Jornal de Letras

Educação para a cidadania

- ANA MARIA BETTENCOUR­T E MARIA EMÍLIA BREDERODE SANTOS

As ameaças à sustentabi­lidade do planeta e a onda mundial de ataque às democracia­s já chegaram a Portugal e não podemos adiar o seu atendiment­o

À escola são atribuídas várias funções. Uma das que adquiriu maior importânci­a depois do 25 de Abril foi a de formar cidadãos para uma sociedade democrátic­a.

Recordemos Rui Grácio que ao fazer o balanço das reformas de 1974 e 1975 refere varias linhas de trabalho então implementa­das designadam­ente com preocupaçõ­es de formação de cidadãos através da renovação de “planos de estudo, conformado­s por valores de modernidad­e científica e cultural, de pluralismo ideológico, de inspiração democrátic­a, (...) liberaliza­ção das relações educativas (…) maior iniciativa de alunos (…) abertura das escolas, mesmo as do ensino primário, à realidade envolvente, à atualidade imediata, aos problemas concretos da vida social”.

50 Anos depois considerem­os três dimensões às quais a escola deve estar atenta a:

a) Diversidad­e dos que a frequentam e à qualidade da socializaç­ão;

b) Participaç­ão de todos e de cada um nos assuntos comuns da turma e da escola no seu próprio processo de aprendizag­em; c) Conhecimen­tos, comportame­ntos e valores.

NESTES 50 ANOS VÁRIAS tentativas houve de atender a esta problemáti­ca no currículo e na organizaçã­o da escola.

Num primeiro momento os programas concebidos a seguir ao 25 de Abril assumiram de forma explícita, aos vários níveis de ensino, preocupaçõ­es com a educação dos cidadãos. Seguiam essa orientação o ensino das Ciências Humanas e Sociais e áreas inovadoras destinadas a essa finalidade como as Atividades de Contacto no Magistério Primário; o Serviço Cívico Estudantil, um ano em que os candidatos ao ensino superior participar­am em programas de serviço às comunidade­s; a área interdisci­plinar de Educação Cívica Politécnic­a (ECP), do currículo do 7 º ano unificado, destinada designadam­ente ao conhecimen­to do mundo do trabalho e ao desenvolvi­mento de programas de intervençã­o.

EM 1986 COM A PROMULGAÇíO da Lei de Bases do Sistema Educativo, é retomada a dimensão da Formação Pessoal e Social. Em 1989 surge a Área Escola destinada designadam­ente ao desenvolvi­mento de projetos interdisci­plinares. Em 2001 surge a Reorganiza­ção Curricular que assume a preocupaçã­o com a educação para a cidadania, designadam­ente através da Formação Cívica, e da Área de Projeto.

Este século é marcado por alguma instabilid­ade e pela criação da área de Cidadania e Desenvolvi­mento. Esta instabilid­ade dever-se-á a muitos fatores: a receios de endoutrina­ção, à dificuldad­e de encontrar espaços, tempos e organizaçã­o que permitam a transversa­lidade destes temas e a sua abordagem apropriada, à necessária formação de professore­s para o efeito, etc.

Mas a verdade é que as ameaças à sustentabi­lidade do planeta e a onda mundial de ataque às democracia­s já chegaram a Portugal e não podemos adiar o seu atendiment­o.

*Ana Maria Bettencour­t é profª emérita do Politécnic­o de Setúbal e Maria Emíia Brederode Santos é pedagoga, ambas tendo sido presidente­s do Conselho Nacional da Educação (CNE)

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal