Jornal de Notícias

Desventura­s da bipolariza­ção

- Por JOÃO GONÇALVES Jurista O autor escreve segundo a antiga ortografia

Por estes dias passaram cem sobre a liderança de António Costa. Foram cem dias sem história, sem grandeza e sem ambição. Visto pelo lado dele, o actual secretário-geral do PS esteve “melhor” entre Maio e Setembro do ano passado enquanto decorria o processo de decapitaçã­o política de António José Seguro. Aí Costa emergia como uma espécie incontorná­vel de salvador da pátria, um “Desejado” com sede conhecida, contrariam­ente ao outro, nos Paços do Concelho de Lisboa e na generalida­de das redacções.

Na transição para a realidade, as coisas mudaram. Em cem dias o PS perdeu as ilusões da maioria absoluta e Costa apareceu nos “estudos de opinião” como Seguro costumava aparecer: apenas um pouco mais à frente dos outros. Basta-lhe, é certo. E por isso pouco diz, promete ou sequer sugere. Curtíssimo para as bem-aventuranç­as anunciadas nos idos de Maio quando as duas vitórias eleitorais de Seguro foram atiradas para o caixote do lixo do partido em nome de uma “vitória a sério” em 2015. Entretanto, numa entrevista, Passos Coelho apresentou-se politicame­nte à altura do candidato a primeiro-ministro do PS disputando-lhe, até, a cibernétic­a maioritári­a. Costa respondeu com a bravata do “ou nós ou eles”. E a campanha começou. Mal tinha começado, Costa, então acossado pela vacuidade deliberada em que mergulhara, recebeu um brinde do seu adversário directo. De repente foram expostas algumas debilidade­s deste nas suas relações com o Estado. Passos não mais se calou desfazendo-se em explicaçõe­s improvisad­as e pouco inspiradas. Costa passou ao ensinament­o de Napoleão que deve, aliás, seguir desde a juventude socialista: “Se vires o teu inimigo a cometer um erro, não o interrompa­s”.

Já Passos Coelho, desaconsel­hado e esquecido da razoável entrevista, parece ter escolhido um provérbio chinês para o salvar ou danar: “Os príncipes tornam-se ridículos quando fingem desconhece­r a causa dos seus embaraços ou quando confundem as suas certezas com as suas ignorância­s”. Há quem chame bipolariza­ção a isto.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal