Ensino Básico
Até aos anos 1960, Portugal possuía um ensino primário de apenas quatro anos, com escolas muito rudimentares e um currículo focado na imposição de valores conservadores e nacionalistas. As taxas de reprovação e abandono eram massivas, sendo esta a única experiência educativa acessível à maior parte da população. Aqueles que prosseguiam eram então separados, aos dez anos, entre escolas técnicas que prepararam para o desempenho de profissões intermédias e uma formação liceal orientada para o ensino universitário.
É certo que, no ocaso da ditadura, se havia ensaiado uma transformação, com a introdução do ensino preparatório, mas que ficou apenas em dois anos adicionais e o parco investimento não respondeu à procura, em profundo contraste com o resto da Europa em que a massificação do ensino secundário já era uma realidade.
Este quadro alterou-se radicalmente com o 25 de Abril. Por um lado, os currículos foram revistos para refletir os valores democráticos, incluindo uma unificação dos primeiros três anos do ensino secundário (7º ao 9º ano). Este modelo acabaria por ser aprofundado com a Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada por uma ampla maioria em 1986, prevendo um ensino básico universal e gratuito de 9 anos, à semelhança dos sistemas nórdicos. Por outro lado, houve um investimento forte na construção de escolas preparatórias e liceus para todos, assim como na formação e colocação de professores.
É CERTO QUE ENTRE A LEGISLAÇÃO e a realidade a distância era grande, permanecendo as taxas de retenção e abandono massivas, cumulativas e socialmente seletivas, ao longo de toda a escolaridade, até ao final do século. Contudo, as bases foram lançadas para uma alteração profunda destes indicadores, sobretudo durante as primeiras duas décadas do século XXI, com uma mobilização dos fundos europeus na construção e reabilitação de escolas, um novo currículo do ensino básico, bem como em programas de desenvolvimento educativo e combate ao insucesso escolar.
Diversos estudos nacionais e
Devemos continuar a aprofundar este caminho para que o ensino básico seja, realmente, o esteio da formação de cidadãos para uma sociedade democrática e sustentável
internacionais têm mostrado que este processo representou um enorme salto (sem comparação noutro país europeu), não apenas nas oportunidades educativas e nas qualificações das gerações mais jovens, mas também nas aprendizagens efetivas, em áreas centrais como a leitura, a matemática e as ciências. Outras áreas como as artes, o desporto e as ciências sociais, mantendo um lugar periférico, não deixaram de constituir espaços importantes para o desenvolvimento de tantas crianças e jovens.
Cinquenta anos volvidos, reconhecendo o valioso trabalho de tantos quantos contribuíram para esta verdadeira revolução educativa, devemos continuar a aprofundar este caminho para que o ensino básico seja, realmente, o esteio da formação de cidadãos para uma sociedade democrática e sustentável, num mundo marcado pelo aumento das desigualdades, a digitalização e a emergência climática.
* Pedro Abrantes é Professor Auxiliar na Universidade Aberta