Na agricultura e na construção a crise não depende da sazonalidade
FARO Os termómetros marcam uma temperatura superior a 40 graus quando John Jack chega de bicicleta à cantina social do Centro Paroquial de Santa Bárbara de Nexe, numa encosta situada junto ao Estádio do Algarve, em Faro. O inglês, carpinteiro de profissão, está em Portugal há 12 anos e é um dos 50 beneficiários das refeições que ali são distribuídas. “Estou sem trabalho, apesar de me fartar de procurar”, desabafa. A necessidade dá-lhe força para subir a estrada e ir buscar comida. “Estou a viver do Rendimento Social de Inserção, uma situação muito difícil”.
É um das muitas histórias de carências ouvidas nos arredores da capital algarvia, onde a crise se faz sentir até na zona rural. “Algumas pessoas estão desempregadas, mas também há quem tenha trabalho, mas com rendimentos tão baixos que não dá para pagar as contas e alimentar-se”, revela Tânia Lourenço, responsável pela cantina.
Se a sazonalidade dita leis no turismo, na indústria e na agricultura o flagelo vem da precariedade. “Tenho tentado arranjar emprego, mas a construção está parada, não aparece nada. Também vou às quintas, mas aí só há imigrantes romenos, moldavos, brasileiros e africanos. Tudo mão de obra barata e com o patrão atrás com um chicote”, desabafa José Rafael, antigo pedreiro que, aos 48 anos, está desempregado e tem de pedir ajuda para alimentar o filho de 11 anos.
A crise sente-se em todas as idades. Iuri Rosa, de 26 anos, conseguiu há pouco um emprego na Junta de Freguesia de Santa Bárbara de Nexe, mas não sabe até quando. Tem esperanças de ficar, mas recorda o desespero de um dos últimos verões. “Estava a dar em doido, sempre a correr tudo de bicicleta, a bater a todas as portas, a pedir trabalho, e sem conseguir nada”, recorda.
À falta de trabalho juntam-se, noutros casos, problemas de saúde que só agravam as situações de precariedade.
“Não posso trabalhar, tenho depressões nervosas e o meu marido já teve três AVC. A reforma dele vai quase toda para a água, luz e medicamentos, pelo que se não fosse a cantina nem conseguíamos alimentar-nos”, conta Natércia Martins, de 46 anos.
Precariedade nos setores da construção e agricultura empurra crise para o interior