Bombeiros queixam-se da falta de ajuda da população
Corporações lamentam falta de apoio das populações e verificam que donativos só surgiram quando o fogo estava à porta de casa. Mudança no tempo abranda fogos, mas as chamas ainda lavram na serra da Estrela
Donativos para alimentar voluntários diminuíram e só há apoios após apelos Governo não criou equipas de análise e uso do contrafogo previstas no dispositivo de combate Autoridades detiveram ontem quatro suspeitos de terem ateado vários incêndios
Os bombeiros de Braga, Ponte de Lima, Póvoa de Lanhoso e Vieira do Minho, que nos últimos dias enfrentaram uma vaga de incêndios que só agora parece estar a acalmar, queixam-se da falta de donativos e de apoio para alimentar os voluntários. Outras associações, como Monção e Mangualde, só voltaram a ter dádivas depois de lançarem apelos à solidariedade da população.
Jaime Soares, presidente da Liga dos Bombeiros, confirma a redução drástica dos donativos, um pouco por todo o país, que justifica com a crise económica. “A população é solidária e apoia os bombeiros, mas não tem dinheiro. A sociedade está diferente”, disse, ao JN.
Nos últimos dias, a quantidade e a intensidade dos incêndios obrigaram a que fosse montada, em vários quartéis, uma máquina capaz de servir duas refeições e três reforços alimentares por dia. Em anos anteriores, sem campanhas ou apelos, empresas e cidadãos entregavam nos bombeiros garrafas de água, embalagens de leite, sumos e bolachas ou bolos embalados. Este ano, as ofertas foram muito raras.
Estrela ainda a arder
Em todo o país, até às 22.45 horas de ontem, registaram-se 203 ocorrências, segundo a Autoridade Nacional de Proteção Civil (ver pág 6). Até às 21.45 horas, os distritos do Porto (45 fogos), Vila Real (27) e Braga (25) foram os mais afetados. Ao final do dia de ontem, havia três incêndios por dominar. O mais preoem cupante lavrava no Parque Natural da Serra da Estrela. O fogo começou na segunda-feira e obrigou ao reforço de meios (430 operacionais, auxiliados por 140 viaturas).
Em outro incêndio, iniciado em Arouca, distrito de Aveiro, as chamas galgaram à freguesia de Nespereira, no concelho vizinho de Cinfães, distrito de Viseu. “O fogo andava num vale encaixado onde passam postes de média tensão, e os meios aéreos não podiam atuar”, disse, ao JN, Paulo Esteves, comandante dos Bombeiros de Cinfães.
Já o fogo deflagrado, no sábado, Candemil, Vila Nova de Cerveira, e que alastrou à serra d’Arga, já está dominado. As primeiras estimativas apontam para uma área ardida próxima aos 3000 hectares. “O trabalho dos bombeiros e dos sapadores foi espetacular. Se não fossem eles, algumas casas teriam ardido”, afirmou o presidente da União de Freguesias. Depois de mais de 30 horas de trabalho, ontem à tarde já se podia respirar.
E só as chamas levaram os populares a agradecer aos voluntários. “Depois de apelar à população para que ajudasse com bebidas e sandes, as
ofertas superaram as expectativas”, referiu fonte do comando dos Bombeiros de Monção. Atualmente, a corporação está a fornecer cinco refeições por dia a 130 bombeiros.
Em Mangualde, a solidariedade só ganhou forma depois de a Câmara ter pedido ajuda à população. João Soares, da direção dos bombeiros, confirma que, antes do apelo, “e apesar de já haver incêndios, não houve ofertas”.
Em Ponte de Lima, onde, num dia, foram servidos 109 pequenosalmoços a bombeiros que combatem as chamas na região, somente “duas senhoras foram entregar embalagens de leite, água e fruta”.
“Estamos em crise e as pessoas não têm dinheiro. Mas, quando toca a sirene, os bombeiros aparecem”, afirmou António Macedo, vice-presidente da corporação de Vieira do Minho. “Acabaram-se os donativos e as ofertas espontâneas. Agora, temos que pedir e muito”, referiu.
As despesas pagas pelas corporações são, posteriormente, reembolsadas
pela Proteção Civil nacional. Em cada incêndio, há uma logística pesada que implica refeições, higiene, alojamento, reabastecimento de combustível e água e manutenção de viaturas e equipamentos. Tudo pago pelo corpo de bombeiros da localidade onde sucede a ocorrência.
Exceção em Agra
No caso fogo na serra d’Arga, toda a mecânica invisível de apoio às forças de combate esteve sob o comando de Luís Pedro Saraiva, comandante do corpo de voluntários. Serviram-se mais de duas mil refeições por dia, 2600 sandes e bebidas todos os dias, ao pequeno-almoço e reforços.
Só no domingo, foram consumidas 3000 garrafas de água. “Tivemos a ajuda da população, como sempre. Houve pessoas que se dirigiram ao quartel para entregar paletes de água, alimentos, leite, fruta e bolos. Foi o que as pessoas puderam dar”, finalizou.