Ex-ministro quer fortalecer relação do Banco de Portugal com o Governo
Em críticas implícitas ao antecessor, Centeno diz que o BdP “não deve enfrentar desafios numa torre de marfim” e sugere estreitar relações entre regulador e Governo.
Assegurar uma supervisão eficiente, participar na revisão da política monetária, bem como da política macroeconómica, e garantir a existência de um mecanismo de resolução eficiente, que assegure a estabilidade financeira. Estes são os quatro grandes desafios que Mário Centeno acredita que o Banco de Portugal (BdP) vai enfrentar nos próximos anos. Todos eles, defende, devem ser encarados numa relação mais estreita com o Governo do que aquela que tem sido mantida até agora. O BdP, diz, “não deve enfrentar desafios numa torre de marfim”.
O antigo ministro das Finanças, candidato já indigitado pelo Governo para assumir o cargo de governador do BdP, falava na Assembleia da República, na audição que, por lei, tem de ser feita a um candidato a governador do banco central, bem como aos administradores que venham a ser nomeados. Ao longo de três horas, Centeno foi deixando claro que não se revê na postura que, nos últimos dez anos, foi assumida pelo seu antecessor.
“A excelência do BdP vem de há muitos anos, mas deve ser renovada. O BdP não deve enfrentar desafios numa torre de marfim. O papel do BdP não se pode caracterizar pelo antagonismo ou pelo isolacionismo, mas antes pela complementaridade com o Governo e com a restante comunidade”, afirmou.
Por várias vezes, citou também dois dos artigos da lei orgânica do BdP para deixar clara qual a relação que pretende manter com o Executivo. “O BdP tem como competências velar pela estabilidade financeira e aconselhar o Governo neste âmbito”, salientou, acrescentando que a instituição que pretende governar
“pode e deve contribuir decisivamente para a definição de políticas nacionais coerentes, que permitam a Portugal vencer os importantes desafios que se colocam em Portugal e no mundo”.
Supervisão deve ser reforçada
Quanto àquela que deverá ser a atuação do BdP sob a sua já quase confirmada governação, Mário Centeno referiu a estabilidade financeira como a grande prioridade, mas não esqueceu a reforma da supervisão financeira, tentada (e falhada) pelo Governo de que fez parte.
“Sem estabilidade financeira, o país não cresce, os clientes dos bancos não prosperam e os bancos ficam na situação débil e muito difícil em que estavam no final de 2015”, quando o Governo que integrou tomou posse. “Nunca devemos esquecer-nos do que é um país tentar crescer sem estabilidade financeira”, sublinhou ainda.
Já relativamente à supervisão, Centeno foi questionado sobre a proposta apresentada pelo Executivo para reformar o sistema de supervisão financeira, um projeto que acabou por não ser discutido no Parlamento e que caducou. O antigo ministro rejeitou, contudo, que não tenha havido coragem para avançar com esta reforma, ou que tenha “recuado” perante os interesses das entidades visadas nesta reforma, algo de que foi acusado durante a audição.
“Tínhamos milhares de páginas, foi criado um grupo de trabalho, foi o maior exercício de pensamento executado sobre o modelo de supervisão. O trabalho final não é igual ao que era a minha ideia no início deste trabalho. Foram as dezenas de individualidades que tiveram intervenção neste processo que levaram àquela proposta. Só isso explica o tempo que demorou a ser feita”, considerou.
Ainda assim, Mário Centeno não afasta que esta pasta tenha de voltar a ser trabalhada. “O reforço do papel de supervisão do BdP é contínuo e deve ser mantido. Deve haver uma supervisão muito ativa nesta fase em particular, quando temos todos os problemas do pós-pandemia connosco”, apontou.
“A excelência do BdP vem de há muitos anos, mas deve ser renovada. O BdP não se pode caracterizar pelo antagonismo ou pelo isolacionismo, mas antes pela complementaridade com o Governo.
O reforço do papel da supervisão é contínuo e deve ser mantido. Deve haver uma supervisão muito ativa nesta fase. MÁRIO CENTENO “Candidato indigitado ao cargo de governador do BdP