A honra dos que ficaram sem nada
ODono Disto Tudo, afinal, não foi o Culpado Disto Tudo. “Não vou dizer que não tenho nada a ver com nada. Seguramente não terei tudo a ver com tudo”, proclamou Ricardo Salgado, durante a segunda visita à Comissão Parlamentar de Inquérito ao BES. Quatro meses de acusações, uma auditoria demolidora e várias manifestações públicas de centenas de lesados com a falência do banco que dirigia não foram suficientes para alterar significativamente a pose imperturbável do ex-banqueiro. O máximo que os deputados conseguiram arrancar-lhe foi um “lamento” pelo sucedido. Não pediu desculpa a ninguém, porque pedir desculpa, explicou, parafraseando Fernando Pessoa, “é pior do que não ter razão”.
Ricardo Salgado acha, pois, que a verdade lhe assiste. Não há como negar-lhe esse direito. Preocupa-o o que dele dizem, a sua honra pessoal, a da família. Preocupa-o, fundamentalmente, que nenhum dos que o acossaram fique com a última palavra. Há contas a ajustar. Foi isso que fez ontem. Perdido por cem, perdido por mil.
Limpar o nome, regenerar a herança que deixa para a história coletiva de um país é, agora, o seu imperativo. Como se uma vitória estrondosa na barra do tribunal, palco para onde promete transportar esta batalha (e tem tantas armas para ser bem sucedido), pudesse funcionar como uma esponja mágica que apaga o passado. E a responsabilidade.
A honra de Ricardo Salgado valerá certamente muito. Tanto quanto a das centenas de depositantes anónimos que lhe confiaram as poupanças de uma vida. Porém, não teve a humildade de lhes pedir desculpa. Ser honrado também é isso.
Ou, como diria Fernando Pessoa, “querer não é poder. Quem pôde, quis antes de poder só depois de poder. Quem quer nunca há de poder, porque se perde em querer”.