GQ (Portugal)

TEMA DE CAPA

- Por Diego Armés, com José Santana. Fotografia de Branislav Simoncik. Styling de Maria Falé.

Diogo Amaral, os filhos, o cão, a profissão e a vida, em geral.

E o amor, nunca esquecer o amor.

É com incontestá­vel franqueza que Diogo Amaral mantém esta longa conversa, que se vai alternando entre os desabafos pessoais, as confissões, os arrependim­entos, as ambições e a confiança no futuro. O ator tem consciênci­a de si e dos erros que cometeu. Essa consciênci­a permite-lhe assentar os pés na terra e prosseguir o seu caminho com firmeza e com segurança, com os dois filhos, Mateus e Oliver, pela mão e Lobo, o cão mais fotogénico do star system português, empoleirad­o nos seus ombros.

LOBO

Comecemos pelo cão e por como ele surgiu na vida de Diogo, que, conta, sempre teve cães. Diogo é embaixador da SOS Animal e ajuda a promover os cães que a associação recolhe e propõe para adoção – os resultados das suas intervençõ­es são notáveis, já agora, “os animais que eu apadrinhav­a e partilhava no Instagram eram sempre adotados”. Até que apareceu Lobo com aqueles olhos e as orelhas e a boca como se sorrisse e a SOS Animal chamou Diogo para promover a adoção. “É um bocado piroso de se dizer, mas sim... foi amor à primeira vista.” O amor até pode ter sido, mas a adoção não aconteceu logo, logo. “Tinha tido um cão que morreu pouco tempo antes, ainda não fez um ano ou fez um ano recentemen­te” – Diogo assume não ser bom com datas –, “eu estava naquela de querer adotar um cão, mas, ao mesmo tempo, ainda não estava pronto para voltar a ter um”. Siga o exemplo de Diogo Amaral: não adote um animal se não estiver preparado, certifique-se de que vai conseguir cuidar dele, não tome decisões precipitad­as e, acima de tudo, não abandone – é crime e é punido por lei.

“A Sandra Duarte Cardoso, que é a fundadora e diretora da SOS Animal em Portugal, disse-me ‘depois pensas nisso’ e tirou o cão da lista de adoção.” A decisão, diz Diogo, estava tomada, iria ficar com Lobo, mas o processo até ao passo final cumpriu-se sem pressas e incluiu, por exemplo, as visitas ao cão com Mateus, o filho mais velho do ator, para perceber a relação entre ambos e a reação da criança ao Lobo e vice-versa. Tudo correu bem e hoje o Lobo é parte da família.

Numa nota à parte, Diogo Amaral conseguiu angariar o valor máximo em donativos estipulado pela SOS Animal: €17.500. “É dos meus maiores feitos do ano do Instagram, juntamente com os cães que eu consegui que fossem adotados”, diz, com orgulho.

O AMOR E AS OUTRAS COISAS

“As mulheres são mais acintosas e mandam vídeos e coisas [risos].” Diogo refere-se às mensagens obscenas que recebe nas redes, principalm­ente no Instagram. “Eu nem consigo achar piada, nem fazer aquele número de mostrar aos amigos porque fico constrangi­do. Acho escabroso.” Tradução: há mulheres que fazem vídeos caseiros, digamos, íntimos e que os enviam para o ator. Hoje em dia tudo é mais fácil com as redes sociais e com os dispositiv­os sofisticad­os que possuímos. A pornografi­a está à distância de um clique, por exemplo, e isto, quando se tem filhos, é uma preocupaçã­o. “Sou muito antigo nisso. É verdade, sinto-me muito antigo. Mas vejo pornografi­a [risos]. Só comecei a ver pornografi­a muito tarde, era muito púdico.” Os tempos mudaram e os meios também. “Dantes passava, era uma coisa de revistas de primos para primos. Mas o pior de tudo é que hoje em dia podes fazer e mandar pornografi­a.” Diogo diz-se púdico e tenta encontrar a explicação para as suas reservas lá atrás, na infância. “Os meus pais separaram-se tinha eu 7 anos, fiquei a viver com a minha mãe a minha irmã. Portanto, vivia com duas mulheres.” Esta situação fê-lo olhar para as relações com uma sensibilid­ade que fica nos antípodas da sexualidad­e em que a mulher é tratada como objeto. “Entretanto já fiz muita asneira, mas volto sempre ao mesmo sítio. Acho que o outro lado é vazio, é ires ao talho, e a outra cena [o amor] não, preenche-te.” Já não estamos a falar de pornografi­a, pois não? “Costumo dizer que uma cena é apaixonare­s-te, outra cena é o conceito do falling in love, que é caíres no amor. São coisas completame­nte diferentes, eu apaixono-me em 10 segundos na noite. Apaixonas-te, é uma coisa vvvvuuu... e depois acabas por te desapaixon­ar. A cena falling in love é muito mais rica do que uma paixão.” Ok, estamos mesmo a falar de amor. “Fall in love é raríssimo, apaixonar-me, acontece-me milhões de vezes. Falling in love é uma cena que te pode acontecer poucas vezes na vida. E acho que pode não te acontecer na vida, podes não ter esse privilégio.”

ADIÇÃO

Diogo viveu, recentemen­te, momentos complicado­s na sua vida. O uso de drogas tomou conta da sua rotina e ameaçou-lhe o destino, tirou-lhe algumas coisas e podia ter deitado tudo a perder. O mais surpreende­nte é que essa “queda do cavalo”, como o ator várias vezes se lhe refere, coincidiu com um período que tinha tudo para ser feliz e em que vivia a sua paixão com Jessica Athayde. “Isso é horrível, não é? Isso que estás a dizer é muito estranho. Nunca ninguém me pôs as coisas assim. Foi uma das piores fases da minha vida e deu-se quando a nossa história teve, se calhar, um dos pontos altos. Foi nessa fase que a minha adição se manifestou. Não tem nada a ver com ela, tem a ver com outros buracos negros da minha vida que eu ainda tinha por resolver e que só ali é que se manifestar­am.”

Falemos da adição. “Eu usava de uma forma recreativa, como se costuma dizer, e controlada. Eu era superfunci­onal e passei a ser um mentiroso, manipulado­r e completame­nte impotente perante aquilo, completame­nte descontrol­ado na altura em que estava com a Jessica, sim. E se calhar vou guardar esse dano para o resto da vida.” “Foi um período da minha vida em que estava profundame­nte triste e as drogas eram o meu escape, era para sair da realidade. E perdi o controlo da cena.” A cena é a vida. Perder o controlo é a necessidad­e de usar drogas, é ir trabalhar de ressaca. É desiludir as pessoas. “Nunca usava a trabalhar, tinha algumas regras, mas chegava de ressaca e não sabia os textos, depois era um círculo vicioso e constante. Portei-me muito mal. As equipas com quem trabalhava ficaram desiludida­s comigo. Tipo ‘pá o que é que se passa com o Diogo?’ Se bem que sabiam perfeitame­nte o que se passava. Se houve uma coisa bonita que acontecia era que as pessoas ficavam com desilusão e com pena – com pena de perder este gajo.” Houve quem tenha tentado tirá-lo desse buraco em que se enfiava, mas nestes assuntos a ajuda externa é sempre escassa quando o protagonis­ta não é o primeiro a dar um passo em frente no caminho da recuperaçã­o.

As consequênc­ias dessa espiral descendent­e foram abrangente­s, não se limitaram ao círculo profission­al – apesar de Diogo saber que foi posto “de castigo”, “a produtora da minha novela obviamente tinha muitas reticência­s quanto a voltar a trabalhar comigo, então decidiu ‘o melhor é darmos-lhe uma coisa pequenina, não vá o gajo cair do cavalo outra vez’, mas deram-me outra oportunida­de, estou a fazer uma novela agora, as coisas estão a correr superbem”. Não obstante a queda, o ator afirma que não trocava nada do que lhe aconteceu por uma experiênci­a alternativ­a. “Sou uma pessoa muito melhor. E ainda bem que caí do cavalo. É verdade, eu não troco nada do que me aconteceu na vida. Porque não é aquela história do ‘tens de te levantar’; não, meu, tu tens é de saber cair. E depois cair com mais estilo.”

Para encontrar o caminho da recuperaçã­o, Diogo Amaral teve de se afastar de algumas pessoas, de algumas rotinas. Não deita culpas a ninguém, a responsabi­lidade é toda dele e ele sabe disso. Afasta-se porque sabe que certas rotinas podem aproximá-lo do perigo. O melhor é evitar, reduzir o risco. Considera injusta a ideia generalist­a e generaliza­da de que o meio artístico é pródigo no uso de drogas, “é um meio com muitas drogas, mas quando eu saía à noite e ia a discotecas e usava em vários sítios, não eram todos atores. Portanto, quer dizer... É injusto para a classe”.

Na hora de recuperar, contou com a família, com amigos e com Jessica. Primeiro, pediu ajuda a um amigo. “Um dia liguei para um gajo e disse-lhe exatamente como é que ele tinha de me ajudar, ‘por favor mete-me numa clínica e obriga-me a fazer esta merda que eu daqui a uma semana vou dizer que não quero ir’.” O amigo ligou para Jessica e explicou-lhe tudo. Jessica fez com que tudo funcionass­e. “A Jessica foi incrível. Tratou de tudo, escolheu a clínica, houve um dia em que me pôs a fazer uma entrevista com o gajo, foi-me levar ao avião, foi-me buscar ao avião, descobriu a merda do número de telefone da cabine telefónica que havia lá na clínica. Pá, um dia estás na sala, no meio daquela merda, toca o telefone e eu começo a ouvir um gajo a gritar ‘Jessica! Jessica! Alguém conhece a Jessica?’ e eu ‘não estou a acreditar nesta merda’. Isto é uma grande cena. Ela aí teve um papel muito importante.”

TALK SHOW

José Santana, diretor da GQ, mete-se com Diogo Amaral, diz-lhe que tem muito jeito para entrevista­r pessoas.

O ator responde. “Eu gostava de um dia apresentar um talk show. Já fiz umas coisinhas, uma vez que a TVI me convidou, era uma cena numa festa de Natal. Era mais stand-up comedy. Mas gostava, uma das coisas que estavam no meu acordo com a SIC era isso, apresentar umas coisas – se eu não tivesse lixado tudo.” “Mas a sério que acho que tinhas jeito”, confirma Santana. “Tu deixas as pessoas à vontade.” Diogo: camisola e calças em algodão, tudo Emporio Armani. Camisola em algodão e lã,

Massimo Dutti. Meias em algodão, da produção. Ténis em pele, Diadora.

 ??  ?? Diogo: casaco em denim, camisa em algodão, ambos Prada. Oliver: babygrow em algodão, da produção. Mateus: T-shirt e calças em algodão, tudo H&M.
Diogo: casaco em denim, camisa em algodão, ambos Prada. Oliver: babygrow em algodão, da produção. Mateus: T-shirt e calças em algodão, tudo H&M.
 ??  ?? Camisola em caxemira, calças em pele,
sandálias em pele, tudo Hermès.
Camisola em caxemira, calças em pele, sandálias em pele, tudo Hermès.
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