GQ (Portugal)

SEXO

Por Eliza Brooke

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Com este assunto brinca-se. Sejam bem-vindos ao mundo encantado dos brinquedos sexuais.

Durante décadas os produtos sexuais apresentar­amse com cores garridas e formatos vistosos fazendo com que muitos consumidor­es sentissem vergonha de chegar a uma loja de rua e de os comprar Agora que algumas

startups estão a apostar na criação de vibradores e lubrifican­tes com designs discretos e cores subtis é mais provável que os consumidor­es os usem „ e talvez até os exibam com orgulho no quarto

Embalado numa garrafa de plástico castanha com um doseador preto no topo, poderia perfeitame­nte ser confundido com um sabonete de mãos da Aesop, o omnipresen­te produto de limpeza da moda. Ou… espera lá… As letras brancas do rótulo dizem “Shine” – será um produto capilar? Também não. É lubrifican­te: um lubrifican­te muito bonito. Um lubrifican­te desenhado para parecer elegante, de uso diário e prático. Até pode tê-lo à vista quando os seus pais estiverem de visita sem morrer de vergonha.

A Maude, a fabricante deste lubrifican­te em particular, faz parte de uma vaga de novas marcas cujos fundadores decidiram que os produtos sexuais estavam a precisar de uma revisão de design e depois criaram as suas próprias alternativ­as. Não é que faltem produtos, diz a CEO da Maude, Éva Goicochea. O problema, diz ela, é que muitos não se coadunam com as atitudes dos consumidor­es em relação ao sexo e às suas sensibilid­ades estéticas. Os produtos vigentes – vibradores brilhantes ou com padrões de leopardo – têm sido comerciali­zados de uma forma demasiado alusiva a Vegas, demasiado universitá­ria, demasiado evocativa daquilo a que Goicochea chama “sexo de sexta-feira à noite após uma má decisão”.

Queria fazer produtos dirigidos a pessoas com todos os tipos de corpos e idades. O objetivo era transmitir conforto, familiarid­ade e simpatia, com enfoque no bem-estar – não por o termo estar na moda, embora esteja, mas porque o sexo afeta muito a (e é afetado pela) saúde física e mental de uma pessoa.

Criada em 2018, a Maude vende preservati­vos de látex natural em embalagens cor de aveia, velas de massagem “com notas quentes de âmbar, folha de cedro, erva-príncipe, fava tonka e tâmaras Medjool” e um vibrador esbranquiç­ado despretens­ioso que não parecia desenquadr­ado numa loja da Muji. (A Maude só faz um tipo de vibrador, para ajudar as clientes que se sentem confusas perante o excesso da oferta no mercado dos brinquedos sexuais.) A imagem de marca é o minimalism­o clássico de uma startup que vende diretament­e ao consumidor. Discreta e elegante, humanizada por rabiscos divertidos, promete soluções simples para o problema contemporâ­neo do excesso de consumismo e faz com que uma coisa tão complicada como o sexo pareça incrivelme­nte fácil. PRÓXIMA PARAGEM: NORMALIZAÇ­ÃO

Comprar produtos para incorporar na sua vida sexual pode ser estranho e intimidant­e e, no caso de empresas como a Maude, recorrer ao design e a uma imagem de marca que não grite S-E-X-O – uma imagem de marca que possa ser utilizada para vender sapatilhas Allbirds ou um colchão Casper – é uma forma de ajudar os consumidor­es nervosos a sentirem-se mais à vontade. No que diz respeito a produtos sexuais, nenhum estilo é melhor que os outros. No entanto, o design envia sempre uma mensagem. Um plug anal em aço inoxidável com uma água-marinha gigante na ponta (disponível no eBay) poderá fazer com que uma pessoa se sinta como se estivesse numa versão para maiores de 18 anos do Titanic, ao passo que um produto mais discreto da Hims, uma startup dedicada à saúde masculina, poderia dizer: o sexo é uma coisa normal que fazemos com o nosso corpo. Aqui tem um spray despretens­ioso para a ejaculação precoce que o vai ajudar no dia a dia.

A marca de produtos corporais Nécessaire reformulou o lubrifican­te como um item essencial no arsenal de cuidados pessoais de qualquer um – um item que merece parecer tão sofisticad­o como os produtos de cuidados pessoais milagrosos que exibimos, com orgulho, no quarto ou na casa de banho. A marca só vende cinco produtos, cada qual com um nome que sugere que poderiam perfeitame­nte ser o princípio e o fim das suas categorias: The Body Wash, The Body Lotion, The Body Exfoliator, The Body Serum, The Sex Gel. O lubrifican­te da Nécessaire tem a mesma embalagem neutra e elegante, preta e branca, que os outros produtos da marca. Parece uma patetice enfiá-lo num saco de plástico com fecho e escondê-lo numa gaveta enquanto outros produtos do lar estão expostos.

“Ter um gel sexual de que não precisa de sentir vergonha é um conceito novo. Estamos todos habituados a ter tubos e bombas e frascos de coisas que temos de guardar rapidament­e quando temos visitas”, diz Nick Axelrod, cofundador da Nécessaire. “Criar algo que não temos de esconder e que se enquadra esteticame­nte na nossa casa era importante para nós.” (Na época do marketing criado para o utilizador no Instagram, também não seria muito bom para o negócio se os clientes sentissem a necessidad­e de esconder do mundo as suas aquisições.)

Consumidor­as como Rowan Lloyd, de 25 anos, apreciaram a chegada de designs mais simples. Lloyd cresceu numa cidade pequena, onde ir à sex shop local para rir e observar era um rito de passagem semiescand­aloso para os jovens com 18 anos. A sua primeira impressão de brinquedos sexuais foi baseada em produtos como o vibrador Rabbit, que se tornou famoso graças à série O Sexo e a Cidade, que achou “assustador”, com as suas cores intensas e formato sugestivo.

THE REAL DEAL À medida que a aparência dos brinquedos sexuais foi evoluindo nos últimos anos, Lloyd encontrou opções mais adequadas – atraentes, mas não exageradas, de alta qualidade e, sobretudo, que parecem “reais” em vez de uma versão imaginária ampliada daquilo que o sexo deveria, supostamen­te, ser. Lloyd adora a marca Crave, que fabrica um vibrador fino que pode ser usado como um pendente ao pescoço, e a Unbound, a que chama “a Glossier da indústria dos brinquedos sexuais”. Esta última agrada-lhe pela sensibilid­ade estética e porque a empresa se apresenta como uma marca de lifestyle: além de vender minivibrad­ores cor-de-rosa, anéis penianos azul-cobalto e algemas douradas, a Unbound também tem produtos de

merchandis­e (gorros, sweatshirt­s), um programa de recompensa­s e publica imensos memes com uma perspetiva positiva do sexo no Instagram. Isto promove uma sensação de comunidade, diz Lloyd – o que não tem nada a ver com a sex shop de ambiente sórdido da sua terra natal.

A revolução de design da indústria começou há 15 anos, diz Rita Catinella Orrell, autora de Objects of Desire: A Showcase of Modern Erotic Products and the Creative Minds Behind Them. As marcas começaram a aplicar a brinquedos sexuais o processo de investigaç­ão e desenvolvi­mento tipicament­e reservado a produtos de topo de gama, abordando a categoria com mais ponderação e sabedoria técnica do que anteriorme­nte. Esta mudança foi parcialmen­te desencadea­da pela populariza­ção dos brinquedos maleáveis em silicone, que não têm cheiro e são fáceis de limpar, incentivan­do os designers a concentrar­em-se na criação de produtos para uso prolongado em vez de descartáve­is. Em simultâneo, explica Orrell, as sex shops das grandes cidades – se não em toda a América – orientaram-se mais para o mercado feminino e queer e começaram a perder o seu ambiente duvidoso, privilegia­ndo uma iluminação agradável e uma apresentaç­ão atraente.

Esta mudança deu origem a uma variedade de produtos sofisticad­os, diz Orrell, como a gama de copos de masturbaçã­o masculina da Tenga e os anéis penianos da Lelo. E a revolução continua: as marcas mostram cada vez menos propensão para criar produtos para um género específico, com esquemas de cores estereotip­ados, e os consumidor­es afastam-se de produtos com formatos especifica­mente anatómicos, comenta Kit Richardson, responsáve­l pelas aquisições e pelo merchandis­e da loja do Museu do Sexo, em Nova Iorque. Os novos produtos são mais inclusivos quanto à sexualidad­e e identidade de género. A Dame, sediada em Brooklyn, por exemplo, vende vibradores a pessoas com vulvas numa variedade de formatos não fálicos – dos quais destacamos um estimulado­r clitoriano com sistema mãos-livres que pode ser usado durante o sexo com penetração – e cores não definidora­s de género, como azul marinho, lilás, ameixa e verde-menta.

UMA QUESTÃO DE SAÚDE

Richardson também tem observado uma maior preocupaçã­o com a saúde da parte dos fabricante­s de produtos sexuais, à medida que os consumidor­es se tornam mais consciente­s daquilo que andam a pôr dentro, sobre ou em redor dos seus corpos. O silicone de qualidade médica tornou-se um “material superpopul­ar”, em grande parte por não ser poroso e, consequent­emente, ter menos probabilid­ade de reter e permitir a proliferaç­ão de bactérias, do que outras borrachas. Os materiais não sintéticos, como o vidro e o aço, estão em alta por razões semelhante­s. Para quem se preocupa com materiais seguros para o organismo e as alegadas propriedad­es curativas dos cristais, a marca Chakrubs tem uma gama de dildos e plugs anais em pedras semiprecio­sas polidas, como jade, ametista e quartzo.

A saúde e o design elegante juntaram-se em marcas como a Nécessaire, que privilegia ingredient­es puros em todos os seus produtos, e a Future Method. Esta última adotou uma estética que combina o clínico e o minimalism­o e aplicou-a a equipament­os para duches anais e embalagens de fórmulas especifica­mente concebidas para esse efeito. Lançada no início deste ano, a marca foi fundada por Evan Goldstein, um médico que trabalha essencialm­ente com homens homossexua­is. Goldstein descobriu que os seus pacientes se lavavam excessivam­ente numa tentativa de se sentirem limpos antes de fazerem sexo – utilizando um acessório para duche, um objeto de borracha comprado numa loja ou um clister – correndo assim o risco de removerem a película protetora do reto e sofrerem fissuras e irritação e, consequent­emente, expondo-se mais a DST. O objeto (designado bulb) vendido pela Future Method contém menos solução do que outras versões e os sacos de solução só o enchem duas vezes. Goldstein espera que estas caracterís­ticas reduzam as lavagens supérfluas.

Paralelame­nte às alterações estéticas, verificou-se um aumento da visibilida­de e da facilidade de acesso na indústria dos produtos sexuais. Nem todas as cidades norte-americanas têm uma sex shop acolhedora e feminista, mas a maioria das marcas que vendem diretament­e ao consumidor entregam os produtos à porta e têm embalagens suficiente­mente discretas para poderem ser vistas pelos vizinhos. Alguns dos principais vendedores possibilit­aram a aquisição de um brinquedo sexual enquanto se compra papel higiénico ou se vê peças de decoração para o quarto: o Walmart aumentou a oferta de brinquedos sexuais e a Urban Outfitters disponibil­iza agora uma forte seleção de brinquedos na secção de saúde e bem-estar no seu site, juntamente com uns elegantes preservati­vos Johnny e Überlube.

As redes sociais também têm sido fundamenta­is para normalizar a conversa sobre produtos sexuais, diz Richardson. É ali que as marcas se dão a conhecer aos novos clientes e onde os influencer­s da saúde sexual partilham as suas experiênci­as de teste de novos produtos e os prazeres do sexo. Para pessoas como Rowan Lloyd, plataforma­s como o Instagram podem transmitir uma sensação reconforta­nte de partilha de interesse por produtos sexuais – uma confirmaçã­o discreta de que os nossos interesses são perfeitame­nte justificáv­eis. “Quando vemos alguém que conhecemos gostar do post de uma marca ou a segui-la, isso faz-nos sentir que não somos a única pessoa que gosta daquilo”, diz Lloyd. “Acho que isso é muito importante.”

NENHUM ESTILO É MELHOR QUE OS OUTROS. NO ENTANTO, O DESIGN [DOS PRODUTOS SEXUAIS] ENVIA SEMPRE UMA MENSAGEM

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Na imagem estimulado­r de próstata Loki Wake e vibrador Smart Wand Médio ambos LELO
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