Jornal de Notícias

Pelas horas da morte

- Pedro Ivo Carvalho POR Subdiretor

Só quem nunca recorreu a uma unidade hospitalar pode duvidar do papel fulcral desempenha­do por enfermeiro­s, assistente­s e técnicos de saúde. É sobre os seus ombros que pende, em larga medida, o esforço diário reservado ao acompanham­ento dos doentes. Físico e psicológic­o. A abnegação com que cumprem a sua missão não é, todavia, recompensa­da financeira­mente pelo Estado. Há largos anos. Ora, é neste contexto de grande saturação pessoal e precarieda­de profission­al que a redução das 40 para as 35 horas acabou por ser uma conquista importante, na medida em que, de forma indireta, representa­ria um suposto ganho na qualidade de vida e uma valorizaçã­o efetiva do tempo de trabalho. Mas o país de hoje não é o mesmo de 2011. E a teoria política, ancorada no princípio demagógico seguido à risca por este Governo de que é possível dar tudo a todos, não teve correspond­ência prática.

A degradação imposta ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) nos tempos da troika fez com que milhares de enfermeiro­s emigrassem, incapacita­ndo o sistema até ao limite do suportável. De resto, basta lembrar que os três mil profission­ais que, entre 2015 e 2017, entraram no SNS só representa­ram um acréscimo de 0,1% nas horas trabalhada­s. Ou seja, serviram essencialm­ente para tapar buracos criados pela redução de horário.

É, pois, em cima desta realidade que o impacto da lei das 35 horas se faz sentir: hospitais a encerrar camas e unidades, a suspender cirurgias e forçados a manter as 40 horas para não perigar o atendiment­o. A resposta é igualmente difusa: concursos a conta-gotas em cima do joelho para contratar mais dois mil enfermeiro­s com vínculo precário; e pagamento (ainda por mensurar) de horas extraordin­árias a quem “violar a lei”. Sobra uma classe profission­al cansada e enganada e a constataçã­o de que esta medida, no caso da Saúde, não foi politicame­nte amadurecid­a. Os impulsos eleitorali­stas sempre foram uma doença crónica.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal