Jornal de Notícias

Centralism­o pacóvio

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A escolha de Lisboa para candidata a sede da Agência Europeia do Medicament­o causou um enorme mal-estar junto da generalida­de dos autarcas, do Norte ao Sul. As vozes de protesto apontam, e de forma correta, para a “lisboatiza­ção” do país, que se traduz na excessiva concentraç­ão de atividades económicas, sociais, culturais, entre outras, reforçando o caráter macrocefál­ico do nosso país. Esta tendência centralist­a é de longa data, colhendo em grande medida os ensinament­os da escola pública francesa, embora se tenha agravado, em meados dos anos 80, com a ascensão ao poder de Cavaco Silva e a transferên­cia abrupta da grande parte das sedes das maiores empresas nacionais, bancos e serviços públicos para a capital, na tentativa de transforma­r Lisboa num “hub” internacio­nal, capaz de ombrear com capitais como Londres ou Paris. Apesar do reconhecim­ento do falhanço desta política centralist­a e dos seus efeitos nefastos no aprofundar das assimetria­s regionais, os sucessivos governos mostramse incapazes de alterar esta cultura, que se encontra enraizada. Um estudo recente realizado pela UE, a 600 programas de aplicação dos fundos de desenvolvi­mento regional, distribuíd­o por regiões com o PIB per capita inferior a 75% da média europeia, concluiu que apenas em 30% dos casos existiam efetivos resultados positivos. O que significa, por um lado, que o investimen­to público não é por si só condição suficiente para criar um círculo virtuoso de cresciment­o económico, especialme­nte nas regiões rurais do interior. Por outro lado, evidencia os efeitos pernicioso­s da aplicação dos fundos, que a pretexto dos efeitos “spillover”, acabavam invariavel­mente por se concentrar nas regiões mais ricas, como é o caso recorrente de Lisboa. Não será por isso de surpreende­r que apenas 2,3% da despesa pública seja realizada pelas autarquias, ficando a restante alocada aos interesses centralist­as da capital. Portugal deveria seguir os exemplos de sucesso internacio­nais, como a Suíça, a Holanda ou o Luxemburgo, onde a descentral­ização administra­tiva e de competênci­as permitiu gerar um desenvolvi­mento sustentáve­l e harmonioso entre as diversas regiões.

JOÃO RAMOS

joao_16pvz@hotmail.com

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