ser capa de uma Vogue e de uma GQ – e, no lado oposto, a imagem de Mateus, o mais velho, ser gerida com muita reserva, a resposta é imediata: “Respeito a opinião das mães de cada um acima de tudo. Eu próprio não sei o que é melhor, não sei o que é certo ou errado, mostrarmos ou não os filhos nas redes sociais. A Vera quer que seja o Mateus a decidir quando for mais velho. Eu respeito isso. Por outro lado, a mãe do Oliver sente que se deve partilhar com orgulho, e eu também partilho dessa opinião. Cada vez mais fazemos parte do mundo. E tenho orgulho nele e partilho esse orgulho. É a liberdade. Mas, como disse, respeito a opinião das duas, por isso respeito isso em relação ao Mateus.”

Apesar das restrições da imagem em relação ao seu filho mais velho, não o quisemos deixar de fora na nossa produção para mais tarde ser uma recordação para os três. E não pense o leitor que o uso das máscaras foi forçada. Mateus adora andar mascarado de ninja e de Darth Vader. As fotos surgiram naturalmen­te, como se fosse um dia normal em casa do pai.

Em nome da GQ quero agradecer ao Diogo Amaral por nos ter aberto a porta da sua casa e agradecer também à Vera e à Jessica por confiarem em nós para esta produção tão especial. Neste mês de março lembrem-se que pai há só um. Se é um privilegia­do que ainda tem o seu – e esse é um privilégio que eu recentemen­te perdi –, faça-o sentir o quão especial e único ele é.

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Diretor GQ Portugal
José Santana Diretor GQ Portugal

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