Novo filme inspirado nos Beatles
“Yesterday”, de Danny Boyle, mostra uma vez mais a importância histórica dos quatro de Liverpool, que, enquanto estiveram juntos, perceberam bem a importância do cinema como meio de expressão artística e forma de divulgação do trabalho musical. Fazemos aqui uma viagem – quiçá mágica e mística – pelos cinco filmes em que estiveram diretamente envolvidos.
Há um filme a estrear em todo o país com o título “Yesterday”. Sim, tem a ver com uma das canções mais conhecidas da música pop de todos os tempos, escrita para o álbum “Help”, dos Beatles, editado em agosto de 1965, vai para 54 anos. Trata-se da última realização de Danny Boyle, para muitos o autor de “Quem Quer Ser Bilionário”, vencedor de oito Óscares em 2008, incluindo o de Melhor Filme, enquanto para outros terá o seu nome para sempre associado ao icónico “Trainspotting”, de 1996. Se dissermos que o argumento é de Richard Curtis, o autor por trás de filmes tão amados como “Notting Hill” ou “O Amor Acontece” – além da sua contribuição para tantos sketches da série “Mr. Bean” –, então não é difícil concluir que “Yesterday” é um filme de visualização obrigatória. Tal deve-se, no entanto, à forma tremendamente original como encara o fabuloso legado musical e cultural dos Beatles. É que a premissa ficcional é esta: ontem (yesterday), toda a gente conhecia a banda; hoje ninguém sabe quem foram. No filme, o protagonista recupera de um acidente e começa a tocar canções dos Beatles. Como são todas tão boas mas ninguém as conhece, transforma-se no maior fenómeno
musical dos seus dias.
Foi o que aconteceu com John, Paul, George e Ringo. Ouvindo hoje as canções, observando o que ficou das prestações ao vivo e verificando o impacto mediático e sociológico que tiveram em praticamente todo o mundo, não ficam grandes margens de dúvida para quem os considerar a manifestação artística que hoje melhor define o que se viveu no mundo nos anos de 1960. Terá sido então por mero acaso, além das divergências criativas e das influências externas (como a de Yoko Ono) que os Beatles se separaram precisamente em 1970? O legado é impressionante: mais de 200 canções em dez anos de existência, considerando as primeiras atuações ao vivo, e álbuns editados apenas entre 1962 e 1970, tornam a banda na que maior produtividade alcançou em tão curto espaço de tempo. Se substituirmos a quantidade de trabalho pelo seu impacto, então os Beatles continuarão a ser a banda de música pop mais importante da história. Aliás, o tema “Yesterday” é significativo, com mais de dois milhares de covers conhecidas… “Yesterday”, o filme, é ainda um exemplo das inúmeras variações cinematográficas em torno dos Beatles. Mas os próprios membros da banda tiveram consciência da importância da imagem na divulgação do seu trabalho. Quan
do ainda não existia o conceito de videoclip, os cinco filmes a que os Beatles estiveram diretamente associados (e a que corresponde sempre o título de um álbum) são como vídeos musicais avant la lettre. E, ainda, uma expressão audiovisual do humor dos quatro membros da banda, bem como da liberdade criativa que então havia no cinema.
O primeiro filme dos Beatles estreou em 1964. O título original, “A Hard Day’s Night”, foi traduzido para português, à época, por “Os Quatro Cabeleiras do Após-Calipso”. Um trocadilho não muito eficaz, que mostra como, no Portugal cinzento dos anos 60, as cabeleiras dos Beatles era o que de melhor se poderia salientar. O filme segue um dia na vida dos quatro já muito populares músicos, culminando com a gravação de um programa de televisão, fazendo de John, Paul, George e Ringo uma espécie de Monty Python alternativos, transformados pelo exuberante realizador Richard Lester em mestres do burlesco.
Um ano e dois álbuns depois, “Help!” acentuava o lado ficcional, com uma trama de espionagem, vertida de forma agora colorida e mais uma vez surreal por Lester, transformando os músicos em atores, além da sua função primordial de compositores e intérpretes. Curiosa é a afirmação do cineasta: “Era o caminho a seguir, porque não podíamos fazer um documentário sobre a vida privada deles: seria logo considerado para adultos”.
O sucesso destes filmes fez a BBC encomendar ao grupo um telefilme, concebido e realizado pelos próprios Beatles, que levaria à gravação de um novo álbum. Esta “Magical Mystery Tour” muito deve ao espírito dos filmes de Lester e mostra como os membros da banda olhavam com ironia para o seu percurso. O mais mítico dos filmes dos Beatles, que também deu origem a um álbum do mesmo nome, “Yellow Submarine”, dá-nos uma versão literalmente animada dos Beatles, que já tinham então a sua própria série de cartoons, emitidos entre 1965 e 1969, mas sem grande participação da banda. O filme, dirigido por um mestre britânico da animação, George Duning, é hoje um clássico do género, feito numa altura em que as longas-metragens de animação eram quase exclusivas da Disney.
A última aventura cinematográfica dos Beatles, “Let It Be” (1970), acompanha a criação, gravação e lançamento do que seria o último álbum dos Beatles. Realizado por Michael Lindsay-Hogg, venceria um Óscar para Melhor Banda Sonora, mas os Beatles já não foram receber a estatueta. Tinha acabado a história em comum, ficava o mito.