Jornal de Notícias

Quando a vida se intromete acontece “Life”

Novo álbum de Sean Riley & The Slowriders, o mais eletrónico da banda, é apresentad­o hoje no Teatro Maria Matos, em Lisboa

- Ricardo Jorge Fonseca cultura@jn.pt

A primeira coisa que se pode dizer sobre “Life”, quinto álbum de originais de Sean Riley & The Slowriders, é que é um disco onde “a vida aconteceu”. Porque na distância entre o que estava planeado e aquilo que se obteve intrometeu-se um dedo cortado, uma pandemia e o papel de Makoto Yagyo, músico dos Paus, enquanto produtor. Intrometeu-se a vida, e a banda deixou-a entrar.

Talvez sempre tenha sido assim com o grupo de Coimbra que se estreou com “Farewell”, em 2007, explica o vocalista Afonso Rodrigues: “Raramente seguimos uma linha contínua. A atmosfera dos álbuns muda constantem­ente, com várias estéticas e dinâmicas. E já tivemos álbuns dominados pela folk, pelas guitarras ou pelos sintetizad­ores”. Mas nunca como em “Life” houve tão pouca eletricida­de e tantos beats. A primeira razão para isso é prosaica, porque nem tudo na vida está às alturas da épica ou da lírica: no dia 1 de janeiro de 2020 Afonso fez um corte profundo no dedo que o impediu de tocar guitarra durante vários meses. Depois veio esse cachalote branco a que chamaram covid-19, que empurrou o lançamento do álbum para calendas mais favoráveis e permitiu à banda continuar a experiment­ar (sem guitarras).

VASOS COMUNICANT­ES

Com a direção artística do disco “dramaticam­ente alterada”, faltava um último elemento para baralhar ainda mais o som inicialmen­te previsto: os arranjos de Makoto Yagyo, que acrescenta­ram “desafios e rasteiras” à produção do álbum. Mas significa que esta balbúrdia, onde saltamos de ambientes espaciais e sonhadores que nos lembram Air para a synthpop carregada onde se vislumbram ecos de uns Ultravox, terminando tudo no trilho mais reconhecid­o da banda, a folk americana, em “Last one”, significa isto que os temas poderiam estar espalhados por diferentes álbuns, ou até por diferentes bandas, como por vezes, de forma estimulant­e, parece suceder? “Trabalhamo­s cada tema de forma autónoma, sem barreiras. Depois vemos como funciona, se sentimos que naquela música somos nós. Finalmente, perguntamo-nos se o tema encaixa no disco que estamos a fazer. Se o som vem da mesma época, se há vasos comunicant­es, ainda que não sejam óbvios, entra no alinhament­o.”

Nem sempre esses vasos comunicant­es se prendem com o som, poderão ser apenas temáticos, como no caso de “Last one”, que parece o corpo mais estranho no interior do álbum: “A letra liga-se à história da banda, remete para o Bruno, para a importânci­a de certas pessoas na nossa vida”. Porque a vida não se intrometeu apenas, sob a forma de peripécias, na composição de “Life” – ela é o tema fundamenta­l de todo o álbum. Que reflete sobre o que mudou na banda depois do desapareci­mento de Bruno Simões, um dos fundadores do projeto, em 2016, e este é o primeiro trabalho editado sem ele; sobre o que mudou com os filhos, com a passagem do tempo, com a chegada aos 40 anos: “Não é um disco alegre, mas há várias formas de encarar a tristeza: com derrotismo ou com esperança. E aqui procuramos a luminosida­de, com a certeza de que só chegaremos à luz se fizermos por isso, é um caminho que depende de nós.”

“Life” é apresentad­o hoje no Teatro Maria Matos, em Lisboa, e dia 18 no TAGV, em Coimbra.

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Simões, em 2016
É o primeiro álbum da banda de Coimbra desde a morte de um dos fundadores, Bruno Simões, em 2016

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