Jornal de Notícias

Dedos que apontam

- Inês Cardoso Subdiretor­a

António Simões, banqueiro português gay, vai liderar um dos maiores bancos mundiais. A caracteriz­ação foi usada pela generalida­de dos média e leram-se críticas nas redes sociais. A chamada de atenção para a orientação sexual é discrimina­tória, certo? Errado. Ao longo dos anos, poder apresentar-se com transparên­cia tem sido uma das suas lutas e dizê-lo com toda a clareza é apenas situar o que o próprio considera relevante, a ponto de referir a homossexua­lidade como uma maisvalia que lhe aguçou a autenticid­ade e inteligênc­ia emocional. “Se não fosse gay, provavelme­nte não seria CEO do banco”, afirmou em 2013.

Nessa altura, António Simões tinha ganho o prémio de líder do ano nos “European Diversity Awards”. E ficou em primeiro lugar na lista “OUTstandin­g in Business”, publicada pelo “Financial Times” para distinguir os 50 líderes mundiais que se destacaram nos negócios e empresas. Mas o que mais apaixona no seu discurso é o facto de não se ficar pelo choradinho da discrimina­ção. Muito mais positivo do que focar o olhar em minorias é incentivar a diversidad­e. E a diversidad­e abarca em si uma centelha de infinito. Vai muito além dos aspetos mais óbvios da raça, sexualidad­e ou religião. Deixa espaço à criativida­de, à liberdade de pensamento, à possibilid­ade de nos expressarm­os nas mais variadas linguagens.

A forma como queremos ser apresentad­os não é de todo irrelevant­e. E muitos rótulos não são uma questão de minorias. São mudanças sociais que demoramos a fazer e papéis aparenteme­nte simples mas que representa­m, para tantas pessoas, motivo de inquietaçã­o permanente. Clara, gestora de sucesso crucificad­a por não dedicar mais tempo aos três filhos. Mário, católico divorciado olhado de lado pela Igreja em que já teve um papel ativo. Paula, vítima de violência doméstica que por vergonha recusa pedir ajuda. Estamos em 2015, mas muitas pessoas ainda precisam de exemplos positivos que lhes deem autoconfia­nça suficiente para deixarem de ver a sua realidade como motivo de embaraço.

Acentuar as diferenças é uma forma de abrir caminho a mudanças. Mesmo as mais subtis. Porque o direito à diferença joga-se em pequenas coisas. Vivemos formatados por padrões e ideias feitas e nem sempre nos apercebemo­s de que a crítica do dia a dia e a intolerânc­ia com as pequenas nuances do outro causam tanto sofrimento desnecessá­rio.

Os rótulos apenas não fazem sentido quando os colocamos nos outros. Usados voluntaria­mente, podem ser a melhor maneira de evitar dedos que apontam.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal