Governo só indemniza famílias de comandos mortos se for obrigado
Estado interrompe negociações e vai aguardar pela decisão do tribunal Tragédia com recrutas foi em 2016, mas julgamento está longe de terminar
FORÇAS ARMADAS O Governo travou, no último trimestre do ano passado, a negociação a que dera início para o pagamento de indemnizações às famílias dos recrutas mortos, devido a um “golpe de calor”, durante a chamada “prova-zero” do 127.o Curso de Comandos, em 2016. Para desespero das famílias, a intenção do Estado é, agora, nada decidir antes do final do julgamento, que começou há mais de um ano e não tem data para terminar. Ao JN, o Ministério da Justiça (MJ) refere apenas que, se houver um acordo, irá ponderar se “a transação deve ou não ser autorizada”, “à luz do interesse público”.
“Acho lamentável. Noutras situações que conhecemos desta natureza – como [os fogos de] Pedrógão –, o Estado sempre avançou, independentemente da responsabilidade criminal, por entender que, mesmo que não haja responsabilidade criminal, há o funcionamento do sistema em geral que falha”, frisa Ricardo Sá Fernandes, advogado dos pais de Hugo Abreu e do pai de Dylan Silva, ambos com 20 anos à data da sua morte.
Até porque, acrescenta o representante da mãe deste último, Miguel Santos Pereira, “estamos a falar de militares que já tinham jurado bandeira” e “estavam a preparar-se para representar o Estado”, nomeadamente em missões no estrangeiro. “O Estado não se tem comportado à altura das circunstâncias”, afirma.
RESPOSTA APÓS ELEIÇÕES
Em causa está, além da garantia do pagamento da indemnização em si, a certeza de que tal acontece num tempo razoável. Em tribunal, está já a ser julgado, a par de 539 crimes imputados a 19 militares, o pedido de indemnização civil dos pais de Hugo Abreu, dos pais de Dylan Silva, e de um terceiro instruendo, Rodrigo Seco, que ficou ferido, mas a decisão pode demorar meses a ser proferida.
No total, o montante exigido ascende aos 740 mil euros e obrigou, poucos meses após o início das diligências, à nomeação de um representante legal do Estado, uma vez que, se tal não acontecesse, o Ministério Público seria simultaneamente acusador e réu.
Ao que o JN apurou, foi nessa altura, entre março e abril do ano passado, que o mandatário escolhido iniciou negociações com as famílias de Hugo Abreu e Dylan Silva. Estes apresentaram então uma proposta similar à dos autos, aberta a discussão, mas, meses depois, foram informados verbalmente de que a posição do Estado se alterara.