A missão (im)possível de Guterres
O secretário-geral das Nações Unidas fez bem ao não esconder a emoção quando visitou algumas das cidades ucranianas mais massacradas pela guerra. E também fez bem quando a personalizou. “Imagino a minha família numa dessas casas que estão agora destruídas e enegrecidas. Vejo as minhas netas a correr em pânico”, disse à chegada a Borodyanka.
As declarações podem parecer tardias, desfasadas no tempo. Porventura até podem servir aos críticos de António Guterres que o acusam de alguma inatividade no desenrolar desta guerra, indiferentes à complexidade diplomática que este conflito impõe. Quando ao fim de dois meses de barbárie ainda há quem alimente os negacionistas das batalhas travadas dia após dia, as declarações do líder da ONU fazem todo o sentido. Quando ainda existem partidos que votam contra um texto que pede uma investigação independente a eventuais crimes de guerra na Ucrânia, as declarações são necessárias. E, sim, o PCP é um deles e hoje mesmo vai opor-se à iniciativa de António Guterres para que se abra caminho para que os assassinos e seus mandantes possam ser julgados.
É quase uma garantia que a visita do líder das Nações Unidas à Rússia e à Ucrânia será classificada como fracasso, até porque o corredor humanitário para retirar pessoas da metalúrgica de Azovstal, em Mariupol, não irá acontecer hoje, como o secretário-geral da ONU desejava e chegou a perspetivar. É fácil aplaudir António Guterres quando é capa da “Time” por falar em alterações climáticas. Difícil é tentar perceber porque é que só agora se deslocou a Moscovo e a Kiev. Os motivos existirão. Há muitas maneiras de fazer os caminhos para a paz. Nem todos têm de ter uma câmara de filmar a tempo inteiro. Muito menos aqueles que podem salvar vidas e que evitam mais visitas a valas comuns.