Educação para a cidadania
As ameaças à sustentabilidade do planeta e a onda mundial de ataque às democracias já chegaram a Portugal e não podemos adiar o seu atendimento
À escola são atribuídas várias funções. Uma das que adquiriu maior importância depois do 25 de Abril foi a de formar cidadãos para uma sociedade democrática.
Recordemos Rui Grácio que ao fazer o balanço das reformas de 1974 e 1975 refere varias linhas de trabalho então implementadas designadamente com preocupações de formação de cidadãos através da renovação de “planos de estudo, conformados por valores de modernidade científica e cultural, de pluralismo ideológico, de inspiração democrática, (...) liberalização das relações educativas (…) maior iniciativa de alunos (…) abertura das escolas, mesmo as do ensino primário, à realidade envolvente, à atualidade imediata, aos problemas concretos da vida social”.
50 Anos depois consideremos três dimensões às quais a escola deve estar atenta a:
a) Diversidade dos que a frequentam e à qualidade da socialização;
b) Participação de todos e de cada um nos assuntos comuns da turma e da escola no seu próprio processo de aprendizagem; c) Conhecimentos, comportamentos e valores.
NESTES 50 ANOS VÁRIAS tentativas houve de atender a esta problemática no currículo e na organização da escola.
Num primeiro momento os programas concebidos a seguir ao 25 de Abril assumiram de forma explícita, aos vários níveis de ensino, preocupações com a educação dos cidadãos. Seguiam essa orientação o ensino das Ciências Humanas e Sociais e áreas inovadoras destinadas a essa finalidade como as Atividades de Contacto no Magistério Primário; o Serviço Cívico Estudantil, um ano em que os candidatos ao ensino superior participaram em programas de serviço às comunidades; a área interdisciplinar de Educação Cívica Politécnica (ECP), do currículo do 7 º ano unificado, destinada designadamente ao conhecimento do mundo do trabalho e ao desenvolvimento de programas de intervenção.
EM 1986 COM A PROMULGAÇÃO da Lei de Bases do Sistema Educativo, é retomada a dimensão da Formação Pessoal e Social. Em 1989 surge a Área Escola destinada designadamente ao desenvolvimento de projetos interdisciplinares. Em 2001 surge a Reorganização Curricular que assume a preocupação com a educação para a cidadania, designadamente através da Formação Cívica, e da Área de Projeto.
Este século é marcado por alguma instabilidade e pela criação da área de Cidadania e Desenvolvimento. Esta instabilidade dever-se-á a muitos fatores: a receios de endoutrinação, à dificuldade de encontrar espaços, tempos e organização que permitam a transversalidade destes temas e a sua abordagem apropriada, à necessária formação de professores para o efeito, etc.
Mas a verdade é que as ameaças à sustentabilidade do planeta e a onda mundial de ataque às democracias já chegaram a Portugal e não podemos adiar o seu atendimento.
*Ana Maria Bettencourt é profª emérita do Politécnico de Setúbal e Maria Emíia Brederode Santos é pedagoga, ambas tendo sido presidentes do Conselho Nacional da Educação (CNE)