A RELAÇÃO COM MÁRIO CESARINY
Carlos Cabral Nunes explica a origem da sua proximidade com Cruzeiro Seixas, que passa por Mário Cesariny. A revelação não é surpreendente, Cruzeiro e Cesariny, ainda que de costas voltadas, dificilmente serão indissociáveis. “Conheci o Artur Bual que depois me apresentou ao Cesariny que, finalmente, me deu a conhecer o Cruzeiro Seixas.”
“O Mário [Cesariny] foi um relacionamento de adolescentes, tínhamos para aí uns 17 anos quando nos conhecemos na António Arroio. Ele era uma pessoa extraordinária, realmente genial, e foi como um segundo pai porque, sendo ele mais novo do que eu, eu aprendi muitíssimo com ele. Depois, pela vida fora, os nossos dois conhecimentos da vida foram-se afastando. E cada um seguiu um caminho diferente. Mas foi extraordinário o que o Mário deixou em mim. Deixou muito...” [ Cruzeiro Seixas, GQ Portugal #162]
Por falar em costas voltadas, Cruzeiro ficou ressentido com Cesariny há já muitos, muitos anos e Cabral Nunes explica porquê. Quando Cesariny foi para Paris, na década de 60, Cruzeiro Seixas foi visitá-lo. Importa explicar, para o caso improvável de o leitor não saber a história, que Cruzeiro e Cesariny foram apaixonados, amantes, companheiros da pintura, da poesia, do amor e da vida.
Portanto, Cruzeiro foi visitar Cesariny a Paris. Foram ao cinema, certa vez. Enquanto o primeiro era um homem que procurava romances estáveis e o amor, Cesariny era um libertário que se orgulhava, por exemplo, de “aviar vários marinheiros numa noite no Cais do Sodré”, segundo Cabral Nunes. Em Paris, o seu comportamento mantinha-se. Durante essa ida ao cinema, Cesariny a dada altura saiu do lugar. No escuro, Cruzeiro não percebeu o que tinha acontecido. Foi então que houve uma rusga policial e, quando as luzes se acenderam, lá estava Cesariny no meio de outros homens. O que faziam poderia ser descrito como “práticas indecentes”, mas deixemos as terminologias moralistas de lado. O que importa é que foi detido e ficou preso durante um mês, tendo Cruzeiro Seixas ficado sozinho em Paris – e ele não dominava o francês, nem outras línguas estrangeiras, no geral. “Ficou muito magoado”, enfatiza Cabral Nunes. O ressentimento, se não nasceu desse episódio, certamente também não melhorou com ele.
“O Cesariny foi uma coisa muito de garotos, uma paixão de adolescentes. É aquilo que todos os jovens têm uns com os outros, sejam meninas, sejam rapazes. Um amigo ideal... Realmente com o Cesariny foi muito isso durante muito tempo. Mas a verdadeira vida de amor foi com outras pessoas por aí. [...] O Cesariny tinha os seus processos e eu tinha os meus, completamente diferentes. Éramos muito diferentes nisso. De tal maneira que, a dada altura, depois de uma proximidade apaixonante durante anos, separámo-nos. Cada um foi para seu lado. Eu vivi no Algarve, pedi uma transferência do emprego que tinha nessa altura para o Algarve. Essa foi a grande separação.” [ Cruzeiro Seixas, GQ Portugal #162]