O dólar que se cuide com a ameaça do yuan
O crescimento económico e o alargamento de parcerias em todos os continentes faz crescer cada vez mais a influência da moeda chinesa
CHINA Se lhe disserem que, dentro de anos, uma moeda que ainda lhe soa estranha – yuan, ou melhor, o renminbi – será a divisa de referência nas transações mundiais, não se admire: é a economia a funcionar e a China uma grande potência.
Com taxas de crescimento anual da economia de 6%, 7%, 8%, ou mais, nos últimos anos, é “expectável” que a tendência “se mantenha”. Apesar de ainda apresentar uma feição “muito rural”, a economia chinesa está a tornar-se “robusta”, crê o economista João Loureiro.
Nos primeiros cinco meses deste ano, a produção industrial subiu 6,9% e setores como a energia registaram um incremento superior a 12%, segundo as estatísticas chinesas.
O comércio externo subiu 8,8% e as exportações aumentaram 5,5%, embora as importações tenham subido 12,6%, num sinal de que a China pode consumir mais (em janeiro de 2015, o PIB chinês já representava 17% do PIB mundial). E pode pagar mais importações na sua própria moeda.
Um sinal sério foi dado em meados de junho, quando o ICBC, o maior banco chinês e do mundo, acordou com o Banco Central da Nigéria (primeira economia africana) a constituição em yuans de 10% das suas reservas de divisas.
BANCOS CENTRAIS APOSTAM
Não foi novidade: em 2017, várias bancos centrais europeus, incluindo o alemão Bundesbank e o Banco Central da França, já tinham constituído em yuans parte das suas reservas.
“É normal os bancos centrais irem ao mercado adquirir divisas em várias moedas de circulação internacional, para diversificarem os investimentos e diminuírem os riscos”, comenta João Loureiro, que é professor de política cambial na Faculdade de Economia do Porto.
Admitida em 2015 no cabaz de moedas com direitos especiais de saque (DES), isto é, ativos de reserva internacional completando as reservas dos países-membros do Fundo Monetário Internacional, no início de 2018 ocupava já o terceiro lugar em importância, atrás do dólar e do euro.
Poderá ultrapassá-los? “É uma questão de tempo”, diz o especialista, devido à crescente robustez da economia chinesa. Mas já é um instrumento importante em muitas operações. Por exemplo, um empréstimo obrigacionista de uma grande empresa pode ter emissões também em yuans, se lhe interessarem investimentos asiáticos...
O dólar continua, contudo, a ser a moeda mais importante, de tal modo que a China a adquire em grande volume, detendo as maio- res reservas, ao mesmo tempo que vende yuans, moeda cada vez mais influente.
No final de maio, 14 países e 17 bancos centrais africanos, reunidos em Harare, Zimbabué, fizeram do yuan uma das moedas oficiais de reserva. E de pagamentos à China, que detém aliás 22% da enorme dívida africana. Foi com o petróleo angolano que a China inaugurou o “petroyuan”, em marcha na Bolsa Energética de Xangai.
África, a par da Eurásia (Rússia e Índia incluídas), de vários países europeus e 33 países da América Latina faz parte de um universo abrangido pela iniciativa “Um Cinturão, Uma Rota”, lançada em 2013 pelo presidente chinês, Xi Jinping, como instrumento de integração global da China e de cooperação “entre iguais” assente em grandes ferrovias, portos e rotas marítimas, por onde fluem mercadorias e... yuans. O dólar que se cuide.