PJ reformado pago por fora para investigar favores políticos
Ministério Público retira perícia da operação “Tutti Frutti” à Judiciária Mudança justificada com atrasos no processo de corrupção
O Ministério Público (MP) retirou da esfera da Polícia Judiciária (PJ) a perícia financeira da mediática operação “Tutti Frutti”, que investiga uma alegada teia de crimes de corrupção, tráfico de influência, participação económica em negócio e eventual financiamento partidário ilícito envolvendo personalidades do PSD e do PS. As análises às contas foram recentemente atribuídas a um perito independente que é o antigo diretor da Unidade de Perícia Financeira e Contabilística (UPFC) da PJ, entretanto aposentado.
Durante dois anos, até se reformar, em janeiro do ano passado, o responsável nunca nomeou oficialmente um perito para o caso. Para afastar a UPFC da investigação, o que aconteceu há cerca de um mês, o MP alegou atrasos nas perícias.
De acordo com informações recolhidas pelo JN, a investigação do “Tutti Frutti” começou em 2017 e tem como principal suspeito um antigo conselheiro nacional do PSD, Carlos Eduardo Reis, dono de uma empresa da área da jardinagem, em Barcelos, indiciado, entre outras coisas, de ter obtido contratos duvidosos de autarcas, essencialmente sociais-democratas. Foi nesse ano que o processo deu formalmente entrada na UPFC, liderada por Egídio Cardoso. Não foi entregue a nenhum perito, apesar de terem sido solicitadas diversas análises bancárias poucos dias depois e uma nova leva meses mais tarde. O próprio diretor da UPFC produziu alguns relatórios intercalares para o processo.
Só em meados de 2018, depois da PJ ter avançado com buscas no PSD e PS, além de juntas de freguesias, câmaras de Norte a Sul do país e escritórios de advogados, é que o MP pediu à UPFC a perícia oficial a dezenas de apensos com documentação bancária e contabilística relativa às entidades e indivíduos visados.
No final de 2018, quando Egídio Cardoso estava prestes a reformar-se, ainda não tinha sido nomeado nenhum perito da Unidade, mas foram efetuadas análises bancárias sob orientação do próprio diretor, que se aposentou em janeiro de 2019. Nessa altura, havia pelo menos uma dúzia de pedidos de perícias por atribuir. Entretanto, o “Tutti Frutti” ficou a cargo de um especialista superior da PJ, mas este teve de entregar o processo ao antigo diretor da Unidade, agora perito independente contratado, por ordem do MP.
PGR NÃO JUSTIFICA
O JN questionou a Procuradoria Geral da República (PGR) sobre a razão da transferência da perícia da PJ para o antigo diretor e o custo da contratação de Egídio Cardoso. “O MP toma as medidas adequadas e previstas na lei para salvaguardar o melhor andamento dos processos e os interesses da investigação”, explicou a PGR.
A Direção Nacional da PJ “não comenta” o caso, mas adianta que “a UPFC melhorou substancialmente de 2018 para 2019 em termos de organização e redução de tempo de resposta”. Explica ainda ter sido clarificada “a função da UPFC e a sua natureza de unidade de apoio técnico-científica”. “Recebemos mais solicitações do MP em 2019 do que em 2018 e a tendência é para se aumentar a resposta. Mas continuamos com a necessidade de reforçar os meios humanos nesta unidade”, esclareceu.