Jornal de Notícias

O riso tem muito siso

César Mourão estreia hoje em Lisboa monólogo em que alerta para o abandono dos idosos. A seguir, a peça vem para o Porto

- Ana Vitória anavito@jn.pt

“Esperança”, o monólogo que César Mourão estreia hoje no Teatro da Trindade, divide-se entre o humor e o desassombr­o. Quando se lhe pergunta se é uma comédia ou um drama o ator responde: “É teatro”.

César Mourão gosta de criar personagen­s de senhoras idosas. E desta vez inventou uma, de nome Esperança que, explica, “é uma coleção de várias mulheres que fui observando ao longo da minha vida”. Inspirou-se em gente idosa mas não só. “As pastelaria­s das avenidas novas, em Lisboa, foram uma grande fonte de inspiração”, adiantou ao JN.

O cenário remete para um quarto do hospital. D. Esperança é uma velhota simpática e desemproad­a, que usa telemóvel, conta que trabalhou na rádio e que gostava de cantar fados de Amália. “É uma velha simpática, inteligent­e à sua maneira”, caracteriz­a-a o seu criador.

Com efeito, Esperança tem um olhar muito especial e assertivo sobre vários assuntos, desde a meteorolog­ia, “o tempo muda e o meu joelho responde logo”, ao campismo, “onde há muitas moscas porque não há comida de jeito”, passando pela gastronomi­a chinesa e japonesa, “andam a invadir-nos por dentro, andam a salgar-nos a identidade”. Para D. Esperança “todos se preocupam muito com os terrorista­s e os jiadistas” mas não há dúvidas de que os japoneses querem dar azo a uma terceira guerra mundial gastronómi­ca, ao abrirem restaurant­es onde servem comida crua... Embora seja um espetáculo bem humorado, César Mourão considera que a mais valia deste seu projeto, escrito a meias com Frederico Pombares, tem a ver com o facto de ele se desenrolar entre o humor e um certo lado dramático. Por isso o define como uma comédia poética. “É uma peça que se passa toda num momento em que a personagem sente que vai morrer. Não quis fazer humor pelo humor. Pretendi também chamar a atenção para o abandono de idosos nos hospitais. Quis alfinetar quem faz isso”, referiu.

O encenador brasileiro André Paes Leme admitiu que este desejo de trazer algo para o palco que fosse bem humorado e que ao mesmo tempo também fizesse pensar foi um dos grandes desafios do seu trabalho.

“O espetáculo busca esse diálogo entre o riso e um pouco de uma certa melancolia e de tristeza. Prevalece, naturalmen­te, também em função do conjunto do trabalho e do artista que protagoniz­a, a ideia da leveza, do bom humor”, explicou. “Acabamos o espetáculo para cima, apesar de ter momentos mais pesados”, resumiu.

“O ESPETÁCULO BUSCA O DIÁLOGO ENTRE O RISO E A MELANCOLIA”

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