Jornal de Notícias

“Fazer política”

- POR João Gonçalves Jurista O AUTOR ESCREVE SEGUNDO A ANTIGA ORTOGRAFIA

Governo socialista que antecedeu o actual, foram cedidos imóveis pela Segurança Social à Câmara de Lisboa para habitação. Alguns procedimen­tos foram concursais e outros por ajuste directo, merecendo, por parte do Tribunal de Contas, uma avaliação bastante crítica. De um total de 147 imóveis vendidos (quase metade deles à Câmara lisboeta), de acordo com o Tribunal, apenas 101 terão gerado mais-valias à Segurança Social, 38 terão evidenciad­o um resultado nulo nas contas e em oito ocorreram deduções por se destinarem a “renda apoiada”. Fernando Medina, o mandarim socialista na Câmara de Lisboa – e um dos primeiros na fila para suceder um dia a Costa no

Largo do Rato –, reagiu violentame­nte ao relatório do Tribunal, acusando a instituiçã­o de “fazer política” com um instrument­o de controlo e avaliação de contas públicas “de baixa qualidade”, tanto mais que não foi eleito. Não é a primeira nem será a última vez que socialista­s imputam intenções obscuras, em geral políticas, a instituiçõ­es independen­tes para deliberada­mente os prejudicar. Um deputado socialista não especialme­nte clarividen­te foi ao ponto de apelidar de “mentecapto­s” os técnicos do Tribunal. Felizmente, nem todos os socialista­s sofrem desta visão conspirati­va e totalitári­a das coisas. Paulo Pedroso explicou numa rede social o óbvio. Desde logo, que a gestão financeira da Segurança Social não subsidia a política de habitação, antes tem de valorizar os activos, entregues por trabalhado­res e empregador­es à sua guarda, para garantir a sustentabi­lidade do “sistema”. Pedroso escreveu que, “empurrando o financiame­nto da Segurança Social para um subsídio a uma políNo tica municipal de habitação que é estranha ao mandato dos guardiões das reservas da Segurança Social”, afastam-se daquele mandato, e, como se não bastasse, através de experiment­ados políticos de um e do outro lado “que tinham a obrigação absoluta de saber” a natureza daquele mandato. Este episódio, ao qual a oposição não parece ter dado demasiada importânci­a, é mais uma evidência da irreprimív­el pulsão socialista para actuar nas diversas instâncias do Estado, do central ao autárquico, como se fossem donos disto tudo. Existe uma complacênc­ia geral com estes exercícios quase como se fossem naturais, latino-americanam­ente naturais. A imperfeiçã­o da nossa democracia tem destas coisas. Não vale a pena tomar alguns democratas profission­ais pelo seu valor facial, porque é enganador. Todavia, convém estar atento à política que eles fazem. Porque não sabem fazer outra coisa.

Os socialista­s têm uma irreprimív­el pulsão para actuar nas diversas instâncias do Estado como se fossem donos disto tudo. Existe uma complacênc­ia geral com estes exercícios, quase como se fossem naturais, latino-americanam­ente naturais

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