Jornal de Notícias

“Foi a coisa mais dura que já fiz”

ENTREVISTA > MARIA CONCEIÇÃO, A PORTUGUESA QUE CORREU O 777 EM NOME DA SOLIDARIED­ADE

- IVETE CARNEIRO

“Foi uma das coisas mais duras que já fiz. Ajudem-me a torná-la útil”. É com esta simples declaração que a portuguesa Maria Conceição resume o maior desafio que levou a cabo em nome das crianças do Bangladesh. Corre por elas, pela educação que lhes quer dar, através da Fundação Maria Cristina (FMC, mariacrist­inafoundat­ion.org/), para tirá-las da pobreza. Na sexta-feira, completou a 7.ª corrida de uma aventura que implicava correr sete maratonas em sete dias e em sete continente­s. O Desafio 777 acabou por ser um 666 mais 111: o grupo ficou retido em Punta Arenas a aguardar abertas para ir correr à Antártida. Completou-se em 11 dias e fez de Maria Conceição a mulher mais rápida num 777. Maria fala-nos da inutilidad­e do feito se não redundar na meta que a levou à aventura – angariar até dia 26 cerca de 24 mil euros para dar escola a 14 crianças. Ontem esta “corrida” só ia nos 35%.

O que foi mais desafiante, os voos, a privação do sono, os quilómetro­s acumulados, a parte mental?

Penso que tudo combinado foi o verdadeiro desafio. Eu sabia que conseguia correr a distância porque já o ti- nha feito antes, como parte do meu treino. Mas tive uma lesão em dezembro e preocupava-me que pudesse reaparecer, o que me deixou algo nervosa. Os voos foram realmente duros, são longos e sempre difíceis, mas quando tem de se correr uma maratona entre cada um deles torna-se realmente duro. E cada voo foi ficando mais difícil, com cada vez mais inchaço nos pés e nas pernas.

Em que pensa enquanto corre?

Passo muito tempo a dizer-me que consigo fazer o que estou a fazer e penso nas pessoas que me apoiam e nos meus patrocinad­ores, que têm expectativ­as quanto ao meu sucesso. Mas mais de tudo penso na FMC e nas crianças. Eu só me meto nisto para ajudá-los a manterem-se na escola. É a minha única esperança de conseguir publicitar o trabalho da FMC e atrair fundos. Eéo que me dá a força de que preciso para completar os desafios.

E estes desafios valem a pena?

Trazem publicidad­e. É algo que as pessoas gostam de ler. O trabalho humanitári­o é uma história interessan­te em si mesma, mas não traz assim tanta publicidad­e, porque é uma história a longo prazo, enquanto cada novo desafio é uma notícia que nos mantém sob as luzes da ribalta. A FMC não teria sobrevivid­o sem os desafios e o apoio financeiro que nos trazem.

O que é mais duro, a luta contra os quilómetro­s ou a luta para arranjar apoios para a Fundação?

Claramente a luta pelo apoio à solidaried­ade. Os desafios apenas me tomam sete, 11 dias, uma corrida. O trabalho humanitári­o e a luta pelo financiame­nto é permanente. O dinheiro que temos dá para as contas atuais. Mas a educação é uma aposta a longo termo, pelo menos cinco anos por criança, portanto, as faturas continuam a chegar. Se tivermos um ou dois meses com poucos donativos, ficamos sem margem para as contas e temos que duplicar ou triplicar os esforços de angariação de fundos. As pessoas pensam que estamos financeira­mente seguros, mas na verdade é uma situação muito instável. Não podemos prever o mês seguinte porque não temos fonte de rendimento segura ou regular. Esperamos melhorar este estado de coisas encontrand­o parceiros doadores regulares, através do apadrinham­ento de crianças ou do apoio a adultos.

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