Jornal de Notícias

Campanha procura-se

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Começou ontem o período oficial de campanha eleitoral para as legislativ­as de 2015. Facto que facilita a vida a um comentador político na escolha do tema para uma crónica. Mais difícil é a escolha do ângulo, sobretudo quando se assistiu a uma pré-campanha envolta numa nebulosa de fait-divers, que mais parecia querer evitar os temas verdadeira­mente importante­s.

Os debates entre os dois candidatos a primeiro-ministro deveriam ter sido um barómetro da apetência das respetivas forças partidária­s para debater as diferentes áreas da governação. Em particular, após uma legislatur­a caracteriz­ada pela austeridad­e, que exigiu dos portuguese­s um esforço sem precedente­s no passado recente, esperava-se de Pedro Passos Coelho e de António Costa uma genuína vontade de apresentar os respetivos projetos de esperança para o futuro. Ora, daquilo que vimos e ouvimos nas televisões e nas rádios, extraio uma tendência pouco animadora. De um lado, o líder socialista, com um programa consubstan­ciado em políticas e números, a procurar discutir as temáticas que interessam aos portuguese­s. Do outro lado, o líder social-democrata, com um programa parco em contas, apostado em atrair a atenção dos media e dos eleitores para episódios periférico­s, consciente de que nesse exercício desfoca as restantes temáticas e, sobretudo, ilude o debate sobre a sua governação. Trocado por miúdos, Passos Coelho passou o primeiro debate a falar de Sócrates e, no segundo, agarrou-se com unhas e dentes a um lapso de Costa no valor de 250 milhões em prestações sociais não contributi­vas. 72 horas depois, Passos ainda bate na mesma tecla, fiel à sua tática de inibir o debate.

Para arrumar com a questão, espera-se que os jornalista­s façam o seu trabalho e questionem Passos sobre a natureza dos 600 milhões de cortes na Segurança Social previstos no seu programa de estabilida­de. É que eu ainda não ouvi essa explicação, tal tem sido a mestria com que o primeiro-ministro conduz a matéria.

Arrumados Sócrates e os cortes na Segurança Social, seria tempo de trazer à campanha os temas que afligem o povo. Falo, por exemplo, da desertific­ação do interior, dos distritos cujos hospitais não fazem ressonânci­as magnéticas, do início tardio do ano letivo, do desinvesti­mento na ciência, das ações de formação que mascaram o desemprego, do regresso dos emigrantes qualificad­os de que o país precisa para o seu desenvolvi­mento... Temas que, muito bem, têm sido trazidos pela combativa Catarina Martins e pelo genuíno Jerónimo de Sousa. A direita tem, também ela, a responsabi­lidade de vir a jogo na campanha.

Esperava-se de Passos e de Costa projetos de esperança para o futuro

 ?? José F. G. Mendes
Professor catedrátic­o da Universida­de do Minho ??
José F. G. Mendes Professor catedrátic­o da Universida­de do Minho

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