JN História

PORTO – A ENTRADA PARA O MUNDO

- NEIL LOCHERY Casa das Letras | 408 páginas | 17,90 €

Este volume, o primeiro de três com que Vital Moreira e José Domingues assinalam o segundo centenário da Revolução Liberal de 1820, nasceu nas páginas da JN História. A partir de dezembro de 2017, estes dois professore­s de Direito com clara veia de historiado­res publicaram, nas nossas páginas, uma série de 14 artigos que, aqui transforma­dos em capítulos, traçam com detalhe (e dados até agora por estudar), aquilo a que se poderá chamar a primeira etapa do constituci­onalismo português, cumprida da revolução de 24 de agosto, na cidade do Porto, até à aprovação da Constituiç­ão, em 23 de setembro de 1822. O vintismo, isto é, esta primeira fase do liberalism­o português, constitui, sem sombra de dúvida, a base do sistema político que temos e a entrada de Portugal na contempora­neidade (não obstante interrupçõ­es desse caminho de liberdade e democracia, seja o interregno absolutist­a, sejam o Estado Novo e a Ditadura Militar/Nacional que o precedeu). Daí que os acontecime­ntos de há 200 anos mereçam do país o reconhecim­ento e a lembrança que não lhes são sonegados nas páginas da nossa revista.

Se olharmos o subtítulo deste estudo de caso feito por Edgar Silva, vendo que se reporta ao período entre 1969 e 1974, logo pensaremos, e bem, que, apesar do nome da entidade em questão o sugerir (Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos), não se trata de um organismo oficial. Mas também estaremos errados se supusermos tratar-se de uma organizaçã­o clandestin­a. Não era. Aproveitan­do uma brecha no Código Civil, opositores do regime (de várias famílias político-ideológica­s) fundaram esta organizaçã­o que, sem ter ação política direta contra o governo, tinha-a na sua própria essência, pois, como nota no prefácio Frei Bento Domingues, ele mesmo membro da comissão, “era a própria existência de presos políticos que constituía um atentado contra os direitos humanos”. Edgar Silva, que se encontra a trabalhar num doutoramen­to consagrado ao tema “católicos na revolução”, pega aqui em documentaç­ão já conhecida e publicada, propondo o enquadrame­nto da comissão como movimento social e promovendo o reconhecim­ento do seu papel na construção ou preparação do Portugal democrátic­o.

O que interessa este título aos leitores portuguese­s? Sobretudo, perceber como somos vistos lá fora. No caso, trata-se de um volume dedicado à cidade do Porto, mas a premissa é comum a outros trabalhos do autor, cuja paixão pelo país é evidente, dedicados ao Portugal saído do 25 de Abril, a Lisboa como era vista pelos estrangeir­os até ao 25 de Abril ou, ainda, ao ambiente lisboeta durante a Segunda Guerra Mundial. No caso do volume sobre o Porto, de que aqui damos notícia, há algo que uma simples consulta da bibliograf­ia demonstra, em particular no que concerne à historiogr­afia sobre a cidade: o autor está longe de a dominar ou de acompanhar o tanto conhecimen­to que tem sido produzido sobre o passado do velho burgo, selecionan­do leituras que, por vezes, estão longe de ser as mais recomendáv­eis (o mesmo se aplicando à contextual­ização nacional que percorre todo o texto). Mas, como ficou dito atrás, não é isso que interessa. O importante é perceber como nos veem e como nos mostram lá fora. E o resultado é, em simultâneo, lisongeiro, estimulant­e e desafiador.

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