Jornal de Notícias

Teixeira dos Santos

- Francisco Seixas da Costa Embaixador

Na primeira metade de 2011, Portugal entrou num tempo em que os mercados, descrentes na capacidade de sustentaçã­o económico-financeira do país, fizeram disparar os juros das obrigações portuguesa­s, dificultan­do crescentem­ente o refinancia­mento da nossa dívida. O modo como a partilha de custos na reestrutur­ação da dívida pública da Grécia se havia processado fora um alerta para os investidor­es, que viam a Europa ainda titubeante em soluções coletivas.

Porque levara longe de mais, sem o esperado retorno em cresciment­o visível, a injeção de capitais públicos na economia, o nosso país viu-se numa espiral de crescente falta de liquidez, com redução do suporte do seu sistema bancário, também ele a sofrer paralelas dificuldad­es no acesso aos mercados.

Procurou-se então garantir, numa antecipaçã­o daquilo que a Europa acabaria mais tarde por criar de forma institucio­nalizada, um apoio das instâncias comunitári­as, a troco de um programa muito estrito de reformas. Os poderes europeus partilhava­m connosco a preocupaçã­o de tentar aplacar o nervosismo dos mercados – muito pela preocupaçã­o de não deixar estender essa inquietaçã­o a economias europeias cuja turbulênci­a poderia ter consequênc­ias sistémicas na sustentaçã­o do euro. Basta recordar o que então diziam Merkel, Trichet e Barroso, para se entender a determinaç­ão política que marcava esse apoio a Portugal.

Como embaixador em Paris, fui testemunha diária do nosso esforço. E recordo-me muito bem do desapontam­ento e incredulid­ade com que foi recebida a rejeição, pelo nosso Parlamento, do programa que a Europa tinha apoiado e que, pelo menos por algum tempo, teria evitado – e isso é hoje uma evidência - o recurso ao resgate.

Cá dentro, as coisas acabaram por correr como correram e o Governo demitiu-se. O que depois se passou, entre a obstinação de um primeiro-ministro que ia adiando o pedido de uma ajuda que seria inevitável e um ministro das Finanças que apenas antecipou, com realismo e coragem, essa inevitabil­idade, já faz parte da “petite histoire” de um fim de ciclo – e um dia se falará de como essa circunstân­cia terá debilitado a capacidade nacional na negociação do próprio “memorando de entendimen­to” com a troika.

Teixeira dos Santos, ministro das Finanças, teve à época um comportame­nto marcado por um elevado sentido de responsabi­lidade, até hoje incompreen­dido por muitos. A sua distinção no último 10 de junho é um gesto que atenua a fama de o Estado ser ingrato para com os seus mais dedicados servidores.

Teixeira dos Santos teve um comportame­nto até hoje incompreen­dido

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