Pelas horas da morte
Só quem nunca recorreu a uma unidade hospitalar pode duvidar do papel fulcral desempenhado por enfermeiros, assistentes e técnicos de saúde. É sobre os seus ombros que pende, em larga medida, o esforço diário reservado ao acompanhamento dos doentes. Físico e psicológico. A abnegação com que cumprem a sua missão não é, todavia, recompensada financeiramente pelo Estado. Há largos anos. Ora, é neste contexto de grande saturação pessoal e precariedade profissional que a redução das 40 para as 35 horas acabou por ser uma conquista importante, na medida em que, de forma indireta, representaria um suposto ganho na qualidade de vida e uma valorização efetiva do tempo de trabalho. Mas o país de hoje não é o mesmo de 2011. E a teoria política, ancorada no princípio demagógico seguido à risca por este Governo de que é possível dar tudo a todos, não teve correspondência prática.
A degradação imposta ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) nos tempos da troika fez com que milhares de enfermeiros emigrassem, incapacitando o sistema até ao limite do suportável. De resto, basta lembrar que os três mil profissionais que, entre 2015 e 2017, entraram no SNS só representaram um acréscimo de 0,1% nas horas trabalhadas. Ou seja, serviram essencialmente para tapar buracos criados pela redução de horário.
É, pois, em cima desta realidade que o impacto da lei das 35 horas se faz sentir: hospitais a encerrar camas e unidades, a suspender cirurgias e forçados a manter as 40 horas para não perigar o atendimento. A resposta é igualmente difusa: concursos a conta-gotas em cima do joelho para contratar mais dois mil enfermeiros com vínculo precário; e pagamento (ainda por mensurar) de horas extraordinárias a quem “violar a lei”. Sobra uma classe profissional cansada e enganada e a constatação de que esta medida, no caso da Saúde, não foi politicamente amadurecida. Os impulsos eleitoralistas sempre foram uma doença crónica.