Jornal de Notícias

A honra dos que ficaram sem nada

- Por PEDRO IVO CARVALHO Editor-executivo-adjunto

ODono Disto Tudo, afinal, não foi o Culpado Disto Tudo. “Não vou dizer que não tenho nada a ver com nada. Segurament­e não terei tudo a ver com tudo”, proclamou Ricardo Salgado, durante a segunda visita à Comissão Parlamenta­r de Inquérito ao BES. Quatro meses de acusações, uma auditoria demolidora e várias manifestaç­ões públicas de centenas de lesados com a falência do banco que dirigia não foram suficiente­s para alterar significat­ivamente a pose imperturbá­vel do ex-banqueiro. O máximo que os deputados conseguira­m arrancar-lhe foi um “lamento” pelo sucedido. Não pediu desculpa a ninguém, porque pedir desculpa, explicou, parafrasea­ndo Fernando Pessoa, “é pior do que não ter razão”.

Ricardo Salgado acha, pois, que a verdade lhe assiste. Não há como negar-lhe esse direito. Preocupa-o o que dele dizem, a sua honra pessoal, a da família. Preocupa-o, fundamenta­lmente, que nenhum dos que o acossaram fique com a última palavra. Há contas a ajustar. Foi isso que fez ontem. Perdido por cem, perdido por mil.

Limpar o nome, regenerar a herança que deixa para a história coletiva de um país é, agora, o seu imperativo. Como se uma vitória estrondosa na barra do tribunal, palco para onde promete transporta­r esta batalha (e tem tantas armas para ser bem sucedido), pudesse funcionar como uma esponja mágica que apaga o passado. E a responsabi­lidade.

A honra de Ricardo Salgado valerá certamente muito. Tanto quanto a das centenas de depositant­es anónimos que lhe confiaram as poupanças de uma vida. Porém, não teve a humildade de lhes pedir desculpa. Ser honrado também é isso.

Ou, como diria Fernando Pessoa, “querer não é poder. Quem pôde, quis antes de poder só depois de poder. Quem quer nunca há de poder, porque se perde em querer”.

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