Um gigante preso à burocracia e envolto em polémicas
Eficácia da Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira colocada em causa pelo Tribunal de Contas
Foi criada em 2004, para dar resposta a problemáticas como terrorismo, tráfico e auxílio à imigração ilegal nas fronteiras externas da União Europeia, mas, quase 20 anos depois, a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex) ainda não foi “suficientemente eficaz” a ajudar os estados-membros “na gestão das fronteiras externas e na luta contra a imigração ilegal”. As conclusões são de um relatório do Tribunal de Contas Europeu (TCE), que, depois de uma auditoria ao trabalho do organismo entre 2016 e 2020, questiona, ainda, a capacidade de a Frontex cumprir “eficazmente o novo papel operacional que lhe foi atribuído” em 2019.
A Frontex é agora uma estrutura gigante, ainda presa aos processos administrativos, com um orçamento de 460 milhões de euros – que deverá duplicar para os próximos anos – e envolta em polémicas, quer seja sobre a incapacidade em cumprir os objetivos para os quais foi criada, quer seja por estar a ser investigada pelo Parlamento
Europeu por, alegadamente, rejeitar, de forma ilegal, migrantes e refugiados no Mediterrâneo.
Depois da grande crise migratória de 2015, que deixou a Europa à procura de resposta para as cerca de um milhão de pessoas que chegaram ao continente naquele ano, fugidas de países devastados pela guerra ou fustigados pela Natureza, o Parlamento Europeu solicitou o reforço da Frontex, de forma a ajudar as autoridades nacionais responsáveis pelas fronteiras.
FALTA DE COOPERAÇÃO
Todavia, o reforço referido foi feito com base “numa decisão política” e começaram aí os entraves num organismo que estava “consolidado do ponto de vista estrutural, mas que, do ponto de vista funcional, ainda não estava”, disse, ao JN, Ana Santos Pinto, investigadora do Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa.
“A Frontex não tomou as medidas necessárias para adaptar a sua organização de modo a cumprir o mandato que lhe foi conferido em 2016”, lê-se no relatório.
Uma das principais causas para a Frontex estar a falhar é a falta de cooperação dos estados-membros com a agência, tratada muitas vezes com relutante desconfiança. “O sistema de troca de informações entre as autoridades nacionais e a agência deve ser automatizado”, recomenda o TCE.
“Esta cooperação exige partilha de informação e de procedimentos e tudo isto não acontece de um dia para o outro. Muito pelo contrário, é um processo sensível, que demora muito tempo e pode levar também a alguma resistência dos estados-membros”, adianta Ana Santos Pinto.
O passo dado em 2015 foi muito significativo e, talvez, “maior do que a perna”. “Há um conjunto de objetivos que foram traçados e não têm vindo a ser cumpridos. Dificilmente, a agência corresponderá às expectativas”, sublinha a investigadora.
Para o TCE, que parece ter pouca fé nas melhorias de desempenho da Frontex, será fundamental “aumentar o potencial da avaliação da vulnerabilidade da agência e melhorar a resposta operacional da Frontex”, para que o gigante comece a funcionar em pleno.